O
Senhor escolheu a alma do homem para aí fazer sua morada. Ele gostaria
de passear pelos caminhos vastos que preparou para si. Manifesta aí
toda a sua majestade, e para que esta possa ser melhor percebida, faz brilharem
os astros luminosos, cuja luz espalha um esplendor inefável até
os recantos mais escondidos desse retiro sagrado.
Ele ergueu para si um templo onde seus levitas se dedicam diariamente ao
culto do seu Deus e à prática de cerimônias santas.
A cada dia, consagra o óleo da vida que deve servir para renovar
perpetuamente as fontes sacramentais de todos os dons do seu espírito.
Colocou no lugar mais elevado desse templo uma cadeira de verdade, faz com
que o seu enviado sente aí, para anunciar às nações
a palavra de alegria que ele coloca na língua eterna.
Moisés, aqueles que estivessem sentados em tua cadeira, o Senhor
nos ordenou que os escutássemos e que praticássemos o que
recomendava através da lei. Santo salvador, tu nos ordenas que escutemos
os apóstolos que enviastes ao mundo para anunciar tua palavra, pois
tu oravas somente por eles e por aqueles que acreditavam nas suas pregações.
Como não acreditaríamos nos apóstolos que habitam o
templo do homem, já que devemos acreditar nos profetas que o profetizaram?
Como, pergunto não acreditaríamos nos apóstolos que
habitam o templo do homem, esse templo mais antigo que os templos temporais
das duas alianças, esse templo onde aquele que prega a palavra, esta
sentado não somente na cadeira da lei primária, essa lei suficientemente
antiga para sentar-se, ela própria, na cadeira da unidade?
É nessa montanha que o Novo Homem vai subir para falar a todo o povo
que o rodeia; e depois que se tiver se sentado e que todos os seus pensamentos
estiverem reunidos ao redor dele como se fossem seus discípulos,
abrirá a boca e lhes dirá: "Bem aventurados aqueles que
são bastante pobres de espírito para deixar que lhe sejam
subtraídas, pelo seu inimigo secreto, a glória e as vantagens
temporais, para deixar o seu próprio mundo brilhar acima deles e
mergulhá-los na obscuridade, pois, estando exclusivamente ocupados
com a busca do seu princípio e com a sua aproximação
da verdade, tornam-se muito semelhantes a ela para que ela venha visitá-los,
fazendo-os assim possuidores do reino dos céus, ao mesmo tempo que
de seu próprio mundo, onde o homem de pecado que está ligado
a eles os julgará, na indigência e na ignomínia!"
"Bem aventurado aqueles que ignorarem os esforços e as tentativas
desse homem de pecado para lhes incomodar. Mas que estarão de tal
maneira ocupados de pecado para lhes incomodar. Mas que estarão de
tal maneira ocupados com o cultivo da sua terra, que não se deixarão
distrair pelas afrontas que ele lhe fará interiormente por estar
sem luzes, sem brilho, sem honra, sem riquezas, sem estimas perante seus
próprios olhos, que são um com os olhos do mundo! É
com justiça que a terra lhes será dada, que lhes pertencerá
e que eles a possuirão, pois a terão ganho por um cultivo
dedicado e por cuidados assíduos."
"Bem aventurados aqueles cujo homem interior está em lágrimas
e cujo coração está atormentado pela abundância
da amargura! É uma prova de que a palavra do senhor desceu sobre
eles, cobrindo todas as substâncias da mentira. É uma prova
de que a própria palavra está impregnada das dores deles?
É uma prova de que sentiram as lágrimas da palavra de vida
que se difundiu na alma dos profetas de todos os tempos, de que não
cessaram falar por eles as lágrimas dos sacerdotes, as lágrimas
da terra de Israel, as lágrimas dos caminhos de Sión, as lágrimas
da muralha, as lágrimas da colheita da vinha, as lágrimas
das habitações dos pastores, que se transformaram em lágrimas
de sangue na obra do salvador, que se apressaram em recomendar ao homem
que deixasse chorar livremente nele a palavra, e que chorasse abundantemente
com ela, pois assim o pecado sairá dele para ser substituído
pela alegria pura, pelo sentimento ativo da liberdade da sua nova existência
e pelas mais doces e inefáveis consolações da vida".
"Bem aventurados aqueles que são sedentos e famintos de justiça,
que tiverem amado sua existência até se determinarem a experimentar
a morte, para que possam experimentar a vida e para se colocarem em condições
de pronunciar o julgamento que é confiado a todos os Filhos dos homens!
Pois o velho homem está sempre em litígio com o homem novo,
e se o homem interior pronunciar com força o julgamento e a sentença
contra o velho homem, o homem novo não terá todos os seus
direitos imediatamente restabelecidos, como ocorre nas contestações
dos homens, por causa apenas da sentença dos juizes desse mundo?
O efeito não deve ser maior nas coisas que pertencem a uma ordem
viva? E não é esse o verdadeiro meio que é oferecido
ao homem para ser saciado de justiça?".
"Bem aventurados aqueles que sentem serem eles os únicos capazes
de oferecerem a si próprios, pois quem mais poderia perceber a sua
essência? Estarão ocupados apenas com a sua própria
sobrevivência e em evitar qualquer dano ou ultraje contra si mesmos.
E essa severidade sem limites os absorverá de tal maneira, como sendo
a única necessária e útil para eles, que serão
naturalmente misericordiosos com relação aos outros visto
que os outros não podem ofendê-los. Por essa verdadeira e vivificante
indulgência para com os outros, o Novo Homem pode fazer nascer neles
o desejo de observarem a si próprios, conduzindo-os assim a vida
do seu ser, que consistiria em não fazer aos outros nenhuma ofensa.
E heis de que maneira ele obterá a misericórdia de Deus, a
menos que seja infeliz o bastante para envaidecer-se a ponto de ofendê-lo".
"Bem aventurados aqueles que tiverem purificado suficientemente seus
corações para que sirvam de espelho à divindade, porquanto
a própria divindade será um espelho para eles! O Novo Homem
não duvida que assim, chegará a ver Deus interiormente, pois
ele sabe que esse era o objetivo da existência do ser humano primitivo.
Em conseqüência, porá sentinelas em todas as avenidas
do seu ser para impedir que alguma influência corrompida o penetre
ofuscando o brilho desse espelho divino que carrega dentro dele. Essas sentinelas
serão fiéis na guarda do seu posto, pois é com autoridade
que o homem as arranjará, elas não poderão deixar de
cumprir com zelo suas funções, uma vez que ele se determine
a dar-lhes as ordens".
"Bem aventurados aqueles que suspiram pela paz de espírito e
que caminham pela senda das obras pacíficas, não se entregando
a nenhum dos partidos opostos e furiosos que se batem diariamente dentro
do homem! Livrando-se assim da turba tumultuosa do seu próprio mundo,
tomarão como seu Pai o soberano autor da tranqüilidade suprema
da eterna paz, tornando-se dessa maneira os legítimos Filhos de Deus,
pois manifestarão as características distintiva dessa fonte
da qual nasceram, e que não pode deixar de ser calma, visto que está
constantemente repleta do sentimento inalterável da sua infinitude,
da sua eternidade, da sua universalidade. Assim poderão dizer aos
seus inimigos: tremei, fugi, vós nada podeis contra mim, porque carrego
em mim um nome que significa o Filho do vosso Deus".
"Bem aventurado aqueles que sofrem perseguição pela justiça!
Eles se assemelham aos pobres de espírito, e a mesma recompensa lhes
está reservada. Pois somente o Novo Homem sofre perseguição
pela justiça, visto que somente ele é sedento de justiça
e que o inimigo deixa sossegados todos os outros, já que estes não
o incomodam, não o revoltam e não denunciam as suas ações
falsas e injustas. Mas quando se acendem as luzes, elas revelam os malfeitores
que se haviam escondido na casa, obrigando-os a fugir ou a entrar em combate
com o mestre da casa, para impedir que ele os denuncie e os entregue à
justiça. Que perseguições e que combates o Novo Homem
não terá que enfrentar, haja vista que acende todas as luzes
da sua casa, atraindo contra ele de uma só vez todos os malfeitores
que aí haviam entrado, ameaçando-a com uma grande ruína?
Mas também quanta alegria e consolação não deve
esperar por haver zelado tão bem pela casa que lhe foi confiada,
visto que essa é a casa do Senhor? O próprio céu será
sua recompensa, pois o céu só espera o momento em que essa
casa esteja limpa e purgada dos malfeitores, para vir e fazer sua habitação".
"Vós
sabeis que está escrito, (Ezequiel 33,8), Se quando eu disser ao
ímpio: ímpio, vós morrereis na certa, vós não
falardes ao ímpio para que ele retire do seu caminho errado, morrerá
esse ímpio na sua iniqüidade, mas eu pedir-vos-ei contas do
seu sangue.
E eu vos digo que não é apenas o sangue dos outros que a justiça
reclamará de vós; ela reclamará vosso próprio
sangue, se tiverdes negligenciado no emprego desse sangue para a defesa
do seu próprio reino, que estejais contentes de combater a iniqüidade
e que não deixeis restar a menor fraqueza".
"Vós sois o ouro, sois o talento distribuído pelo mestre
aos seus servidores. Lembrai-vos de que ele o distribui para colher frutos
abundantes e para que ele esteja continuamente na mão dos banqueiros.
Se não o valorizastes, a justiça exigirá de vós
não somente os fundos, mas também os juros que esses fundos
lhe tiverem rendido, e tirará de vós inclusive esse fundo
com o qual poderíeis obter juros no futuro. Como conseguireis, então,
pagar o que lhe deve? Sois o sal da vossa terra; se ele ficar insosso, como
o salgaremos? E ficará insossa a vossa própria terra?".
"Toda a vossa lição está nessas palavras: Os servidores
que o meu Pai ama, são aqueles que o servem em espírito e
em verdade. Assim, vós não o tendes pela simples crença
no princípio divino do qual vossa alma imortal recebeu a vida. Vós
não o tendes nem mesmo por essa fé viva de que, por vossa
união com ele, podeis operar tudo para o vosso bem e o dos irmãos
que moram convosco no vosso templo particular. Mas fazei de maneira a não
vos dar nenhum repouso até que a vossa fé viva se tenha convertido
em atos positivos e fatos reais. Os servidores que o Pai ama são
aqueles que provam sua fé na divindade da natureza dele pela divindade
dos frutos que produzem e pelo cuidado que têm para que os números
triplos se cumpram neles, sem o que o círculo permanecerá
aberto, a obra ficará incompleta e vós não podereis
dizer que servis Deus de verdade, não o servis em obras reais".
Podeis honrar a Deus pelas vossas preces, mas podeis honrá-lo ainda
mais pelos serviços que prestais a vós próprios em
seu nome e no espírito da sua glória e da manifestação
da sua luz, porque esses serviços serão para ele, ao passo
que vossas ações procedem principalmente para vós,
e são como protetores contra os perigos que vos ameaçam e
apoios contra as fraquezas que vos corroem".
"Aqueles que só servem a Deus em inteligência, não
conhecem a vida real, pois vivem apenas em imagens, sendo por isso recompensados
apenas por imagens. É preciso que o vosso coração e
todas as propriedades do vosso ser se tornem agentes e órgãos
ativos sem nenhuma interrupção, se quiserdes viver na realidade
e servir o vosso mestre em espírito e em verdade".
"Tem sido dito a vós que o coração do homem é
a terra onde Deus quer continuamente semear o grão. Tendes, então,
a propriedade de fazê-lo fermentar e produzir, acrescentando aí
as substâncias nutritivas e vegetativas das quais sois o órgão
e a fonte. A verdade semeia menos em vós do que ela espera colher,
a fim de vos deixar a glória e o mérito de haver concorrido
para a obra e o direito de reclamar a vossa retribuição quando
da colheita. Vede o quanto a terra perecível que habitais rende,
de riquezas e de frutos inumeráveis, a partir de alguns grãos
de um cereal em vias de se estragar que o agricultor semeia em seu seio.
Quando então o grão da eterna verdade é semeado em
terra viva, julgai que imensa colheita deve daí resultar, sobretudo
se não cessardes de sentir que é de Deus que vêm, ao
mesmo tempo, a terra viva, o grão e o agricultor".
"Quando o Senhor semear algum grão em vós, começai
então por recobri-lo preciosamente com todas as terras já
cultivadas, ou seja, com a confiança, a vigilância e a constância
em velar pela conservação desse depósito precioso.
Que jamais as sedutoras atrações da contemplação
deixem, ao vosso espírito, tempo para interromper vosso coração
na sua obra; dessa forma colocareis o grão a descoberto, em vez de
deixá-lo fermentar na terra. Ele então secará, não
poderá dar nenhum fruto ou será devorado pelos pássaros".
"Lembrai-vos de que a alma do homem está destinada a servir
de templo ao eterno criador de tudo o que existe. É preciso que ela
tenha em si, ao mesmo tempo, todas as formas capazes de conter todas as
propriedades desse ser infinito, de acordo com todas as suas virtudes, ações
e subdivisões, sem o que esse supremo e majestoso criador de todas
as coisas não poderia, habitar nela inteiramente e livremente. Lembrai-vos
então de que, se alma do homem está destinada a servir de
templo ao eterno, não sois o dono de um único impulso, pois
só o soberano autor que criou todas essas formas para lhe servirem
de morada e que vem habitá-las, pode ter essa disposição.
Porque o salvador proibiu-nos de jurar pela nossa cabeça, já
que não podemos dispor de nenhum fio de cabelo, branco ou preto;
pois, para jurar por qualquer coisa, é preciso possui-la. Ora, não
possuímos nada, nem mesmo o nosso ser, que a forma é do domínio
de Deus".
"Vós fostes instruídos pelo salvador, isto é,
pelo nosso Pai, e só poderíeis ter sido instruídos
por ele, pois até que ele, aparecesse, estáveis sem Deus neste
mundo (Efésios, 2:12), visto que viestes a este mundo somente para
serdes separados de Deus; e se ele não tivesse mandado o seu Filho
para vos ensinar, por essas palavras consoladoras e por sua pessoa, que
o homem é o Filho de Deus, teríeis esquecido para sempre que
Deus é vosso Pai. Não teríeis podido pronunciar esse
nome que era preciso reconhecer para abrir a porta à vossa reconciliação,
e teríeis vos assemelhados aquele que não se lembra mais de
ter portado, outrora, o glorioso título de Filho de Deus".
"Esse salvador vos ensinou a pedir a vosso Pai o pão cotidiano
e que fostes preservado do mal. Se a vossa idade o tivesse permitido, ele
vos teria revelado ainda maiores maravilhas na misericórdia de vosso
Deus; teria vos revelado que esse Deus não cessa de vos oferecer
esse pão cotidiano, na medida em que não cessa de vos transmitir
a sua santa e exclusiva ação, que nos deveria animar a todos.
Desse mundo, toda a nossa sabedoria deveria ser no sentido de não
recusar o auxílio que ele nos oferece diariamente, e nossa única
prece poderia se reduzir a pedir-lhe a graça de não repelir,
como fazemos, os dons e os favores de que ele nos acumula. Porque a única
diferença entre o Novo Homem e os homens imprudentes é que
ele aceita o pão cotidiano e ele se alimenta, enquanto os outros
o rejeitam, o desdenham e em conseqüência, negam a sua existência".
"Vós sabeis o que o salvador declarou àqueles que esperavam
ser reconhecidos como Filhos de Deus por haverem curado doenças e
caçado demônios em seu nome. Ele lhes disse: O senhor responderá:
Ide vós, eu jamais vos conheci. Com efeito, o Novo Homem vos ensinará
que essas obras são direitos do vosso ser e que não são,
e estão muito longe disso, o objetivo principal do vosso renascimento.
Os judeus não tinham exorcistas e, contudo, não foram tratados
com cólera? Sim, essas obras são de tal maneira direitos do
vosso ser que vos é recomendado que vos purifiqueis dos vossos pecados.
Ora, essa purificação pode ser feita eliminando de vós
o inimigo, que é o príncipe da iniqüidade e da sujeira.
E quando tiverdes conseguido eliminá-lo inteiramente de vós,
não será uma propriedade natural da vossa essência pura
eliminá-lo dos outros?".
"Lembrai-vos de que o verdadeiro objetivo da obra do Novo Homem é
regenerar-se na Vida Divina, que é o amor e a luz. Lembrai-vos de
que não podereis atingir esse grau de alegria sem que Deus vos conheça
e sem que esteja intimamente unido convosco, como o foi com Moisés,
quando o chamava e o conhecia pelo nome. Lembrai-vos de que não podereis
ser ressuscitados (Romanos 8:9) e salvos sem confessar que o salvador ressuscitou,
pois não podereis confessá-lo sem o sentir sem o saber e,
em conseqüência, sem haver ressuscitado com ele. Lembrai-vos,
então, de que o salvador não tinha ressuscitado ainda quando
proferiu essas palavras que ouvistes sobre o poder de eliminar os demônios,
e que é mais uma prova de que esse poder é apenas secundário
na ordem da vossa regeneração".
"Foi dito a vós que qualquer coisa que pedísseis ao Pai,
em nome do salvador, obteríeis. Mas como pediríeis em nome
do salvador se esse nome não vos é conhecido, isto é,
se não penetrou até o entendimento do vosso coração
pela brandura de sua atividade viva? Heis como podereis esperar que esse
nome se faça conhecer a vós e como podereis vos servir dele
utilmente".
"Todas as vezes que o vosso espírito se sentir na indigência
e na necessidade, apresentai ao senhor o rol das graças anteriores
que ele vos concedeu. Dizei a ele: Eu sou aquele a quem perdoastes tal e
sou aquele em quem desenvolvestes tal luz, sou aquele que preservastes em
tais circunstâncias, sou aquele a quem extasiastes tantas vezes pela
doçura inesperada dos vossos caminhos sempre novos. Enfim, sou aquele
a quem fizestes, e ainda fazeis, contínuos milagres de misericórdia
e de alívio em nossas penas, em nossos perigos e em nossas trevas?
Ele reconhecerá suas próprias obras nesse rol que lhe apresentardes,
e se aproximará ainda mais de vós, para que um dia possais
pedir em seu nome, ao seu Pai, por todas as vossas necessidades?
"Vós
sabeis que está escrito que não deveis de modo algum jogar
as vossas pérolas aos porcos, pois eles as pisarão com os
pés e as jogarão contra vós. Esse preceito refere-se
particularmente ao homem que suspira pela sua regeneração.
Ele tem uma tal idéia da grandeza dos tesouros que lhe são
prometidos, e uma idéia tão horrível da sujeira de
seu ser, que sempre teme deixar em si qualquer substância corrompida
que, como os porcos, venha pisar com os pés as pérolas que
lhe forem apresentadas, atirando-as contra quem ofertou todos esses tesouros.
Quando vos tornardes homens novos, não faleis da verdade àquele
que, em vós, não estiver regenerado na inocência e na
fé do espírito; contemplai-vos para saber se não resta
ainda em vós qualquer coisa a tal ponto leviana e inferior, que deva
ser mantida na ignorância de que há um remédio universal,
a saber, a amargura".
"É somente às faculdades já no caminho da vida
que deveis comunicar o mistério útil das dores da penitência
do espírito, a única que nos revela tão claramente
os dois seres que existem em nós e que oferece ao homem como que
degraus para ajudá-lo a subir ao altar do sacrifício, até
que o fogo do espírito desça sobre ele, como no tempo da lei
dos holocaustos, conduzindo-o em seguida à região da vida.
"Assim reconhecereis que os vossos pecados estão compensados,
quando sentirdes que a sabedoria derrama sobre vós uma base nova
e fecunda, sobre a qual se possa erguer o edifício universal. Pois
essa sabedoria não vos enviaria um tal presente, se não tivesse,
anteriormente, eliminado todos os escombros e todas as ruínas que
os vossos descaminhos produziram".
"Tende, portanto, constantemente, o cuidado de romper a corrente dos
vossos crimes, deixando-a para sempre sob os vossos pés, afim de
que nada vos roube os tesouros que serão prodigalizados pela sabedoria
que vela por vós. Pois ela vos enviará mais tesouros ainda
do que aqueles que o inimigo vos tiver feito perder, visto que é
mil vezes mais rica e benfazeja do que ele é iníquo e perverso.
Enviará anjos para levantar as pedras do vossos sepulcros, e , após
vos haver feito sair vivos das vossas tumbas, eles se assentarão
sobre essas pedras como um sinal eterno de que a morte não mais reclamará
os seus direitos sobre vós".
"O termo final e o destino do Novo Homem não deverão
conduzi-lo pelos degraus obscuros e penosos da sua reconciliação?
E não é ele esperado num templo mais brilhante e mais vasto,
que não pode fazê-lo conceber hoje em dia toda a extensão
dos seus pensamentos? Não é necessário que tudo esteja
precipitado para que a grande claridade lhe seja concedida? Santificai-vos,
dizia Josué ao povo porque o Senhor realizará coisas maravilhosas
em vós".
"Quais são essas maravilhas? É fazer Pairar o Novo Homem
acima do mundo, é ser para ele um sinal perpétuo de glória
e de triunfo e fazê-lo assentar-se sob os pórticos sagrados
para cantar aí, eternamente fiéis às leis e aos mandamentos
do Senhor, para que o nome dele vos complete e se apodere de todo o vosso
ser, esse mesmo nome engendrará em vós todas as vossas substâncias
vivas e todas as formas de virtudes divinas. As vossas faculdades serão
os agentes e os órgãos dessas formas, a sabedoria os conservará
nas suas justas medidas e nas proporções, para que tudo o
que está em vós manifeste a harmonia do Pai celeste que vos
deu a vida. Assim o vosso Deus passará por inteiro através
de vós, e heis como vos tornareis a semelhança do vosso princípio
e a imagem ativa do grande mundo e da eternidade".
"Apegai-vos somente aos desejos que a sabedoria vos envia. Vós
os conhecereis pela calma que farão nascer em vosso coração
e pela luz que os acompanhará, pois serão os Filhos da luz,
e a sabedoria jamais envia desejos ao coração do homem sem
lhe enviar, ao mesmo tempo todos os meios de satisfazê-los, porque
ela é a unidade, porque ela só opera e engendra a unidade
e só pode agir segundo suas próprias leis, que estão
todas ligadas nessa unidade. Desconfiai, portanto, dos desejos que não
venham da vossa própria sabedoria. Vós os reconhecereis pelos
movimentos impetuosos e inquietos que estimularão em vós,
da mesma maneira que pelas inúmeras dificuldades que trará
sua realização, a qual jamais poderá ter lugar sem
retardar, ao menos por um tempo, o vosso avanço na carreira simples
e livre da verdade".
"Apressai-vos em fazer a vossa obra, fazei-a mesmo antes do tempo,
se for possível. Dessa forma, não somente adquirireis os meios
de obter as maiores riquezas na posse da luz e do espírito, como
podereis ainda desfrutar calmamente o repouso durante o calor do dia, enquanto
aqueles que tiverem sido menos ativos, assim como aqueles que se abandonarem
à indiferença e à negligência, serão obrigados
a suportar tantas fadigas que, talvez não consigam mais resistir
e terminem sendo reduzidos à penúria e a uma horrível
miséria".
"Não vos intimideis, portanto, com os obstáculos que
os infiéis que habitam o vosso seio queiram opor à vossa obra.
Dizei a eles: fareis bem em rejeitar a minha palavra, eu atordoarei vossos
ouvidos e vos perseguirei até que as ordens do meu mestre sejam executadas
e até que rendais homenagem à sua glória. Compete a
mim considerar e julgar os caminhos do senhor? Aceitei, na humildade da
minha alma, o nome do seu profeta e do seu enviado, e desejoso de fazer
honrar o seu nome e o seu poder, não quero que ele me censure por
não ter advertido aqueles que se desviaram. É em vós,
que habitais em mim e que sois os mais próximos dos meus semelhantes,
que devo manifestar o seu império e a quem devo anunciar o seu nome.
É sobre vós que devo deixar cair todas as pragas do Egito,
até que tenhais levado a liberdade ao povo escolhido."
"Eu não diria mesmo, ao me dirigir a vós, como disse
Moisés: porque sinais eles me reconhecerão? Vós me
reconhecereis pelo poder do Senhor que desceu na alma do homem e que fez
com que nenhum profeta igual ao homem tenha se elevado em Israel. Vós
me reconhecereis para que todo homem seja triunfante em seu próprio
reino, ainda que ele deva esperar pela verificação dessa palavra,
nenhum profeta é bem recebido em seu país terrestre."
"Dai então um livre curso às palavras de salvação
e de regeneração que, foram outorgadas ao Novo Homem. Ajudai-o
a exterminar os agentes da iniqüidade, a lançar ao mar os animais
impuros que tiverem servido de asilo aos espíritos das trevas, e
a abrir para sempre os sete canais da santidade. A vida que para aí
descerá vos transmitirá um nome do qual não podereis
conceber os poderes maravilhosos e as riquezas inefáveis. Fazei-vos
secundar do fogo do céu para que tudo o que está em vós
trema diante do Senhor e para que marcheis sobre os passos do Filho do grande
Azarias, em quem a palavra santa e divina consumiu todas as substâncias
estranhas ao espírito."
"Da mesma maneira que a ação contínua de Deus
é mandar para longe dele o erro e as trevas, e estender perpetuamente
o reino da vida, não obstante todos os inimigos que cercam e ameaçam
esse reino, quando esse Deus se une a vós, vos é possível
realizar as mesmas obras no vosso reino particular, pois a ação
de Deus, mudando de lugar, não muda de força e nem de poder,
e só faz em vós o que faz sem interrupção fora
de vós."
"Foi dito a vós para não vos preocupardes com o amanhã,
e que a cada dia basta o seu cuidado. Foi dito a vós então
acerca da alimentação e da vestimenta e de todas essas coisas
com que os pagãos se preocupam, como se Deus não soubesse
que eles têm necessidade delas e, além disso, não as
desse àqueles que buscam em primeiro lugar o reino de Deus e a justiça;
mas podeis também aplicar essas palavras à alimentação
e à vestimenta das vossas almas, que vos serão dadas em abundância,
se buscardes realmente o reino de Deus e sua justiça. Porque, se
é verdade que a cada dia basta o seu cuidado, a cada dia também
basta a sua consolação, pois foi dito que vosso Pai que está
no céu faz o sol nascer para os bons e para os maus e faz chover
sobre o campo dos justos e dos injustos.
"Está escrito que se a vossa mão direita é para
vós motivo de escândalo e de queda, deveis corta-lo e jogá-la
longe de vós, porque é melhor que uma parte do vosso corpo
pereça do que todo o vosso corpo seja lançado ao inferno.
Essas palavras não se aplicavam somente aos crimes ou às desordens
a que vossa matéria vos poderia arrastar. Falavam sutilmente também
sobre a cupidez do espírito e sobre os falsos profetas que vos levam
constantemente a romper a aliança que fizestes com o vosso Deus e
a vos unir com deuses que não são deuses, que se apresentam
a vós como cordeiros e que, por dentro, são lobos rapaces.
Porque a porta da vida é estreita e são poucos os que a encontram
e entram por ela, enquanto que a porta da perdição é
larga, e o caminho que leva a ela é espaçoso, e muitos passam
por ela."
É assim que o Novo Homem, assentado sobre a montanha, verterá
sobre si próprio a luz do alto e se instruirá com uma doutrina
interior viva e não com uma doutrina exterior morta e superficial,
como fazem os doutores e os fariseus.
O
Novo Homem entrará em seu templo nos dias setenários ou nos
dias do sábado do espírito, porque ele será fiel à
lei. Quando ele tiver entrado e se levantar para ler, ser-lhe-á apresentado
o livro do profeta Isaías; ele o abrirá, 61:1, onde estão
escritas estas palavras: O espírito do Senhor repousou sobre mim.
É porque ele me consagrou pela sua unção. Ele me enviou
para pregar o evangelho aos pobres, para curar aqueles que têm o coração
partido, para anunciar aos cativos que eles serão libertados e aos
cegos que eles recuperarão a visão, para tornar livres aqueles
que se encontram oprimidos pelos seus ferros, para publicar o ano das misericórdias
e das graças do Senhor e o dia em que o Senhor dará a cada
um segundo suas obras.
Ele fechará o livro e dirá: É para mim que essas palavras
foram escritas. Atraí a mim o espírito do Senhor pelos desejos
e as lágrimas do meu espírito. Atraí a mim as virtudes
do Senhor pela minha sede de justiça e o meu ardor por sua sabedoria.
Atraí a mim a missão do Senhor em favor dos aflitos por meu
zelo pela sua glória e pelo o alívio dos meus, irmãos.
Atraí a mim a palavra do Senhor pela constância e a assiduidade
da minha palavra, porque não podemos obter nada do Senhor a não
ser que lhe mostremos semelhanças sobre as quais ele possa fazer
descer e repousar a sua ação.
Mas essa ação não pode descer e repousar sobre nós
sem contribuir para a purificação que começamos pelos
nossos esforços, e que jamais estará completa se a mão
do Senhor não vier, ela própria, consumar a obra.
Porque essa ação do Senhor jamais vem até o homem sem
excitar nele santos tremores que, purgando-o das suas máculas, fazem-no
sentir, fisicamente, como é terrível a fraqueza a qual estará
reduzido, enquanto a aliança não for renovada, e ao mesmo
tempo como é grande o poder do ser infinito que compreende tudo,
que move tudo, que penetra tudo e que deu à alma humana o direito
de contemplá-lo e de sentir a sua atividade viva.
Infeliz da alma humana que, após ter assim renovado a sua aliança
com o espírito e a palavra do senhor, não treme de respeito
pela missão da qual ela está encarregada e não cumpre
com um santo temor todas as funções do seu ministério!
Infeliz dela se, tendo obtido novos poderes e dons maiores para fazer descer
mais abundantemente sobre ela e sobre o seu domínio as graças
e os favores da palavra e do espírito do Senhor, infeliz dela se
usar esses dons com desejos que não sejam os do próprio espírito,
com uma fé que não seja a do amor e da luz e com faculdades
que não sejam inteira e exclusivamente e dedicadas à obra
que deve realizar sobre a terra! Ela se tornará culpada pelo corpo
e pelo sangue do Senhor ela comerá e beberá a sua própria
condenação ela se tornará fraca e doente e cairá
no sono.(I Epístola aos Coríntios, 11:27)
Mas se ela escuta somente os desejos do espírito da verdade, por
mais duras que as suas palavras possam parecer a todos aqueles da sinagoga,
não deve temer a cólera deles, nem as vinganças com
as quais a ameaçam. Ela prosperará apesar deles, pois será
sustentada pela mão do Senhor; será em vão que eles
a levarão para fora da sua cidade e a colocarão no cimo da
montanha sobre a qual a cidade está construída a fim de precipitá-la,
pois ela passará pelo meio deles e se retirará."
Quando ela estiver assim unida à mão vigilante do Senhor,
aquelas suas faculdades que estiverem possuídas por demônio
impuro não poderão aproximar-se dela, sem que esses espíritos
das trevas gritem alto, dizendo-lhe: Deixai-nos, o que há entre nós
e vós, alma nazarena? Sei quem sois vós, sois o santo de Deus.
Viestes para nos atormentar antes do tempo? Mas ela responderá a
eles com ameaças: Calai-vos e sai de mim, E eles sairão dela
sem lhe fazer nenhum mal.
Esse Novo Homem, vendo nele tantos desses homens atormentados pelos espíritos
impuros, tantas doenças e enfermidades atingindo-o de todos os lados
para que ele as cure, sentirá as suas entranhas comovidas de compaixão,
de vê-los assim abatidos e dispersos como ovelhas que não têm
pastor. E ele dirá aos seus bons entendedores: a colheita é
grande mas há poucos trabalhadores. Rogai então ao mestre
da colheita que envie trabalhadores à sua colheita. Ele não
cessará de encorajá-los, pelo seu exemplo, a se tornarem eles
próprios trabalhadores que possam ajudá-lo na sua obra. Cessará
de preveni-los acerca de quanto essa obra encontrará opositores invisíveis
que não têm entendimento, porque só habitam as trevas.
Também esses opositores dirão que é por virtude do
príncipe dos demônios que todos esses trabalhadores expulsam
os demônios, preferindo envolverem a si mesmos na confusão,
por essa resposta insensata, que confessar a sua derrota e a superioridade
daquele que vem revelar-lhes sua ignorância. Porque verão homens
mudos possuídos pelo demônio. Assim, não temerão,
de modo algum, cair em contradição diante desses demônios,
mesmo que queiram considerá-los como os príncipes dessas obras
grandiosas e maravilhosas, pois esses próprios demônios reconhecerão
o nome e a força daquele que os expulsa e lhe dirão: Vós
sois o Novo Homem, sois o Cristo sois o Filho de Deus (Lucas, 4:41).
Eles se escandalizarão de vê-lo ensinar de uma maneira que
encherá todo mundo de estupefação, porque a sua palavra
será acompanhada de poder e de autoridade. Ele será alvo das
contestações dos fariseus, dos doutores da lei, que virão
de todas as aldeias da Galiléia, da região da Judéia
e da cidade de Jerusalém, e estando sentados perto dele verão
sua virtude agir através de prodígios e pela cura das doenças.
Porque o Novo Homem, vendo nele próprio um paralítico e a
fé daqueles que o trazem aos seus pés, lhe dirá: Meu
amigo, vossos pecados estão perdoados.
Então os fariseus e os doutores da lei o acusarão de blasfêmias,
sustentando que somente Deus pode perdoar os pecados, enquanto que pela
sua própria lei, da qual são os doutores e os príncipes,
havia sacrifícios para a expiação e para o pecado,
e esses sacrifícios eram oferecidos pela mão de um homem que,
nessa circunstância, era o intermediário, a voz e o agente
da divindade.
Mas o Novo Homem, já conhecendo os seus pensamentos, começará
pela cura interior da doença, a fim de ter a ocasião de lhes
dar uma instrução salvadora e luminosa, mostrando-lhes que
não é mais difícil dizer levantai-vos e caminhai do
que vossos pecados serão perdoados. Porque aos olhos do Filho do
homem todos os poderes emanam da mesma fonte, e certamente o primeiro serviço
que ele pode prestar a si mesmo é empregá-los para a cura
das suas faculdades interiores, e só se ocupar da cura do seu corpo
quando o seu interior estiver restabelecido. Do contrário, longe
de progredir no seu aperfeiçoamento e regeneração,
apenas conseguiria tornar suas faculdades mais culpadas, uma vez que as
redimiria da culpa dos seus pecados, mas lhes deixaria a essência
desses pecados.
Porém tendo começado a usar os direitos originais da alma
humana (de perdoar os pecados) para perdoar os pecados do paralítico
como recompensa da fé que o animava, vai querer ainda tocar os olhos
materiais dos doutores da lei por um prodígio corporal e pela cura
material da doença. E sabendo o quanto os poderes sobre os espíritos
se elevam acima dos poderes que influem sobre o corpo, provará a
cura interior ou o poder que ele tem de perdoar os pecados pela cura exterior,
pois um poder menor está necessariamente compreendido dentro de um
poder superior, este que nos ensina que nossos males físicos estão
ligados às nossas desordens morais e que, se nosso interior estivesse
equilibrado, teríamos infinitamente menos enfermidades corporais.
Imbuído desses princípios, o Novo Homem, tendo rompido no
paralítico as cadeias do pecado que suspendiam a ação
de todos os seus órgãos, dirá com segurança,
a esses órgãos libertos dos seus entraves: Levantai-vos, eu
vos ordeno, deixai o vosso leito e ide para a vossa casa. O paralítico
se levantará, deixará o seu leito e irá para a sua
casa, para a perplexidade daqueles que foram as testemunhas desse acontecimento
glorioso.
O Novo Homem estará tão ocupado com sua obra, que poderá
reconduzir assim todo o seu ser aos seus elementos primitivos, trabalhando
sem descanso para realizar o que foi dito pelos profetas: Eu serei o seu
Deus e eles serão o meu povo. Isto é, fazendo de tal maneira
que cada porção do seu ser exprima ativamente a santidade
de Deus e diga Santo, santo, santo, pois vimos anteriormente que essa era
a verdadeira propriedade que nos revelava a análise divina do nosso
ser. Ou seja, enfim, que todos os pontos desse ser que existe em nós
deveriam ser inspirados pelas consciências vivas e progressivas das
diversas regiões do espírito, por onde podemos e devemos passar
até que estejamos universalmente plenos da consciência divina.
Ora, se o ser interior do Novo Homem chegasse a esse final feliz, que males
físicos poderiam, em seu corpo, resistir ao seu poder? E não
poderia ele dizer, com segurança, a tudo o que fosse paralítico
nele: Levantai-vos, eu vos ordeno, deixai o vosso leito e ide para a vossa
casa?
Heis
o momento em que o Novo Homem, a exemplo dos discípulos do salvador,
vai pregar nas cidades e nas aldeias de Israel, que é o homem. Heis
o momento em que, em nome do espírito, poderá realizar a eleição
dos doze discípulos, desenvolvendo nele os dons que brilharão
nos doze enviados pelo salvador. Ele será em si mesmo, um reflexo
dessa eleição, por causa do poder secreto e da operação
contínua, ainda que invisível, de uma antiga lei que estabeleceu
primitivamente doze canais para a comunicação da luz, da ordem
e da providência entre as nações. Lei à qual
todos os propagadores das leis divinas foram fiéis e que foi seguida
em todos os tempos, mesmo pelos simples sectários das ciências
elementares, que consagraram universalmente doze signos nas regiões
do firmamento material.
De modo algum ele levará os frutos dessa eleição aos
gentios às cidades dos samaritanos, pois essas nações
são os representantes simbólicos dos povos reservados para
o julgamento. Mas irá, talvez, até as ovelhas perdidas da
casa de Israel, até as regiões que, ao redor dele, foram perturbadas
e desviadas pelas influências do crime, mas que ainda não fecharam
o seu coração à penitência. E dirá a essas
nações, para encorajá-las, que o reino do céu
está próximo. Levará para elas, através de suas
lágrimas, suas preces e seus esforços, a saúde aos
doentes, a vida aos mortos, a liberdade àqueles que estiverem sob
os grilhões do demônio. Ele nada poupará para encher
a sua terra da abundância das suas obras.
Quando entrar em alguma cidade ou em alguma aldeia da terra do homem, procurará
alguém que seja digno de hospedá-lo, e ficará aí
até que seja oportuna a sua ida. Ao entrar em uma casa, ele a saudará
dizendo: que a paz esteja nesta casa. Se essa casa for digna, a paz descerá
sobre ela, mas se ela não o for, a paz voltará para ele. Isso
porque a paz não pode misturar-se às nações
que não são dignas dela.
Mas quando o Novo Homem encontrar em si alguma casa ou cidade que não
queira recebê-lo, nem escutar as suas palavras, ele limpará
a poeira dos seus sapatos ao sair dessa cidade ou dessa casa. E essa cidade
e essa casa se tornarão mais culpadas do que Sodoma e Gomorra, porque
Sodoma e Gomorra ouviram apenas uma doutrina exterior, que influenciou somente
os seus sentidos corruptíveis e que, tendo sido desprezada por elas,
fez com que a cólera do Senhor fosse derramada sobre seus corpos
e suas moradas terrestres, ao passo que o discípulo do qual falamos
levará a essa cidade e a essa casa a doutrina do Novo Homem, que
abalará mesmo os fundamentos mais recônditos do seu ser, e
que, se for desdenhada, deverá arrastar sobre elas os flagelos mais
medonhos e as punições mais pungentes.
Assim, o espírito que envia o Novo Homem para a sua própria
terra, o prevenirá para que ele não fique como uma ovelha
em meio aos lobos, recomendando-lhe ser prudente como a serpente e simples
como a pomba. Ele o prevenirá de todas as resistências que
ele experimentará por parte dos homens, ou seja, das nações
ímpias e incrédulas que habitam o reino desse Novo Homem.
Ele lhes dirá: Essas nações vos farão comparecer
nas suas assembléias, farão com que sejais castigados nas
suas sinagogas e sereis levados à presença dos reis e dos
governadores, por minha causa, para que deis testemunho acerca de mim diante
deles e dos gentios. Quando então estiverdes em suas mãos,
não vos preocupeis de modo algum com a maneira pela qual falareis
e eles, nem com que lhes direis. O que deveis dizer vos será transmitido
na hora. Porque não sois vós que falais, mas o espírito
do vosso Pai que fala em vós... Sereis execrados por todos, por causa
do meu nome...
Essa será a sorte do Novo Homem quando percorrer as diversas regiões
do seu ser, porque ele encontrará nele por todas as partes, homens
iníquos que o repelirão, que procurarão confundi-lo.
Mas o espírito do Senhor estará com o Novo Homem, e ele sentirá
nascer em nele as respostas que deverá dar para o triunfo daquele
que o enviou, pois o Novo Homem virá da parte do espírito
somente para combater os inimigos.
Todos os homens poderiam fazer essas observações acerca de
si próprios, estando bem certos de que com cuidado e atenção
ouviriam as respostas que deveriam dar em todas as circunstâncias,
se tivessem o hábito de investigar e de aproveitar as luzes do Novo
Homem. E à semelhança dos discípulos do salvador, poderiam
contar que se, sendo perseguidos em uma cidade, se retirassem para uma outra,
não conseguiria percorrer todas as cidades de Israel antes que o
Filho do homem viesse, isto é, não teriam percorrido todas
as casas do homem que o Novo Homem tenha se dado a conhecer neles, e não
seriam recompensados com sua vinda por todas as humilhações
que tivessem sofrido.
Porque não há nada escondido que não deva ser descoberto,
nem de secreto que não deva ser conhecido; esperança mais
consoladora que o homem pode ter neste mundo, pois, com as noções
que adquiriu por tudo o que o precedeu, ele conhece os imensos tesouros
contidos nele e deve estar totalmente mudo de admiração, prevendo
o que ele será um dia, quando forem reveladas todas as maravilhas
que ainda estão seladas em seu seio e que o tornam resplandecente
como a luz, ativo como o fogo e puro como a verdade.
Contudo, essas maravilhas que um dia serão reveladas ao homem são
apenas imagens e representações das que aparecerão
aos seus olhos quando o soberano ser, do qual ele é a semelhança,
tiver nos mostrado tudo dele que está escondido, seja nos diversos
invólucros do tempo, seja além desse limite universal que
põe um véu tão espesso entre os nossos olhos espirituais
e o reino da luz.
É aqui então que podemos nos encher de uma esperança
que nos deveria fazer estremecer de alegria, ao ouvir essas doces palavras
de que não há nada escondido, no universo, no homem e em Deus
que não deva ser descoberto, nada de secreto em toda a universalidade
que não deva nos ser dado a conhecer. Homem de paz, Homem de Desejo,
Novo Homem, se não encontrardes estímulos poderosos bem como
veículos imensos para vos sustentar vos fazer avançar no caminho
não sois dignos de haver posto o pé aqui.
Fazei então o que foi recomendado aos discípulos do salvador.
"Dizei então a vós mesmos na luz o que vos foi dito na
obscuridade, exortai em vós sobre o alto das casas o que vos foi
dito ao pé do ouvido. Não temais aqueles que matam o corpo
mas que não podem matar a alma; temei antes aquele que pode perder
no inferno o corpo e a alma. Um pássaro não tomba sobre a
terra sem a vontade do vosso Pai. Os próprios cabelos das vossas
cabeças são todos contados."
Que a vossa paixão mais ativa seja no sentido de fazer progredir
o reino da luz em todo o vosso ser, a fim de que aquilo que está
escondido em vós seja descoberto, e que através de vós,
em conseqüência, se revele e se manifeste o que está escondido
em Deus e no universo. Porque está escrito: Aquele que me confessar
e me reconhecer diante dos homens (a começar por tudo que está
em vosso interior), eu o reconhecerei perante meu Pai que está no
céu; e aquele que me renunciar diante dos homens, eu o renunciarei
perante o meu Pai que está no céu. Lembrai-vos de que esse
Pai e esse céu estão em vós, e que, a cada dia da vossa
vida, essas palavras podem ter para vós o seu cumprimento. Cuidar-vos
então de não falhar em vossa obra pela indolência, pelas
considerações inferiores ou pela falta de confiança
naquele que deveis reconhecer em todos os pontos das faculdades que vos
constituem. Ele disse: Aquele que não toma a sua cruz e não
me segue, não é digno de mim; aquele que conserva a sua vida,
a perderá; e aquele que perde a sua vida por amor a mim, a conservará,
porque as penas, os trabalhos e as aflições são essa
violenta compressão pela qual, unicamente, se pode exprimir, de todas
as partes, a substância divina que está em vós e que
daí não pode sair e se fazer conhecer a não ser por
uma contração salutar.
É assim também que saem de vós as substâncias
falsas que ocultam e restringem essa mesma substância divina depois
do pecado, e heis como se prepara o julgamento que pronunciareis um dia,
entre o vosso povo, sobre os justos e os injustos, os bons e os maus. Pois
sabeis que está escrito: "Aquele que vos recebe, me recebe;
e aquele que me recebe, recebe aquele que me enviou. Aquele que recebe o
profeta na qualidade de profeta, receberá a recompensa do profeta,
e aquele que recebe o justo na qualidade de justo, receberá a recompensa
do justo. E todo aquele que der a beber um copo de água fresca apenas
a uns dos seus menores como sendo um de meus discípulos, eu vos digo,
em verdade, que ele não ficará privado da sua recompensa."
Heis as instruções que deveis espalhar em abundância
entre o vosso povo, a fim de que o Novo Homem seja honrado como deve sê-lo
e que possa transmitir a vida que recebeu a todos aqueles a quem foi enviado
para libertar das trevas e da escravidão da morte, pois se alguém
se envergonha dele e de suas palavras, o Novo Homem se envergonhará
também desse alguém, quando ele vier na sua glória,
na do seu Pai e na dos santos anjos.
Encontrar-se-ão,
talvez, em vós, alguns seres de desejo que, como São João,
tendo aprendido em sua prisão as obras que realizais, quererão
perguntar-vos se sois aquele que deve vir em vós ou se devem esperar
um outro. Vós respondereis a eles, então, como o salvador
respondeu a São João: "Ide dizer a João o que
ouvistes e vistes. Os cegos vêem, os coxos andam, os leprosos estão
curados, os surdos ouvem, os mortos ressuscitam, o evangelho é anunciado
aos pobres, e bem-aventurado aquele que não encontrar em mim motivo
de escândalo e de queda! "Mas direis, por vossa vez, falando
a esse ser de desejo que será enviado a vós: "O que fostes
ver no deserto? Um caniço agitado pelo vento? Um homem vestido com
luxo e delicadeza? Um profeta? Sim, eu vos digo, é mais do que um
profeta, porque acerca dele é que foi escrito: eu vos enviarei o
meu anjo que vos preparará o caminho. Eu vos digo em verdade que
entre todos aqueles que nasceram das mulheres não há nenhum
maior do que João Batista, mas aquele que é o menor no reino
do céu é maior do que ele."
Sim, podeis dizer: heis esse amigo fiel que não me abandonou em minha
aflição e em minha dor e que foi posto na prisão por
minha causa. Heis aquele cujo batismo espiritual e físico me tornou
um Novo Homem, heis o precursor que gritou no deserto a todo o meu povo:
endireitar os caminhos do Senhor. Ele é mais do que um profeta, pois
os profetas não anunciaram a luz, que sob os véus e as imagens
não passava de sombras, enquanto ele próprio mostrou e indicou
essa luz, e a faz ver claramente, assim como São João revelou
para o mundo o salvador, ao dizer quando o viu: heis o cordeiro de Deus.
Heis o que tira os pecados do mundo. Ele é mais do que um profeta
no sentido de que, como São João, foi por sua boca que se
anunciou e assinalou a salvação das nações.
Heis porque entre todos aqueles que nasceram das mulheres, ou da dor, da
justiça e da condenação às privações,
não há nenhum maior do que ele, pois ele veio para servir
de precursor ao reino da luz e para vos introduzir nos caminhos da vida.
Mas o homem novo, isto é, aquele que é menor do que o menor
do reino dos céus, visto que, em vez de ter nascido da dor, da justiça
e da condenação, nasceu da consolação, do amor,
da misericórdia e da graça, em lugar de ser somente o precursor
da vida e da luz, vos traz ele próprio essa vida e essa luz que recebeu
do seu Pai e das quais foi escolhido para ser o órgão e o
propagador.
Mas que dizer dessas nações ímpias para o meio das
quais esse Novo Homem e o seu precursor foram enviados? Assemelham-se a
crianças que estão sentadas na praça e que gritam aos
seus companheiros, dizendo: tocamos a flauta para vos alegrar e vós
não dançastes, cantamos árias lúgubres para
provocar o vosso choro e não mostrastes luto." Porque o precursor
do Novo Homem ou nosso fiel companheiro veio em dor e em lágrimas,
como tendo nascido das mulheres, e as nações ímpias
disseram: ele está possuído pelo demônio. O homem novo
veio na alegria e na consolação, como tendo nascido do espírito
e do amor, e elas disseram: é um homem que gosta da boa mesa e que
gosta de beber; é um amigo dos publicanos e da gente de má
vida. Trataram o Novo Homem e o fiel companheiro que foi o seu precursor
como trataram o salvador e aquele que caminhava a sua frente na virtude
e no espírito de Elias, para preparar os caminhos da misericórdia.
Foi assim que trataram as duas leis e as duas alianças. A primeira
dessas alianças era o caminho dos trabalhos, das aflições
e das cerimônias penosas e laboriosas, porque ela era a figura dos
precursores e, como eles, tinha nascido das mulheres, pois os seus ministros
descendiam da raça carnal do pecado difundido pela primeira mulher
sobre toda a posteridade humana. A segunda era a aliança da paz e
do repouso, pois aquele que vinha trazê-la sobre a terra, nascera
do seu próprio amor, da sua própria vontade, da sua própria
caridade e vinha desenvolver diante de nós a sua geração
eterna, a fim de elevar o nosso espírito até essa sublime
e pura região onde cessam todas as fadigas e toda a tristeza do espírito.
Mas as nações ímpias que se tornaram inimigas dessas
duas alianças combateram a primeira ou a negligenciaram, porque ele
impunha fardos muito pesados. E não aproveitaram a segunda porque
aquilo que ela impunha era tão pouco material, que a consideraram
sem consistência, por não querer estimar o seu preço
e provar todo o seu valor. Foi assim que os primeiros prevaricadores não
aproveitaram o caminho laborioso da reconciliação que teriam
encontrado no primeiro homem, antes da sua queda, e que bem menos ainda
aproveitaram a ajuda que lhes foi concedida após o seu crime. Porque,
normalmente, uma prevaricação gera quase sempre uma maior,
e a punição que a justiça inflige aos culpados é
deixá-los tornarem-se ainda mais culpados, quando não redobrar
seus esforços para entrar no caminho da verdade, do arrependimento
e da penitência, tendo em vista os auxílios que lhes são
enviados.
Também "ai de ti, Corozaim, ai de ti, Betsaida, porque se os
milagres que se fizeram em vós tivessem sido realizados em Tiro e
em Sidon, há muito tempo que elas teriam feito uma grande penitência
em cilício e em cinza. Por isso vos declaro que no dia do juízo
haverá menos rigor para Tiro e Sidon do que para vós. E tu,
Cafarnaum, tu te elevarás sempre até o céu? Serás
rebaixada até o fundo dos infernos, porque se os milagres que se
fizeram em ti tivessem sido realizados em Sodoma, talvez ela ainda existisse
hoje. Por isso vos digo que no dia do juízo haverá menos rigor
para Sodoma do que para vós."
Homem, meu irmão e meu amigo, considera, então, os milagres
que foram realizados em ti e trata de evitar o julgamento que ameaça
em ti Corozaim, Betsaida e Cafarnaum. O resultado da primeira prevaricação
do Pai dos humanos foi mergulhar toda a sua descendência na região
do destino. Esse homem infeliz abandonou sua morada espaçosa e livre,
onde nada limitava nem constrangia os seus caminhos e nada lhe trazia inquietude
acerca da sua sorte. Ele a trocou por uma morada tão perigosa que
não pode jamais saber que ela será para ele a passagem do
destino que a dirige e comanda com um domínio terrível. Abandonou-se
a uma região em que a aparência o engana de ilusão em
ilusão e onde legiões de fantasmas se sucedem continuamente
diante dele para lhe tirar a visão da realidade. Sendo assim, ele
se impôs uma regra terrível: trabalhar para entrar novamente,
a qualquer preço, na região da sua liberdade, para não
correr os riscos de ficar na região da sua escravidão, sem
outra esperança a não ser as trevas e sem outro apoio senão
o poder cego de um mestre feroz e duro que, não conhecendo o repouso,
não o pode legar a nenhum daqueles que vêm se estabelecer em
seus domínios.
É preciso então, hoje em dia, que o homem infeliz não
cesse de verter suores de sangue para transformar essa morada horrível
em uma morada de liberdade e de alegria, onde a sua sorte não mais
o assuste ou inquiete. Ao contrário, que ele marche como outrora
nos caminhos sem limites, que lhe oferecem a cada passo as perspectivas
mais consoladoras. É necessário que transforme o seu corpo
de morte em um corpo de atividade, de poder e de dominação
sobre todas as leis inferiores pelas quais este baixo mundo está
constituído e governado. É preciso que transforme todas as
ilusões que neste mundo perseguem o seu coração e o
seu pensamento em sinais certos e invariáveis que sejam pelo menos
indícios dessas verdades eternas, das quais havia tirado o nascimento
e que jamais deveria ter abandonado. Em uma palavra, se foi ele próprio
que traçou seu destino e se deitou sob o jugo, é preciso que
seja ele mesmo a resgatar sua Vida Divina do jugo desse destino, arrancando-a
dolorosamente para restabelecê-la em seu bem estar primitivo.
É nesse ponto que a vida suprema, tocada pela sua miséria,
vem partilhar com ele de seus males e suas privações, para
que ele possa mais tarde partilhar com ela essa liberdade que havia perdido.
Nosso fiel companheiro desceu conosco até o nosso abismo, como o
salvador desceu até o abismo universal. Ele verte suores de sangue
conosco para nos ajudar a realizar essa transformação que
estava tão visivelmente acima das nossas forças. Esse amigo
fiel, trabalhando com tanta constância para a nossa regeneração,
desenvolveu em nós o Novo Homem, que nos ensinou como podemos nos
tornar terríveis para nossos inimigos, pois somos a palavra e o nome
de Deus, e não há nada tão terrível quanto a
palavra e o nome do Senhor (Salmos 110:9).
Ele nos ensinou que a nossa essência, que é o nome e a palavra
do Senhor, podia transmitir às nossas faculdades o direito de ser
também o nome e a palavra do Senhor, como o Eterno transmite seu
nome, sua palavra e seus poderes a todos os seres que emanam dele e que
são os ministros das suas vontades e os propagadores das suas boas
ações. Dessa maneira, esse amigo fiel nos ensina que as portas
da vida permanecem abertas para nós, pois as portas da vida estão
em nós. "Eu vos rendo glória, meu Pai, Senhor do céu
e da terra, por que escondestes essas coisas aos sábios e aos prudentes
e as revelastes aos simples e pequenos. Sim, meu Pai, é assim porque
vós o quisestes. Meu Pai colocou todas as coisas em minhas mãos,
e ninguém conhece o Filho a não ser o Pai, da mesma forma
que ninguém conhece o Pai senão o Filho e aquele a quem o
Filho o quiser revelar. Vinde a mim, vós todos que estais fatigados
e carregados, que eu vos aliviarei. Tomai o meu jugo sobre vós e
aprendei de mim, que sou manso e humilde de coração e vos
trarei descanso para as vossas almas. Porquanto o meu jugo é suave
e o meu fardo, leve."
Se
o Novo Homem é depositário de tão grandes privilégios,
que luz ele seguirá para transmitir seus frutos e para dar seus testemunhos
e sinais àqueles que os pedirem? Será a luz da analogia e
da similitude à qual ele se apegará fielmente. E como terá
o sentimento íntimo e invencível da natureza espiritual do
seu ser e da divindade da fonte da qual recebeu tudo o que é e tudo
o que possui, ele começará por observar os inquisidores que
nascerão nele.
Se, pelo exame que fará deles, considerá-los não somente
hesitantes acerca das suas bases fundamentais, mas decididos inclusive a
negar-lhe a existência de tal modo que se aproximam dele apenas pelo
espírito da dúvida e para afastá-lo dos caminhos da
fé, a fim de confundi-lo, ele não lhes dará resposta
alguma. Ou então lhes responderá da mesma forma que o salvador
respondeu aos judeus que lhe pediam prodígios e milagres: não
haverá outros senão aquele do profeta Jonas. Porque esse milagre
é visível na alma do homem, que está preso neste mundo
por três dias elementares, visto que não quis cumprir a sua
missão junto aos antigos "ninivitas", e que, em conseqüência,
o homem tem, em si mesmo, um milagre suficiente para que seja indesculpável
sua falta de fé.
Mas se esses inquisidores lhe parecerem cheios da mesma convicção
que ele, se vierem e ele com uma identidade de confiança e de desejo
que levem ao seu avanço espiritual e à glória do seu
mestre comum, ele não hesitará em abrir-lhes todos os seus
tesouros, porque será seduzido pela relação e pela
semelhança que haverá entre eles; e terá a viva esperança
de que esses seres de desejo, unindo-se a ele, obterão mais facilmente
as graças e os auxílios de que têm e terão sempre
necessidade, na condição de meros servidores de Deus. Ele
terá, digo eu, a viva esperança de que essa reunião
trará mais facilmente a manifestação dos poderes divinos,
aumentando assim o número dos adoradores de verdadeiro Deus.
Agindo assim, o homem novo marchará sobre os passos do salvador em
toda a sua conduta perante aqueles que procuraram e solicitaram a sua ajuda
durante a sua estada na terra. Pois ele não se rendeu, de início,
aos desejos daqueles que lhe pediam milagres, perguntando-lhes, ao invés
disso: Credes que eu possa realizar o que vós desejais? E depois
de se assegurar da sua fé, favoreceu-os com o seu poder e os curou.
Houve aqueles aos quais ele não precisou indagar, pois revelavam
visivelmente sua fé pelo seu ardor, ao se aproximar dele.
Houve também quem não precisasse dar demonstrações
de sua fé, porque, sendo ele o modelo supremo do Novo Homem, lia
mais claramente em seu interior do que eles próprios, pois a primeira
característica e o primeiro privilégio do espírito
é ler no espírito, transmitir e penetrar em tudo o que é
espírito. Mas, antes de desenvolver os tesouros da sua sabedoria
e dos seus poderes, ele se certificava da fé daqueles a que se destinavam
esses poderes, fosse por suas indagações, fosse pelos testemunhos
visíveis deles, fosse por sua vida íntima e penetrante. Dos
três modos de esclarecimento que devem, igualmente, estar à
disposição do Novo Homem, segundo suas proporções
e suas medidas, e que são traçados aos menos elevados em nossa
fé, conforme estejamos ligados a uma ou a outra dessas três
formas. Mas quando o salvador não encontrava naqueles que se aproximavam
dele nenhum tipo de fé, nem nas suas respostas às questões
dele, nem nas suas demonstrações de zelos nem no seu interior,
ele os mandava embora sem os satisfazer, fechando cuidadosamente os seus
tesouros para não expô-los ao insulto e à profanação.
Assim, à semelhança do salvador, o Novo Homem não se
ofenderá com as respostas de Natanael, porque no meio da sua franqueza
e da sua sinceridade, ele descobrirá a retidão do coração
e a pureza da fé desse israelita.
Ele será tocado pelas lágrimas de Madalena e pelos cuidados
que ela tomará ao ungir seus pés e enxugá-los com os
cabelos, e perdoará os pecados dela.
Ficará admirado pela fé do centurião ao ouvi-lo dizer:
Eu não sou digno de que entreis em minha casa: dizei somente uma
palavra e meu servo ficará curado. Pois também sou um homem
submisso a outros, tendo, contudo, soldados sob minhas ordens, e digo a
um deles: ide até lá, e ele vai; e a outro: vinde até
aqui, e ele vem; e a meu servidor: fazei isto, e ele o faz."
Ele não fechará o seu coração, nem os seus poderes,
aos seus discípulos quando estiverem em meio a uma tempestade no
mar. Eles se revelarão em seu temor e lhe pedirão: mestre,
salvai-nos. Ele se contentará em acusá-los de timidez e de
pouca fé em si mesmos, mas verá, por esse pedido, que eles
dependem dele para a sua salvação, e então comandará
os elementos para que se acalmem.
Menos ainda ele se recusará àqueles que vierem com uma humildade
confiante, acreditando que pela mera aproximação os seus desejos
serão cumpridos. "Enquanto essa mulher, que há doze anos
padece de um fluxo de sangue, aproximar-se dele por trás e tocar
a barra de suas vestes, dizendo a si mesma se eu puder apenas tocar a vestimenta
dele, estarei curada ele se voltará e, vendo-a, lhe dirá:
filha, tende confiança, vossa fé vos curou, e essa mulher
será curada na mesma hora."
Com mais forte razão atenderá aos pedidos daqueles que se
dirigirem a ele como aquele leproso a dizer-lhe: Senhor, se quiserdes, podeis
me curar. O Novo Homem estenderá a mão, para tocá-lo
e dirá: Eu quero, sede curado, e a sua lepra será curada no
mesmo instante.
Mas esse Novo Homem, dando ele mesmo o exemplo de humildade, renderá
homenagem à lei temporal e aos canais visíveis que lhe tiverem
transmitido os seus direitos e o seu poder, porque está escrito que
a salvação vem dos judeus. Também no meio de todos
esses prodígios dirá àqueles que tiver curado: "Cuidai
para não falardes nada acerca disso a ninguém, mas ide mostrar-vos
ao sacerdote fazei a oferta que Moisés ordenou a fim de que lhes
sirva de testemunho". Isto é, rendei comigo homenagem à
lei e aos caminhos daquele de quem recebemos tudo. Da mesma forma que o
Novo Homem sabe que é pela fé que se conserva e se mantém
a humildade, assim também ele sabe pela humildade que a fé
se conserva e se mantém, e que sem essas duas virtudes todos os dons
do espírito se perdem. É por essa razão santa e primordial
que, à semelhança do salvador, ele só se deixará
tocar pelos desejos que sabe terem nascido da fé e da humildade,
pois ele próprio dará o primeiro exemplo, na medida em que
só obterá o renascimento pelo preço dessa fé
e dessa humildade que ele manifesta em suas obras mais gloriosas. É
também por essa razão que o salvador incessantemente recomendou
a fé e a humildade em todos os ensinamentos que difundiu.
Ora, qual é essa fé tão recomendada pelo salvador?
É aquela que se desenvolveu no Novo Homem, aquela que repousará
sobre o sentimento da santidade e da força do seu ser quando, pela
fidelidade aos impulsos secretos que todos recebemos, ele tiver conseguido
que a mão generosa da sabedoria venha libertá-lo das suas
trevas e romper suas cadeias, para fazê-lo conhecer as regiões
da vida e da luz que estão nele, mas que são envolvidas por
nuvens. Mas, da mesma maneira que um único raio de sol atravessando
as nuvens é suficiente para dissipar a obscuridade, assim também
o menor raio do nosso ser que saia dos seus antros e dos seus abismos é
suficiente para nos esclarecer acerca da extensão dos nossos domínios,
para revelar aos nossos olhos todos os planos dos inimigos que estão
sempre ocupados em devastar nossa terra, e para nos dar força de
destruir todos os seus planos. Heis por que o salvador dizia aos seus discípulos
que se eles tivessem uma fé tão grande quanto um grão
de mostarda, eles diriam a uma montanha para se precipitar sobre o mar e
ela se precipitaria. Seria o combate da vida contra a morte. Não
seria, portanto, surpreendente que a morte tivesse todas as desvantagens
e a vida todos os triunfos.
Ao mesmo tempo, essa convicção dos poderes do homem era aflitivo
para o salvador, quando ele via os seus discípulos hesitarem nas
suas obras e na sua confiança. O que deveria ele sentir, ao encontrar
homens envoltos em suas trevas até o ponto de serem os primeiros
adversários e os primeiros destruidores dessa convicção,
e sobretudo quando esses homens se achavam na cadeira da instrução?
Assim como ele tratou os escribas, os fariseus e os doutores da lei!
Se a fé é realmente o Novo Homem, a humildade é, na
verdade, o seu alimento. Assim, é só na humildade e no temor
santo que se sente Deus, que se conhecem os seus segredos e que se aprende
a utilizá-los de forma útil. Ora, o que podemos fazer enquanto
não sentimos Deus fisicamente em nós? Heis porque o salvador
não cessará de dizer aos judeus "que ele não podia
fazer nada por si próprio, que só julgava a partir do que
ouvia, mas que o seu julgamento era justo porque ele não seguia a
sua própria vontade, mas a vontade do seu Pai, que o enviou".
Heis por que também não cessava de acusá-los de pouca
fé, ao repreendê-los por não se apoiarem nos testemunhos
verdadeiros, extraindo toda a sua glória dos homens. Como podeis
crer, vós que buscais a glória uns nos outros e não
buscais de forma alguma a glória que só vem de Deus? (João
5:44).