As
condições necessárias de um verdadeiro libertador se
completaram em Cristo. "Está feito".
Estava
reservado a Ele, o Princípio do Homem, reunir todas estas condições
para o Homem. Nada senão este criativo, vital e vivificante Princípio
poderia ser o verdadeiro libertador, porque o derramamento voluntário
de seu sangue, ao qual nenhum sangue sobre a terra pode ser comparado, foi
capaz, por si só, de realizar o completo deslocamento das substâncias
estranhas mergulhadas no sangue do Homem.
Nada, senão este divino princípio poderia extrair a alma humana
de seu abismo, e identificá-la com sigo próprio, a fim de
que a alma fosse capaz de experimentar os prazeres de sua verdadeira natureza;
só Ele, sendo o depósito da chave de Davi, poderia por um
lado fechar o abismo e, por outro, abrir o Reino da Luz, restaurando oHomem
ao posto que sempre deveria ter ocupado.
Observá-lo somente de um ponto de vista externo e temporal, é
não saber nada sobre o Redentor, é não se elevar, através
de um desenvolvimento da compreensão, ao centro divino a que pertenceu.
Vamos, então, traçar, a partir da diversidade de características
com as quais foi revestido, alguns meios de adequar sua homificação
(Antropomorfização) espiritual as nossas débeis faculdades,
o que precedeu seu advento corporal.
Sendo o Eterno Princípio do Amor, era necessário, antes de
mais nada, que ele tomasse o caráter de Homem imaterial, seu Filho;
e para cumprir tal tarefa, foi suficiente olhar a si próprio no espelho
da Virgem Eterna, ou SOPHIA, no qual sua mente havia gravado, por toda Eternidade,
o modelo de todas as coisas.
Após se tornar Homem imaterial, pelo simples ato de contemplação
de sua mente no espelho da Virgem Eterna ou SOPHIA, era preciso se revestir
com o puro elemento, aquele corpo glorioso que está absorvido em
nossa matéria desde a Queda.
Após se revestir com puro elemento, ele tinha que se constituir de
princípio da vida corporal, unindo-se com o Espírito do Grande
Mundo ou Universo. Depois de se tornar o princípio da vida corporal,
era preciso se tornar elemento terrestre, unindo-se com a região
elementar; para tanto, teve que se fazer carne, no ventre de uma virgem
terrestre, revestindo-se com a carne procedente do pecado do primeiro Homem,
já que foi da carne, elementos e espírito do Universo (Grand
Monde) que veio nos libertar. Sobre isto, tenho que reportar o leitor a
Jacob Boehme que tem emitido tão grande e profunda luz sobre este
assunto.
Agora vemos porque o sacrifício feito pelo Redentor a cada passo,
descendo das alturas de onde caímos, era necessariamente apropriado
a todas as nossas misérias e todos os nossos sofrimentos. Este foi
o único sacrifício que culminou com aquelas confortantes,
ainda que terríveis palavras, "Está feito"; confortantes
pela certeza que nos dá de que a obra está realizada, e de
que nossos inimigos serão colocados sob nossos pés, sempre
que seguirmos os passos daquele que os subjugou; terríveis porque
se permitirmos que se tornem vãs através de nossa ingratidão
e indiferença, nenhum recurso, então, nos restará,
porque não podemos contar com nenhum outro Deus, e não há
nenhum outro libertador a esperar.
Agora não é hora de expiar nossas faltas e limpar nossas manchas
através do sacrifício de animais, já que Ele próprio
expulsou as ovelhas, bois e pombos do Templo. Não é tempo
em que os profetas podem vir e abrir a nós os caminhos do Espírito,
pois já deixariam estes caminhos abertos e o Espírito olha
por nós continuamente.
Finalmente, não é mais tempo de esperar que o Salvador das
nações venha até nós, Ele já veio; sendo
o princípio e o fim de todas as coisas, não podemos agir como
se houvesse outro Deus depois dele, e nem lhe negar uma fé sem limites
e uma convicção universal, já que tudo o que sabemos
sobre isto aprendemos com ele, seria uma ofensa; a fé e a convicção
de fato só poderia repousar nele, real e fisicamente, pois só
o Redentor é universalidade. Está feito.
Desta forma, não temos outro trabalho, outra tarefa senão
a de nos empenhar, ao máximo, a fim de participarmos da obra acabada
e banir de nós tudo o que possa evitar nosso progresso.
Origem
e natureza do mal moral, uma transposição, sua retificação.
Se
o Redentor, pela virtude da simples mas frutífera lei das transposições,
restaurou todas as nossas essências ao seu lugar e fez com que as
trevas e a desordem desaparecessem para o Homem restabelecendo-o em seu
posto, é fácil reconhecer que o mal não é um
princípio essencial eterno, oposto através da necessidade
de sua natureza ao Princípio de Deus, como acreditavam os maniqueistas;
é fácil perceber que, como a liberdade é o caráter
distintivo que coloca o ser moral entre Deus e a matéria, basta deixá-lo
ao uso desta liberdade, que o Autor de todas as coisas não pode dar
e tirar ao mesmo tempo, para conceber tanto a origem do mal nas criaturas
morais como sua natureza inferior.
De acordo com esta explicação do mal, que se apoia unicamente
nas deslocações (transposições) das substâncias,
fica igualmente fácil perceber as várias propriedades e uso
dos sacrifícios, além do processo e efeitos que procuramos
explicar.
Finalmente, é simples perceber o quão vastamente superior
foi o sacrifício do Redentor em relação a todos os
precedentes, já que o próprio príncipe da iniqüidade
que comanda o Homem, teve que ser transposto no abismo; estava reservado
ao próprio supremo e divino comandante da Luz, Força e Autoridade
obter tal vitória.
Não seria demais observar aqui que, embora os sacrifícios
de sangue de Jesus terem tido continuidade após o grande sacrifício,
chegando até à destruição de cidades, o povo
não apreendeu senão a forma; o espírito foi inteiramente
perdido, uma vez que o sacrifício da vítima divina estava
mais longe deles do que nunca.
Portanto, a partir daí, só restou a degeneração
cada vez maior e o período que culminou com a grande expansão
de vingança sobre este povo culpado, mostra, de uma vez, a retirada
da influência protetora (ação) do Espírito, e
os terríveis efeitos da justiça do Espírito vingador;
foi um julgamento severo, que não poderia ser executado ao mesmo
tempo que a obra do Redentor, pois Ele veio unicamente para realizar a obra
do amor e da misericórdia.
A
Instituição da Eucaristia.
Embora
o sacrifício do Redentor tenha colocado os homens numa posição
de cumprir, quanto mais possível, aqui embaixo a sublime tarefa da
regeneração, servindo e se unindo ao espírito e à
verdade, Ele deixou também, quando partiu da Terra, um sinal da aliança,
que poderia trazer sua presença e devoção aos nossos
olhos diariamente; temos visto sinais e testemunhas após as várias
manifestações das leis da justiça, os rituais Levíticos
e as revelações proféticas que tem sido promulgadas
desde o início do mundo.
Ele pretendeu que este sinal de aliança fosse como um desenvolvimento
daquela semente divina que veio semear em nossa estéril e corrupta
terra; e como somos seres compostos, Ele compôs este sinal de várias
substâncias operativas, a fim de que todas as substâncias que
nos compõem possam ser nutridas, preservadas e sustentadas, cada
uma de acordo com sua classe e necessidade. Mas pretendeu, sobretudo, que
esta instituição extraísse todo seu valor do Espírito,
de onde tudo procede e pelo qual tudo é santificado; neste aspecto
devemos observar quantas vantagens tal instituição pode nos
oferecer quando nos elevamos ao sublime sentido que seu criador lhe deu.
Não
há mistério para o Homem Espírito.
Se
está escrito que devemos ser santos, abordemos o que é santo;
devemos também ser espírito, então abordemos o que
é Espírito; esta é a razão pela qual o Homem
terrestre só enxerga com os olhos de trevas e profanação,
enquanto que o Homem Espírito responde por tudo o que lhe é
dado para seu uso e oferecido à sua reflexão.
Os ministros das coisas santas têm feito com que a mente humana reflita
sobre estes assuntos relativos à Eucaristia inserindo, no que chamam
de cerimônias sacramentais, as palavras mysterium fidei (Mistérios
santos), que não aparecem no Evangelho e estavam longe da mente do
Senhor; se nos empenhássemos em nossa verdadeira regeneração,
como Ele nunca deixou de nos advertir, não haveria mistérios
para nós, já que, ao contrário, fomos feitos para trazer
à luz todos os mistérios, na condição de ministros
da Fonte Eterna de Luz.
Como
o espírito trabalha no símbolo.
Vamos
lembrar que o Espírito repousava no cordeiro por ocasião da
libertação do Egito e isto é o que deu todo valor ao
sacrifício. Assim, vamos lembrar que a vida divina repousava, e ainda
repousa, nas substâncias do sacrifício no novo pacto; uma vez
que o Espírito da Verdade não foi espalhado em vão
e não pode ser confundido em seus planos e efeitos; desde o início
do novo pacto (e talvez desde o princípio) podemos nos referir ao
pão e ao vinho como sendo marcados pelo espírito da vida que
tem sido derramado sobre eles.
Não devemos nunca, em tempo algum, comer o nosso pão e beber
nosso vinho sem trazer à mente o sagrado sinal com o qual têm
sido investidos, não permitindo, assim, que caiam diretamente sob
os poderes elementares que não são santos.
Estas substâncias estão unidas ao elemento puro, este está
unido ao Espírito, que por sua vez, está unido ao Verbo e
o Verbo está unido à primeira Fonte Eterna; através
desta ordem harmônica, a instituição da nova aliança
trabalha para o benefício de todos os princípios que nos compõem;
de fato, ela trabalha em espírito e em verdade em todo o nosso ser;
o pão sem fermento purifica nossa matéria; o vinho purifica
nosso princípio de vida animal; o corpo glorioso ou elemento puro
restaura em nós aquele revestimento primitivo que perdemos através
do pecado; o Espírito trabalha nossa compreensão; o Verbo
trabalha na raiz de nossas palavras; a vida trabalha em nossa essência
divina; estes trabalhos consistem na elevação de cada ordem
do ser até um grau além do ponto em que se estende sua ação.
Mais que nada, a instituição do nosso pacto tem como sinais
quatro grandes e eficazes unidades, a saber:
A dupla relação elementar, que é comunicada a nós
nas duas substâncias; a correspondência de todos os eleitos
que tenham auxiliado o sacrifício, desde o início do mundo,
eles estão sentados à mesa santa de onde fazem fluir em nossos
corações, as palavras sagradas que ouvem, superiores talvez,
àquelas conhecidas na consagração; O elemento puro
ou o verdadeiro sangue e carne, que fortalecem todas as nossas faculdades
de inteligência, e nossa atividade no trabalho; e, finalmente, o próprio
Agente Divino que, sob os olhos do Pai, espalha a santificação,
o selo e caráter do que tem recebido; sendo ao mesmo tempo o autor,
ministro e fundador do sinal de sua aliança, restaura nosso peso,
número e medida.
Ora, por que só este Regente Divino pode dar o batismo universal?
Por que é o cordeiro que tira o pecado do mundo? Se não é
unicamente a sua presença que restaura todos os princípios
ao devido lugar, não há desordem senão na transposição?
Mas, sendo sujeito à lei do tempo, que tem dividido todas as coisas,
Ele faz com que a sua virtualidade repousasse sobre os sinais materiais
de sua aliança, apenas de maneira passiva, aguardando uma reação
por parte do Homem renovado; assim, durante o curso de sua obra na Terra,
Ele próprio esperou que a reação do verbo de seu
Pai
desenvolvesse seus próprios poderes.
Por
esta razão é que realizou esta instituição para
os homens regenerados por ele, enquanto ascendia à sua origem, para
beber o novo sumo do vinho celeste e para pronunciar incessantemente, no
reino invisível, palavras de vida correspondentes àquelas
do sacramento. Desta forma, os homens regenerados, que devem administrar
seus sacramentos, estão em relação harmônica
(conformidade) com Ele e sua obra regenerativa, sendo capazes de conectar
com esta obra regenerativa todos aqueles que desejam dela participar, ingressando
em espírito e verdade.
Vamos lembrar que estamos mortos, e que o Redentor teve que penetrar nossa
morte para se tornar como nós; mas como ao entrar em nossa morte
ele não deixou de estar na vida, ao se fazer como nós ele
ainda era nosso princípio único; portanto, ele não
poderia morrer sem se elevar novamente e sem nos elevar com ele; esta ressurreição
foi necessária para que pudéssemos provar, louvar e celebrar
a Vida, que foi e será eternamente, o objetivo da existência
de todo ser espiritual, feito à imagem do Autor Soberano de todos
os seres.
A instituição do Superior tinha, então, o objetivo
de retraçar esta morte e ressurreição em nós,
mesmo antes da dissolução de nossas essências corporais;
isto é, nos ensinar a morrer com o Redentor e com ele nos elevar
novamente. Assim, esta cerimônia religiosa, considerada em toda sua
sublimidade, pode se tornar em nós realmente uma emanação,
criação e regeneração ou uma perpétua
e universal ressurreição; eu diria que pode nos transformar
no reino de Deus, e nos tornar uno com Deus.
A
porção do Homem na ceia; confissão e fé.
Ao
mesmo tempo, é essencial que o ministro repita incessantemente aos
fiéis as palavras do instituidor: "A carne não traz benefício
algum: minhas palavras são espírito e vida"; pois quantos
espíritos tem sido mortos pela letra de outras palavras! Todo pensamento
da carne e do sangue deve ser banido tanto do ministro como de nós,
isto é, devemos ascender, como o Redentor, à região
do puro elemento, nosso corpo primitivo que contém a Eterna SOPHIA,
as duas tinturas, o espírito e o verbo. É somente a este custo
que aquilo que circula no reino de Deus, pode também circular em
nós.
Se não nos elevarmos a esta sublime unidade que abarca todas as coisas,
através de nossos pensamentos, se confundirmos a instituição
com a obra que deve ser realizada internamente e se confundirmos o fim com
os meios, o subsidiário com o essencial, estaremos longe de cumprir
o espírito da instituição. Este espírito requer
que confessemos a morte do Cristo à nossas próprias iniqüidades,
a fim de extraviá-las; confessá-la aos homens de Deus, de
todas as épocas, para que possam estar ativamente presentes em nossa
obra; confessá-la a Deus, para lembrá-lo de que fomos trazidos
à vida desde que Ele selou seu próprio selo e caráter
no libertador que escolheu; finalmente, é necessário que confessemos
esta morte ao inimigo, em todo lugar, a fim de fazê-lo fugir, pois
este foi o objetivo da morte corporal do Redentor.
Ora, a instituição da Ceia foi deixada para nos ajudar a trabalhar
efetivamente nesta obra viva, a qual temos que realizar individualmente.
É nesta obra viva que todas as transposições desaparecem
e tudo retorna à sua própria posição, recuperamos
aquele puro elemento ou corpo primitivo, que só pode ser restaurado
na medida em que sejamos novamente a semelhança de Deus; porque a
verdadeira semelhança de Deus só pode habitar tal corpo.
A
divina forma humana.
Podemos
aqui descobrir a fonte natural de todas aquelas representações
antropomórficas das quais o mundo está cheio. Se os escultores
representam todas as virtudes terrestres e celestes, sob formas humanas,
seja masculina ou feminina; se os poetas personificam todos os deuses e
deusas do Empíreo, além de todos os poderes da natureza e
dos elementos; se sectos religiosos enchem seus templos com estátuas
humanas, o princípio de origem destas práticas não
é, de forma alguma uma ilusão, assim como são os efeitos.
A forma humana primitiva deve, de fato, mostrar-se e reinar em todas as
regiões. O Homem, sendo a imagem e extrato do centro generativo de
tudo o que é, sua forma é o lugar onde todos os poderes de
cada região vinham exercitar e manifestar suas ações;
em uma palavra, era o ponto de correspondência para todas as propriedades
e virtudes. Assim, toda representação que o Homem faz de si
mesmo, reproduz apenas a figura daquilo que poderia e deveria ser, recolocando-o,
figurativamente, numa posição (medida) na qual ele não
está.
Vamos observar, que, quando os sábios comparam o corpo humano com
o dos animais, o que chamam de anatomia comparativa, nosso corpo real não
entra nesta comparação anatômica, o que de fato nos
ensina que somos como outros animais.
Seria melhor que comparassem nosso corpo superior, que não é
animal, com nosso próprio corpo animal, se quisessem obter nossa
verídica anatomia comparativa; não é suficiente observar
coisas em sua similitudes, é essencial observá-las também
em suas diferenças.
Da comparação de nossa forma atual com a primitiva, podemos
obter resultados úteis sobre a questão de nosso destino original;
mas na falta desta importante comparação, que de fato estaria
ao alcance de poucos, devemos ao menos extrair indícios luminosos
sobre nosso estado anterior, das maravilhosas obras que ainda produzimos
através de nossos órgãos corporais; coisas que apesar
de nossa condição de queda e dos meios artificiais aos quais
estamos restritos, devem abrir nossos olhos às maravilhas naturais
que poderíamos ter engendrado se tivéssemos preservado os
direitos pertencentes a nossa forma primitiva.
Imagens religiosas e suas origens.
O abuso do antropomorfismo religioso que encheu os templos com imagens humanas
rapidamente se transformou em objetos de adoração e idolatria
pelo simples fato de ter surgido do exato movimento do coração
de Deus para a restauração da humanidade, no momento de nossa
queda, quando este coração divino se tornou Homem Espírito.
Como o pacto da restauração é implantado em todos os
homens através de sucessivas gerações, eles estão
sempre prontos a vê-lo germinar e a olhar os ídolos humanos
como a expressão e o cumprimento deste pacto ou a necessidade que
tanto sentem de cumpri-lo, embora isto seja desordenado. Além do
mais, os homens estão sempre prontos a formar para si próprios,
tanto interna como externamente, modelos perceptíveis de acordo com
a obra a ser realizada por eles.
Assim, a necessidade de ter um Homem-Deus por perto e a prontidão
em acreditar segundo seu desejo, tem sido a origem dos ídolos humanos
e sua adoração. Depois disso, ficou fácil operar, através
da fraude, sobre a fraqueza e a ignorância a fim de propagar a superstição,
seja de forma absurda ou até criminosa; é sempre necessário,
até mesmo neste caso, excluir a origem espiritual ativa do antropomorfismo,
como mostramos acima.
A
obra da perfeita regeneração após a morte; o poder
do inimigo; a Virgem na alma.
Nada
senão a renovação de nosso ser, aqui embaixo, pode
produzir ao Homem, o que ele procura em vão em suas superstições
e ídolos; esta própria renovação é apenas
uma preparação para a perfeita regeneração,
que, como vimos, só ocorre com a separação de nossos
princípios corporais ou o derramamento de nosso sangue. Além
do mais, após a morte somos removidos para o grande ternário,
ou o triângulo universal, que se estende do Primeiro Ser à
Natureza; cada uma das três ações extraem para si todos
nossos princípios constituintes: divino, espiritual e elementar,
para restabelecê-los, se formos puro, e restaurar a liberdade à
nossa alma, para que acenda novamente à sua fonte. Isto é
o que Cristo permite que seja feito a si mesmo, fisicamente, através
de sua morte e sepultamento.
Mas, se não formos puro, o inimigo que não se opõe
a separação das partes corporais, que pertence à forma,
se opõe à renovação dos princípios sobre
os quais havia obtido o comando e os retém todos ao seu domínio,
para o grande detrimento da alma desafortunada que se tornou sua vítima.
Podemos auxiliar a renovação de nossos princípios apenas
enquanto possuirmos uma Virgem Eterna renascida em nossas almas, pela qual
o Filho do Homem pode habitar a carne, com todas as suas virtudes e poderes;
alcançar o renascimento desta Virgem Eterna em nós é
reviver o corpo primitivo ou o puro elemento. Aqui, vemos escrito no Homem
todas as leis dos sacrifícios simbólicos dos quais o Homem
é realmente o objetivo, mesmo quando ele parece ser apenas um órgão
ou instrumento.
O
Homem é o microcosmo onde o sacrifício é oferecido.
O
Homem sendo uma miniatura dos mundos físico e divino, é certo
que seu corpo contém as essências de tudo o que há na
Natureza, assim como sua alma contém as essências de tudo o
que há na Divindade. Assim, deve haver neste corpo uma correspondência
com cada substância do universo, conseqüentemente, tanto com
animais puros como impuros e com tudo compreendido nos sacrifícios;
embora, não possamos discernir tais essências em nós,
podemos acreditar em suas correspondências externas, através
das figuras e formas perceptíveis que apresentam em nossas mentes,
também através de símbolos e imagens que assumem os
bons e maus espíritos, diariamente e fisicamente para a nossa instrução
ou provação. Contudo não é necessário,
na ocasião do sacrifício, conhecermos tudo isto fisicamente
para que nossa intenção seja pura, viva e para que estes primeiros
passos da lei material se complete em nós; é suficiente que,
pela retidão de nosso senso espiritual natural, permitamos que o
princípio da verdade que nos anima aja, pois Ele tem sob si sacrificadores
que irão sacrificar conosco os animais puros, oferenda que nos será
útil, e separar de nós os animais impuros, que não
devem participar dos sacrifícios. Esta é a lei que atua em
nós e, por assim dizer, nos é desconhecida; ela requer de
nós a pureza legítima ordenada ao povo judeu, mas não
requer mais conhecimento do que tinha o povo quando abordou os sacrifícios;
esta é a lei de nossa infância, que nos conduzirá com
segurança à lei pura de nossa maturidade.
Não duvidemos que o sacrifício destes animais puros em nós
abra um caminho de correspondências salutares, como ocorreu aos hebreus
quando celebraram seus sacrifícios externos.
O efeito seria ainda mais certo e positivo, para cada homem individualmente,
se não fôssemos continuamente perturbados por povos estranhos
que aceitamos no sacrifício e pelos animais impuros que permitimos
estar sob a faca do sacrificador, pois eles nos abrem correspondências
invertidas; tudo deve atuar nos princípios do Homem, enquanto que
na lei simbólica hebraica tudo atuou externamente.
Mas esta obra preliminar, estando além das forças do Homem,
em sua infância, irá ter o ramo de conhecimento de seus mestres
temporais como guia do Homem, dirigindo a obra em seu interior; os mestres
devem responder por este Homem, quando ele chegar na próxima época.
A
jornada individual rumo a Canaã. Os Dez Mandamentos.
Quando
o Homem, devidamente preparado, chega a esta época, a lei espiritual
dentro dele associa-se com o que é perceptível, até
tomar completamente o seu lugar. Esta lei espiritual se anuncia através
de uma incrível iluminação, como ocorreu aos hebreus
no Monte Sinai; ela proclama conosco, em alta voz, o primeiro mandamento:
"Eu sou o Senhor teu Deus, que te fez sair do Egito, da casa da servidão.
Não terás outros deuses diante de minha face".
Esta voz ressoa por todo nosso ser: ela não só faz com que
todos os falsos deuses fujam pelo terror de suas palavras, mas também
destrui todos os povos estranhos e os sentimentos idólatras que temos
vivido entre os Caldeus, até sermos chamados à terra de Canaã.
Posteriormente, proclama todos os outros preceitos do Decálogo, que
nada mais são do que uma necessária seqüência do
primeiro. Como esta lei, terrível ainda que salutar, será
proclamada somente quando já estivermos fora da terra do Egito, desfrutando
da liberdade e engajados na lei do Espírito, deste momento em diante
seremos responsáveis por nossa própria conduta sob a luz da
lei espiritual. Portanto somos felizes ao "gravar esta lei em nossos
corações e ao escrevê-la nos umbrais de nossas portas"
(Deut. VI 9).
A
sujeição espiritual individual, o sacrifício e a libertação
levam à era profética individual.
Neste
estado, a lei do sacrifício ainda nos é, sem dúvida,
necessária; mas nós mesmos somos os Levitas e sacrificadores,
uma vez que temos acesso ao altar e devemos, de acordo com a regra levítica,
sacrificar ao Senhor, diariamente, vítimas de sua própria
escolha, oferecendo aquelas de aroma agradável a Ele.
Devemos oferecer este sacrifício para o nosso próprio progresso
no campo das correspondências, pois ao fazermos um uso santo de nossos
princípios constituintes, nos reunimos às influências
restauradoras (ações) da mesma natureza destes princípios.
Devemos, mais ainda, fazê-lo de forma contínua a fim de nos
adaptarmos ao espírito que se estabeleceu em nós, porque o
ato deste espírito jamais deve ser interrompido, mas sempre reforçado.
Este alto empreendimento que podemos chamar de a primeira idade da lei do
Espírito, está consagrado; este dever é tão
imperativo que se falharmos, rapidamente cairemos no domínio de diferentes
tipos de escravidão, análogas às nossas faltas; porém
quando oprimidos pelo jugo dos déspotas, choramos ao Deus Todo-Poderoso,
e Ele envia os libertadores para nos colocar novamente no caminho certo.
Os auxílios que Ele envia estão fundamentados na centelha
de vida e na luz semeada em nós na medida em que invocamos a lei
espiritual; esta nunca é totalmente extinta por nossas faltas, mas
se fermenta ainda mais sob confinamento e sob as tormentas dos diferentes
tipos de escravidão, emitindo alguns raios que a Divindade reconhece
como pertencentes a Si, o que O induz a descer e auxiliar Suas miseráveis
criaturas.
Ele, assim, procedeu com os hebreus, quando chegou a hora da libertação
do Egito; não se pode esquecer que eles eram os filhos da promessa
e carregavam consigo o espírito da eleição de seu pai;
assim Ele procedeu com eles diante dos Juizes, quando representaram o Homem
emancipado ou sob a lei da liberdade. É desta forma que sob uma quase
ininterrupta alternação de quedas e recuperações
chegamos à segunda idade do espírito, a profética.
Quando a idade profética individual é alcançada completamente,
o espírito do Homem queima com ele a fim de propagar a Verdade, dá-se
o início da Misericórdia.
Foi dito ao pai dos Judeus que todas as nações deveriam ser
abençoadas nele. Ora, até a idade profética, o povo
hebreu viveu bem separado das outras nações; a única
relação que mantiveram com elas foi de luta; a lei proibiu
que se aliassem com estranhos e ordenou que praticassem os rituais e cerimônias
dos quais eram depositários, para seu próprio progresso; esta
é uma representação do que devemos fazer durante nossa
primeira idade ou lei espiritual, quando devemos nos separar de tudo aquilo
que possa impedir nosso crescimento ou a aquisição de dádivas
necessárias; que as nações possam, algum dia, ser abençoadas
em nós.
Contudo, quando a idade profética chegou, os germens da Misericórdia
foram primeiramente semeados em Israel, assim como a instituição
dos sacrifícios havia plantado neles os primeiros germens do Espírito.
Este povo que, até a idade profética, só pensou em
si e desprezou todos os outros povos, começou, através da
alma de seus profetas, a se sentir entusiasmado pelo retorno de outras nações
à verdade.
Os profetas se tornaram oprimidos e aflitos por todos os males que afligiram,
não só Israel, mas todas as nações pecadoras
à sua volta. Eles foram enviados a declarar a ira do Senhor em Nineveh,
Egito, Babilônia e na ilha dos Gentis.
A razão para isto é simples, era o momento em que as promessas
da aliança com Abraão começaram a ser cumpridas; mas
como os hebreus estavam mais adiantados com relação ao cumprimento
destas promessas do que as outras nações, foram os primeiros
a sentir as dores da Misericórdia, enquanto que os outros recebiam,
até então, apenas advertências. Assim, quando o homem
individual passa a primeira idade espiritual, também começa
a sofrer pelas trevas de seus semelhantes e é pressionado pelo desejo
de trazê-los à verdade.
Neste novo estágio, o Homem continua, sem dúvida, a observar
a lei dos sacrifícios, que não pode ser inteiramente realizada
até que derrame seu sangue; mas se acerca dele uma forte influência
(ação) que em conjunto com a ação da primeira
idade espiritual tomam o domínio sobre ele e o guia, é a própria
Ação divina que está começando a aparecer no
mundo: ela ainda deixa o Homem livre, pois é apenas uma lei iniciatória
e um alerta.
Vemos muitos profetas resistirem às ordens que lhe são dadas;
vemos homens, na sua segunda idade espiritual que não usam adequadamente
os auxílios que lhes são oferecidos; é por esta razão
que muitos eleitos nunca chegam à plenitude de sua eleição.
Não é menos verdade, contudo, que nesta segunda idade espiritual,
ou em outros termos, esta primeira idade divina, o verdadeiro espírito
de sacrifício que originalmente tinha como único objetivo
a caridade e a felicidade dos outros, começa a ser cumprido.
O Espírito divino, descendendo sobre os profetas e pousando sobre
eles o peso das nações, aliviou parte do peso que oprimia
estas nações, que se tornaram capazes de melhor receber os
primeiros raios de luz que as levariam ao caminho certo; em resumo, foram
capazes, através das dores e angústias dos profetas, de ver
se realizar sobre eles o que fora realizado perceptivamente por meios de
sacrifícios materiais.
O homem individual, chegando a esta segunda idade espiritual, tem o mesmo
emprego; podemos dizer que é só então que se inicia
a idade da maturidade, ou verdadeiro Ministério Espiritual do Homem;
é só então que ele realmente começa a ser útil
aos seus irmãos, visto que, na idade anterior, ele era útil
apenas à Natureza e a si próprio.
A
idade divina para a bênção de todos.
Quando
a grande época da salvação chegou, o verdadeiro espírito
de sacrifício adquiriu uma extensão ainda maior; não
era mais limitado, como na primeira idade espiritual, ao progresso de um
povo particular e nem aos meros alertas dados às nações,
como no tempo dos profetas; ela abarcou toda a família humana, impulsionando
todas as coisas em direção ao cumprimento da promessa feita
por Abraão, nele todos deveriam ser abençoados.
A grande época divina do Redentor recolocou o Homem no caminho da
verdadeira recuperação e lhe deu os meios de libertar os escravos
(com ele) da casa da servidão, manifestando a todos os planos e a
toda ordem de coisas a Glória, Justiça e Poder do Ser Supremo
cujo selo e caráter foram investidos no Homem pelo Santo Redentor.
Vemos aqui o verdadeiro significado da palavras dirigidas a Jeremias (I.10):
"Vê: dou-te hoje poder sobre as nações e sobre
os reinos para arrancares e demolires, para arruinares e destruíres,
para edificares e plantares", pois Jeremias era um profeta designado
apenas para os reinos terrestres enquanto que o reino de Cristo designou
o Homem para todos os reinos espirituais.
Paz
e harmonia sob a nova lei do Amor.
Vimos
que quando o Homem chegou, pela primeira vez, na lei do Espírito,
recebeu os preceitos do Decálogo: "Eu sou o Senhor teu Deus".
Quando chegou na lei do Redentor, recebeu o mandamento de "amar o próximo
como a si mesmo"; esta é a chave da obra do Cristo, pois que
Homem sob escravidão, não faria tudo a fim de recuperar sua
liberdade? Da mesma forma, ele deve fazer todo esforço possível
para promover a liberdade do próximo se ele o ama como a si mesmo;
se o Homem não ama o próximo como a si mesmo ele não
é iniciado no espírito do Redentor que sustentou o amor a
ponto de se lançar ao abismo em que nos encontrávamos para
nos arrancar de lá consigo.
Ainda que de uma forma limitada, podemos executar aos nossos semelhantes
a imensurável obra que o redentor executou a toda família
humana ao quebrar os portões de sua prisão e morte diante
de seus olhos; ainda é somente através de seu espírito
que somos capazes de realizar a parte que nos cabe; se, através do
sacrifício de animais, a lei destruiu as influências temporais
regulares sobre o Homem; se através da lei profética, a Sabedoria
trouxe influências espirituais regulares sobre as nações,
nós, através da voz do amor e santidade do Redentor, podemos
atrair sobre todos nós as próprias virtudes divinas, com paz,
ordem e sagrada harmonia, de acordo com nossa capacidade aqui embaixo.
O
aperfeiçoamento de nossas faculdades daqui para frente requer o sacrifício
de tudo o que é deste plano.
Quando
o revestimento de nossa existência se dissolver, quando o tempo já
tiver passado por nós, suavemente, como um rolo de papel pergaminho,
iremos apreciar o espírito da vida mais profundamente e beber com
o Redentor o sumo fresco do vinho eterno que irá restaurar nossas
faculdades em toda sua amplitude, a fim de serem empregadas segundo a sua
determinação.
Contudo é em vão que prometemos a nós mesmos tal coisa,
se não realizarmos sinceramente todos os nossos sacrifícios
neste plano; não somente aqueles pertencentes a renovação
pessoal, mas aqueles relacionados a oferta voluntária de todo o nosso
ser terrestre e mortal, através de um cuidado diário de nossa
parte, a fim de nos tornarmos uma vítima ordenada, sem manchas ou
vergonha. Pois, na região invisível que entramos ao deixar
este mundo, não encontraremos mais terra para receber os diferentes
tipos de sangue, que devemos derramar, necessariamente, para recuperar nossa
liberdade; e, se levarmos conosco nossa corrupção, provavelmente
contida nestes diferentes tipos de sangue, nada nos restará além
do sofrimento e da angústia, já que o tempo e o lugar para
o sacrifício voluntário terão passado.
Esta
vida é nossa décima primeira hora: trabalhe nela!
Vamos,
então, nos preocupar com a vida real; com aquela obra ativa a qual
devemos cada instante de nosso tempo e não deixemos de perguntar
se haverá alguma futura angústia a temer ou não; tal
será nossa preocupação e desejo de retidão.
O crime é a causa destes pensamentos desgastantes e o que leva o
Homem ao crime é a inação, através do vazio
da mente; o vazio da mente (espírito) joga o Homem no desencorajamento,
fazendo-o acreditar que o tempo perdido não pode ser recuperado.
Isto, de fato, pode ser verdade com relação a coisas feitas
no tempo e para o tempo; mas será válido para o que pertence
ao espírito? Não há tempo para o espírito...
Não seria possível que um único ato realizado pelo
espírito e para o espírito rendesse à alma tudo o que
ela falhou em adquirir ou até mesmo tudo o que possa ter perdido
pela negligência?
Devemos lembrar da "décima primeira hora", embora devemos
também notar que, se aqueles que foram chamados àquela hora,
receberam até mais do que sua devida paga, foi porque eles pelo menos
trabalharam durante aquela hora, ao contrário, não teriam
recebido nada; assim nós também não devemos ter nada
a esperar, se, após termos passado as horas antecedentes de forma
infrutífera, não completarmos nossa décima primeira
hora, realizando a obra do Espírito.
Desde a Queda, só podemos ser meros trabalhadores da décima
primeira hora, que, de fato, teve início no instante em que fomos
privados de nossos direitos. As dez horas que precederam esta época,
estão, por assim dizer, muito longe e perdidas para nós; assim
a totalidade de nossa vida terrestre é realmente, para nós,
senão a décima primeira hora de nosso verdadeiro e eterno
dia, que embarca o círculo universal das coisas. Julgue a partir
daí, se temos um momento sequer a perder!
Obstáculos
e cruzes são pontos de partida: "Eu te digo, vigiai!"
Ao
mesmo tempo, tudo o que é requisito para um desempenho útil
e proveitoso na obra desta décima primeira hora, nos é fornecido
abundantemente; planos, materiais, instrumentos, nada é retirado
de nós. Até mesmo os perigos e obstáculos aos quais
nos deparamos e os quais se tornam nossas cruzes quando fugimos deles, são
passos e meios de elevação quando superados; a Sabedoria,
ao nos expor a eles espera que triunfemos.
Sim, se tivéssemos mantido nosso posto fielmente, o inimigo nunca
teria penetrado a fortaleza, por mais poderoso que fosse. Mas, é
necessário guardar todas as entradas com tal vigilância constante
que, de qualquer forma que ele se apresente, possa nos encontrar alerta
e com vigor para resistir. Um único instante de negligência
de nossa parte, é suficiente para o inimigo, que nunca dorme, fazer
uma brecha, ascender e capturar o indivíduo.
Vamos tomar coragem. Se nossa restauração espiritual requer,
na realidade, todo o cuidado, devemos ao menos considerá-la assegurada
se resolvermos, pelo menos, assumi-la, pois a enfermidade da alma humana
é, se é que posso usar a expressão, apenas uma espécie
de transpiração reprimida; o Soberano não cessa de
nos administrar sudoríficos poderosos e salutares que tendem incessantemente
a restaurar a ordem e a circulação.