A Oração
Annie Bresan


O que é algumas vezes chamado de "o espírito moderno" é excessivamente antagônico à oração, falhando em ver qualquer nexo causal entre a petição e a ocorrência de um evento, ao contrário do espírito religioso, fortemente ligado a ela, e que encontra sua própria vida na oração. Mas mesmo o homem religioso às vezes se sente desconfortável a respeito do mecanismo da oração; estaria ele ensinando ao Todo-sábio, estaria solicitando benefícios do Todo-bondade, estaria ele alterando a Vontade d'Aquele "em quem não há variação, nem sombra de desvio"? (Tiago, I, 17). Embora ele encontre em sua própria experiência e na de outros a "resposta às preces" - uma seqüência definida de pedido e atendimento.
Muitas pessoas não se referem a experiências subjetivas, mas a fatos concretos do chamado mundo objetivo. Um homem reza por dinheiro, e no correio lhe vem a quantia requerida; uma mulher reza por comida, e alguma comida lhe é entregue na porta. Em conexão a atos de caridade, existe uma pletora de evidências de ajuda conseguida em casos de necessidades urgentes quando solicitada em preces, e da pronta e generosa resposta. Por outro lado, também há uma abundância de evidência de preces deixadas sem atendimento; de famintos definhando de fome até a morte, de crianças roubadas dos braços de suas mães pelas doenças, a despeito dos mais passionais apelos a Deus.
E não é tudo. Há muitos fatos nesta experiência que são estranhos e confusos. Uma prece que talvez seja trivial encontra uma resposta, enquanto que outra a respeito de um assunto importante falha; um pequeno problema é aliviado, enquanto que uma oração proferida para salvar um ser apaixonadamente amado não tem resposta. Parece quase impossível para o estudante comum descobrir a lei de acordo com a qual uma oração é ou não eficaz.


A primeira coisa necessária ao buscarmos entender esta lei é analisar a própria oração, pois a palavra empregada para abranger várias atividades da consciência, e as orações não podem ser abordadas como se formassem um todo simples. Existem preces que são pedidos para vantagens definidamente mundanas, para o suprimento de necessidades físicas - orações por comida, roupa, dinheiro, emprego, sucesso nos negócios, recuperação de doenças, etc. Estas podem ser agrupadas como Classe A. Depois temos as preces por ajuda em dificuldades morais ou intelectuais e para o crescimento espiritual - para a superação de tentações, para fortalecimento, para discernimento, por iluminação. estas podem ser agrupadas como Classe B. Enfim, há as preces que não pedem nada, que consistem em meditação e adoração da perfeição divina, na intensa aspiração de união com deus - o êxtase do místico, a meditação do sábio, o rapto alado do santo. Esta é a verdadeira "comunhão entre o Divino e o humano", quando o homem derrama-se em amor e veneração por AQUILO que é inerentemente atraente, que compele o amor do coração. Estas chamaremos de Classe C.


Nos mundos invisíveis existem muitos tipos de inteligências que entram em relacionamento com o homem, uma verdadeira escada de Jacó, por onde os Anjos sobem e descem, e acima de todos fica o próprio Senhor (Gênesis, XXVIII, 12-13). Algumas destas Inteligências são grandes Poderes espirituais, outras são seres excessivamente limitados, inferiores ao homem em consciência. Este lado oculto da natureza - sobre o qual logo falaremos no Capítulo XII - é um fato reconhecido por todas as religiões. O mundo está todo cheio de coisas vivas, invisíveis aos olhos de carne. Os mundos invisíveis interpenetram o visível, e multidões de seres inteligentes se amontoam à nossa volta de todos os lados. Alguns deles são acessíveis a solicitações humanas, e outras são submissíveis à vontade humana. O Cristianismo reconhece a existência das classes superiores de Inteligências sob o nome genérico de Anjos, e ensina que eles são espíritos ministrantes, "enviados para ministra" (Hebreus, I 14), mas qual é seu ministério, qual a natureza de seu trabalho, qual sua relação com os seres humanos, tudo isto fazia parte das instruções dadas nos Mistérios Menores, assim como a verdadeira comunicação com eles era efetuada nos Maiores, mas nos dias modernos estas verdades caíram na obscuridade, exceto o pouco que é ensinado nas comunhões Grega e Romana. Pois para a Protestante o "Ministério dos Anjos" é pouco mais que uma frase. Além disso, o próprio homem é um constante criador de seres invisíveis, pois as vibrações de seus pensamentos e desejos cria formas de matéria sutil cuja única vida é o pensamento ou desejo que as anima; assim ele cria um exército de servos invisíveis, que se movem nos mundos invisíveis procurando atender à sua vontade. Ainda, naqueles mundos existem auxiliares humanos, que enquanto seus corpos físicos estão dormindo trabalham em seus corpos sutis, cujo ouvido atento pode ouvir um grito por socorro. E coroando tudo há a onipresente e onisciente Vida do próprio Deus, potente e responsiva em todos os pontos de Seu reino, Ele, sem cujo conhecimento nem um pardal cai ao solo (Mateus, X, 29), nem uma criatura muda freme de alegria ou dor, nem uma criança ri ou soluça - esta Vida e Amor todo-penetrante, todo-abrangente, todo-sustentadora, na qual vivemos e nos movemos (Atos, XVII, 28). Assim como nada que pode dar prazer ou dor pode afetar o corpo humano sem que nervos sensórios levem a mensagem de seu impacto até os centros cerebrais, e assim como lá daqueles centros vibra uma resposta que acolhe ou repele, do mesmo modo, toda vibração no universo, que é Seu corpo, toca a consciência de Deus, e provoca uma ação responsiva. Células nervosas, feixes nervosos e fibras musculares podem ser os agentes da sensação e do movimento, mas é o homem que sente e age; igualmente miríades de inteligências podem ser os agentes, mas é Deus que as conhece e responde. Nada pode ser pequeno o bastante para não afetar aquela delicada consciência onipresente, e nada pode ser vasto o bastante para transcendê-la. Somos tão limitados que a própria idéia de uma consciência todo-abrangente assim nos dá vertigem e confunde; talvez uma mosca pudesse ficar igualmente perplexa se tentasse avaliar a consciência de Pitágoras. O Professor Huxley, em uma passagem notável, imaginou a possibilidade da existência de seres ascendendo tão alto em inteligência, a consciência sempre em expansão, e atingindo um estágio tão acima do humano como o humano está acima do besouro (T.H.Huxley, Essays on Some Controverted Questions, p. 36). Isto não é um vôo de imaginação científica, mas a descrição de um fato. Existe um Ser cuja consciência está presente em cada ponto de Seu universo, e portanto pode ser afetado de todos os pontos. Esta consciência não é apenas vasta em seu campo, mas é ainda inconcebivelmente aguda, não diminuída em sua capacidade de responder por que se estende em uma vasta área em todas as direções, mas sendo mais responsiva do que uma consciência mais limitada, mais perfeita em entendimento do que uma mais restrita. Longe de ser o caso de que quanto mais exaltado Ser mais difícil seria alcançar Sua consciência, mas o exato inverso é a verdade. Quanto mais exaltado o Ser, mais facilmente Sua consciência é afetada.


Mas esta Vida todo-penetrante está em toda parte usando como canais todas as vidas corporificadas a que deu origem, e qualquer uma delas pode ser usada como um agente daquela Vontade onisciente. A fim de que esta Vontade possa se expressar no mundo externo, deve ser encontrado um meio de expressão, e estes seres, em proporção à sua receptividade, oferecem os canais necessários, e se tornam os obreiros intermediários entre um ponto e outro do cosmos. Eles agem como os nervos motores de Seu corpo, e executam a ação requerida.


Analisemos as classes em que dividimos as orações, e vejamos os métodos pelos quais elas podem ser atendidas.
Quando um homem faz uma prece da Classe A existem vários meios pelos quais sua prece pode ser atendida. Um tal homem é simples em sua natureza, com uma concepção de Deus natural, o que é inevitável em seu grau de evolução; ele considera Deus como provedor de suas próprias necessidades, em contato íntimo e imediato com suas necessidades diárias, e ele se volta para Ele por seu pão diário tão naturalmente como uma criança se voltaria para seu pai ou mãe. Um exemplo típico é o caso de George Müller, de Bristol, antes de ser conhecido pelo mundo como filantropo, quando estava começando seu trabalho caritativo, e estava sem amigos e sem dinheiro. Ele orava por comida para as crianças que não tinham recursos exceto sua bondade, e sempre vinha dinheiro suficiente para as necessidades imediatas. O que acontecia? Sua prece era um desejo forte e enérgico, e aquele desejo criava uma forma, da qual ele era a vida e a energia dirigente. esta criatura viva a vibrante só possuía uma idéia, a idéia que a animava - é preciso ajuda, é preciso comida - e ela vasculha o mundo invisível, procurando. Um homem caridoso deseja dar ajuda aos necessitados, está à procura de uma oportunidade de dar. Assim como o ímã atrai o ferro, igualmente assim uma pessoa funciona para uma forma de desejo como aquela, e a forma é atraída para ela. Ela desperta no cérebro da pessoa uma vibração idêntica à sua - George Müller, seu orfanato, suas necessidades - e ela vê o canal para seu impulso caridoso, assina um cheque, e o envia. Muito naturalmente, George Müller diria que Deus inspirou ao coração daquele indivíduo dar a ajuda necessária. No sentido mais profundo das palavras, assim é, uma vez que não existe vida ou energia em Seu universo que não provenha de Deus; mas o agente intermediário, de acordo com as leis divinas, é a forma de desejo criada pela oração.


O resultado poderia ser obtido igualmente bem através de um deliberado exercício da vontade, sem qualquer oração, por uma pessoa que entende o mecanismo envolvido e o modo de colocá-lo em operação. Um homem destes pensaria claramente no que necessita, atrairia para si o tipo de matéria sutil mais adequada ao seu propósito, para revestir o pensamento, e por um deliberado exercício da vontade a enviaria ou para uma pessoa definida para apresentar sua vontade, ou para vasculhar as redondezas e ser atraída por uma pessoa caritativamente disposta. Aqui não existe prece, mas um exercício consciente da vontade e do conhecimento.
No caso da maioria das pessoas, contudo, ignorante das forças dos mundos invisíveis e desabituadas a exercitar suas vontades, e sem a concentração da mente e o ardente desejo que são necessários para uma ação bem-sucedida, são muito mais facilmente atraídas pela oração do que por um deliberado esforço mental para aplicar sua própria força. Elas duvidariam de seu poder, mesmo se entendessem a teoria, e a dúvida é fatal ao exercício da vontade. Que a pessoa não entenda o mecanismo que aciona não afeta em nada o resultado. Uma criança que estende sua mão e pega um objeto não precisa entender nada do trabalho dos músculos, nem das alterações elétricas e químicas desencadeadas nos músculos e nervos pelo movimento, nem precisa calcular elaboradamente a distância do objeto medindo o ângulo feito pelos eixos ópticos; ela quer pegar a coisa que deseja, e o aparato do seu corpo obedece sua vontade embora ela sequer saiba de sua existência. Assim se passa com o homem que reza, desconhecedor da força criativa de seu pensamento, da criatura viva que enviou para cumprir sua ordem. Ele age inconscientemente como a criança, e como a criança obtém o que quer. Em ambos os casos Deus é igualmente o Agente primordial, vindo d'Ele todo o poder; em ambos os casos o verdadeiro trabalho é feito pelo aparato provido por Suas leis.


Mas este não é o único modo pelo qual uma prece desta classe é respondida. Alguém temporariamente fora do corpo físico e trabalhando nos mundos invisíveis, ou um Anjo que passa, podem ouvir o grito por socorro, e podem então colocar no cérebro de alguma pessoa caridosa o pensamento de enviar a ajuda requerida. "pensei em Fulano esta manhã", dirá uma pessoa assim. "Arrisco dizer que um cheque lhe seria útil". Muitas preces são atendidas desta forma, e o elo entre a necessidade e o ser que a atende é alguma inteligência invisível. Isto é parte do ministério dos Anjos inferiores, e assim eles suprirão necessidades pessoais, e igualmente levarão ajuda a empreendimentos caridosos.
A falha na prece desta classe é devida a uma outra causa oculta. Todos os homens contraíram débitos que devem ser pagos; seus pensamentos errôneos, seus desejos impróprios e ações erradas construíram obstáculos em seu caminho, e ás vezes até mesmo o tolhem como se estivesse dentro dos muros de uma prisão. Um débito de mal é pago com sofrimento, um homem deve suportar as conseqüências dos erros que fez. Um homem condenado a morrer de fome pelas suas próprias más ações no passado pode bradar suas preces contra este destino em vão. A forma de desejo que ele criou irá procriar mas não vai encontrar, ela será bloqueada e desfeita pela corrente do mal passado. Aqui, como em tudo, estamos vivendo em um reino de lei, e forças podem ser modificadas ou inteiramente frustradas pela atuação de outras forças com que entram em contato. Duas forças exatamente similares poderiam ser aplicadas para duas bolas exatamente iguais; em um dos casos, uma força poderia ser aplicada na bola, e ela poderia alcançar a marca desejada; no outro, uma segunda força poderia atingir a bola e deixá-la completamente fora de curso. Do mesmo modo com duas preces similares; uma pode ir até seu objetivo desimpedida e produzir seu efeito; a outra poderia ser desviada pelas forças muito mais poderosas de um erro passado. Uma prece é atendida, a outra, não; mas em ambos os casos o resultado segue a lei.
Consideremos as orações da Classe B, por ajuda em dificuldades morais e intelectuais têm um resultado duplo; atuam diretamente para atrair a ajuda, e reincidem na pessoa que ora. Elas atraem a atenção dos Anjos, ou dos discípulos trabalhando fora do corpo, que estão sempre procurando ajudar a mente desolada, lançando na consciência cerebral conselho, encorajamento, iluminação, dando assim uma resposta à prece do modo mais direto. "E Ele ajoelhou-Se e rezou... e apareceu um Anjo do céu, confortando-O" (Lucas, XXII, 42-43). São sugeridas idéias que clareiam uma dificuldade intelectual, ou lançam luz sobre algum obscuro problema moral, ou é derramado o mais doce conforto sobre o coração sofrido, suavizando suas perturbações e acalmando suas ansiedades. E na verdade, se mesmo nenhum Anjo estiver passando, aquele grito, o grito do sofredor alcançaria o "Coração Oculto do Céu", e um mensageiro seria enviado para levar conforto, algum Anjo, sempre pronto a voar célere ao sentir o impulso, trazendo a vontade divina de ajudar.


Há também o que é chamado às vezes de resposta subjetiva a tais orações, a reação da prece sobre quem a profere. Sua oração coloca seu coração e mente em atitude receptiva, e isso pacifica sua natureza inferior, e assim permite à força e poder iluminador do superior fluir desimpedida. As correntes de energia que normalmente fluem para baixo, ou para fora, do Homem Interno, são, como regra, dirigidas para o mundo externo, e são usadas nos assuntos comuns da vida pela consciência cerebral, para o desempenho de suas atividades diárias. Mas quando esta consciência cerebral afasta-se do mundo externo, e fechando suas portas externas, dirige seu olhar para dentro, quando deliberadamente fecha-se para o externo e abre-se para o interno, então se torna um vaso capaz de receber e guardar, em vez de ser apenas um canal entre os mundos interior e exterior. No silêncio obtido pela cessação dos ruídos das atividades externas, a "voz ainda fraca" do Espírito pode se fazer ouvir. e a atenção concentrada da mente expectante lhe permite captar o suave sussurro do seu Eu Interno.
A ajuda vem ainda mais nítida de fora e de dentro quando a prece é por iluminação espiritual, por crescimento espiritual. Não apenas todos os auxiliares, angélicos e humanos, avidamente procuram estimular o progresso espiritual, colhendo cada oportunidade oferecida pela alma aspirante, mas o anelo por tal crescimento libera energia de um tipo elevado, e o anelo espiritual suscita uma resposta do reino espiritual. Mais uma vez a lei de vibração simpática se impõe, e a nota de elevada aspiração é respondida por uma nota de seu próprio tipo, pela liberação de energia de seu próprio tipo, por uma vibração sincrônica consigo mesma. A Vida divina está sempre pressionando de cima contra os limites que a tolhem, e quando a força ascendente encontra aqueles limites a partir de baixo, a parede de separação é derrubada, e a Vida divina enche a Alma. Quando um homem sente o influxo de vida espiritual, ele grita: "Minha prece foi atendida, e Deus mandou Seu Espírito ao meu coração". Assim é em verdade, embora ele raramente entenda que aquele Espírito está sempre procurando entrar, mas aquele que O procura não O recebe (João, I, 11). "Ouvi, eu estou à porta e bato: se algum homem ouve minha voz e abre a porta, eu entro" (Apocalipse, III, 20).


O princípio geral a respeito de todas as preces desta classe é que a resposta virá, da vida mais vasta de dentro e de fora, na exata proporção da submissão da personalidade e da intensidade da aspiração ascendente. Nós separamos a nós mesmos. Se acabássemos com a separação e nos fizéssemos unos com o maior, teríamos aquela luz e vida e força fluindo dentro de nós. Quando a vontade separada é desviada de seus próprios objetivos e se dispõe a servir os propósitos divinos, então a força do Divino se derrama. À medida em que um homem luta contra a corrente, ele faz pequeno progresso; mas quando nada a favor, é levado com toda a força da correnteza. Em todo departamento da Natureza as energias divinas estão atuando, e tudo que um homem faz ele o faz por meio das energias que estão atuando na linha ao longo da qual ele deseja agir; suas maiores conquistas são realizadas não por suas próprias energias, mas pela habilidade com que ele seleciona e combina as forças que o auxiliam, e neutraliza as que se opõe a ele com aquelas que lhe são favoráveis. Forças que nos carregariam como folhas no vento se tornam nossos mais eficazes servidores quando trabalhamos com elas. Então admira que na prece, assim como em tudo mais, as energias divinas se associem com o homem que, pela oração, procura trabalhar como parte do Divino?
A forma mais elevada de prece da Classe B imerge quase imperceptivelmente na Classe C, onde a prece perde seu caráter peticional e se torna ou uma meditação sobre, ou uma adoração a Deus. Meditação é a constante fixação tranqüila da mente em Deus, por onde a mente inferior é aquietada e logo deixada vacante, para que o Espírito, escapando dela, erga-se em contemplação da Perfeição divina, e reflita em si mesmo a imagem divina. "A meditação é a prece silenciosa ou não pronunciada, ou como Platão expressou: 'a ardente sintonização da Alma em direção ao Divino; não para pedir qualquer bem em particular (como no sentido comum da prece), mas pelo bem em si, pelo Bem Supremo Universal' " (H.P.Blavatsky, Key to Theosophy, p. 10)


Esta é a oração que, pela liberação do Espírito, é o meio de união entre homem e Deus. Pela atuação das leis do pensamento um homem se torna o que ele pensa, e quando ele medita nas perfeições divinas ele gradualmente reproduz em si mesmo aquilo onde sua mente se fixa. Uma tal mente, moldada sobre o superior e não sobre o inferior, não pode prender o Espírito, e o Espírito livre, ascendendo á sua fonte, abandona a prece na união e deixa a separatividade para trás.
O culto também, o rapto de adoração de onde está ausente todo o pedido, e que procura derramar-se em puro amor pelo Perfeito, embora fracamente percebido, é um meio - o mais fácil - de unir-se a Deus. Aqui a consciência, limitada pelo cérebro, contempla em êxtase mudo a imagem que cria d'Aquele que se sabe estar além da imaginação, e muitas vezes, raptado na intensidade de seu amor além dos limites do intelecto, o homem como um Espírito liberto voa para o alto até os reinos onde estes limites são transcendidos, e sente e sabe muito mais do que em seu retorno ele poderá contar em palavras ou cingir numa forma.
Assim o Místico contempla a Visão Beatífica; assim o Sábio descansa na calam da Sabedoria que está além do conhecimento; assim o Santo alcança a pureza onde Deus é visto. Tal prece irradia o adorador, e da montanha de tão elevada comunhão desce até os planos da Terra, com a própria carne brilhando com a glória superna, translucente à chama que arde no interior. Feliz daqueles que conhecem a realidade que nenhuma palavra pode expressar àqueles que não a conhecem. Aqueles cujos olhos viram "o Rei em Sua formosura" (Isaías, XXXIII, 17) lembrarão, e vão entender.


Quando a prece é entendida assim, sua perene necessidade para todos os que acreditam na religião ficará patente, e vemos por quê esta prática tem sido tão advogada por todos os que estudam a vida superior. Pois a oração do estudante dos Mistérios Menores deveria ser dos tipo reunidos na Classe B, e ele deveria tentar se elevar até à pura meditação e adoração da última classe, evitando todos os tipos inferiores. É útil para ele neste ponto o ensinamento de Jâmblico, pois ele diz que a oração "produz uma sagrada e indissolúvel união com os Deuses", e então passa a dar alguns detalhes interessantes sobre a prece, como considerada pelo Ocultista praticante. "Pois é em si uma coisa digna de ser conhecida, e torna mais perfeita a ciência a respeito dos Deuses. Digo, portanto, que a primeira espécie de oração é Coletiva; ela também é a que guia o contato com e o conhecimento da divindade. A segunda espécie é o vínculo da Comunhão consensual, desencadeando, antes que a energia da fala, os dons concedidos pelos Deuses, e aperfeiçoando o todo de nossas operações antes do que nossas concepções intelectuais. E a terceira e mais perfeita espécie de oração é o selo da União inefável com as divindades, em quem ela estabelece todo o poder e autoridade da prece, e faz com que a alma repouse nos Deuses, como num porto infalível. Mas destes três tipos, onde todas as proporções divinas estão incluídas, a adoração suplicante não só concede a amizade dos deuses, mas supernamente oferece-nos três frutos, como se fossem os Pomos de ouro das Hespérides. O primeiro pertence à iluminação; o segundo à uma comunhão de operações, mas através da energia do terceiro recebemos um plenitude de fogo divino... Nenhuma operação, contudo, em assuntos sagrados pode ser bem-sucedida sem a intervenção da prece. Enfim, o contínuo exercício da prece nutre o vigor de nosso intelecto, e torna o receptáculo da alma muito mais capaz para as comunicações dos Deuses. Do mesmo modo é a chave divina que abre ao homem a intimidade com os Deuses; acostuma-nos aos esplêndidos rios de luz superna; em breve espaço de tempo aperfeiçoa nossos mais recônditos recessos, e os dispõe para o abraço e contato inefáveis dos Deuses; e não desiste antes que nos leve ao topo de tudo. Gradual e silenciosamente direciona para cima os modos de nossa alma, desviando-a de tudo o que é alheio à natureza divina, e reveste-nos das perfeições dos Deuses. Além disso, produz uma indissolúvel comunhão e amizade com a divindade, alimenta uma amor divino, e inflama a parte divina da alma. O que quer que haja de oposto e contrário na natureza da alma, ele o expia e purifica; expele o que quer que seja inclinado à geração e não retém nada das escórias da mortalidade em seu espírito esplêndido e etéreo; aperfeiçoa uma esperança e fé positivas a respeito da recepção da luz divina e, em uma palavra, torna aqueles por quem é empregada os familiares da casa dos Deuses" (On the Mysteries, seç., V, cap. 26).
Deste estudo e prática surge um resultado inevitável, à medida em que um homem comece a entender e à medida que um panorama maior da vida se desdobre diante dele. Ele vê que pelo conhecimento sua força é muito aumentada, que há forças ao seu redor que ele pode entender e controlar, e que o seu poder está na proporção de seu conhecimento. Então ele aprende que a Divindade está escondida em si mesmo, e que nada que é passageiro pode satisfazer o Deus interior; que somente a união com o Uno, o Perfeito, pode aplacar seus desejos, e então gradualmente nasce dentro dele a vontade de alinhar-se com o Divino; ele cessa de procurar com veemência as circunstâncias passageiras, e de lançar causas novas na corrente de efeitos. Ele se reconhece como um agente antes do que como um ator, um canal antes do que uma fonte, um servo antes do que um mestre, e procura descobrir o propósito divino e trabalhar em harmonia com ele.


Quando um homem atingiu este ponto, ele se elevou acima de toda prece, exceto daquela que é meditação e adoração; ele já não tem nada pelo que pedir, neste ou em qualquer outro mundo; ele permanece em uma serenidade constante, procurando apenas servir a Deus. Este é o estado da Filiação, onde a vontade do Filho é una à vontade do Pai, onde é feita uma calma entrega, "Eis, eu venho para cumprir Tua vontade. Agrada-me fazê-lo; sim, Tua lei está em meu coração" (Salmo XI, 7-8). Então toda prece é vista como sendo desnecessária; todo o pedido é sentido como impertinência; nada pode ser desejado pois ainda não estará nos propósitos daquela Vontade, e tudo será trazido à manifestação ativa à medida em que os agentes daquela Vontade se aperfeiçoarem no trabalho.