O Lado Oculto do Cristianismo
parte final
Annie Besant
b) O Testemunho da Igreja
Enquanto possa ocorrer que alguns estejam querendo admitir a posse pelo
Apóstolo e seus sucessores imediatos de um conhecimento das coisas
espirituais mais profundo do que o que era corrente entre as massas dos
crentes em seu redor, poucos provavelmente desejarão dar o próximo
passo, e, deixando este círculo enfeitiçado, aceitar os Mistérios
da Igreja Primitiva como o depositário de seus ensinamentos sagrados.
Mesmo que tenhamos São Paulo fazendo os preparativos para a transmissão
do ensino não escrito, iniciando ele mesmo a São Timóteo,
e instruindo São Timóteo para que por sua vez iniciasse outros,
os quais o dariam a ainda outros, depois deles. Vemos assim um arranjo de
quatro gerações sucessivas de instrutores, citadas nas mesmas
Escrituras, e eles com muita folga sobrepujariam os escritores da Igreja
Primitiva que testemunham a existência dos Mistérios. Pois
entre eles há discípulos dos próprios Apóstolos,
embora as declarações mais definitivas sejam daqueles afastados
dos Apóstolos por um instrutor intermediário. Porém,
assim que iniciamos o estudo dos escritos da Igreja Primitiva, se nos deparam
os fatos de que existem alusões que são inteligíveis
apenas considerando a existência dos Mistérios, e depois declarações
de que os Mistérios realmente existem. Isto poderia, é claro,
ser esperado, analisando as condições em que o Novo Testamento
deixa o assunto, mas causa satisfação descobrir que os fatos
correspondem às expectativas.
As primeiras testemunhas são aqueles chamados Padres Apostólicos,
os discípulos dos Apóstolos; mas demasiado pouco subsiste
de seus escritos, e mesmo o que resta é questionado. Quando não
são escritas controversamente, as declarações não
são tão categóricas como as dos escritores posteriores.
Suas cartas são para o encorajamento dos crentes. Policarpo, Bispo
de Smirna, e, juntamente com Inácio, discípulo de São
João (The Martyrdom of Ignatius, vol. I, cap. III - Os texto utilizados
provêm da Ante-Nicene Christian Library, de Clarke, um utilíssimo
compêndio de antigüidades Cristãs. O número do
volume é o seu número na série), expressa a esperança
de que seus correspondentes sejam "bem versados nas sagradas Escrituras
e que nada lhes seja oculto; mas para mim este privilégio ainda não
foi outorgado" (Ibid., The Epistle of Polycarp, cap. XII). - escrevendo,
aparentemente, antes de alcançar a Iniciação plena.
Barnabé fala em comunicar "alguma porção do que
eu mesmo recebi" (Ibid., The Epistle of Barnabas, cap. I) e depois
de expor a Lei misticamente, declara que "nós, então,
entendendo corretamente Seus mandamentos, os explicamos do modo como o Senhor
pretendeu que significassem" (Ibid., cap. X). Inácio, Bispo
de Antióquia, um discípulo de São João (Ibid.,
The Martyrdom of Ignatius, cap. I), fala de si mesmo como "ainda não
sendo perfeito em Jesus Cristo. Pois só agora iniciei a ser um discípulo,
e falo a vós como a meus condiscípulos" (Ibid., Epistle
of Ignatius to the Ephesians, cap. III), e fala deles como "iniciados
nos mistérios do Evangelho com Paulo, o santo, o martirizado"
(Ibid., cap. XII). Mais uma vez ele diz: "Poderia eu não vos
escrever coisas mais cheias de mistério? Mas temo em fazê-lo,
podendo prejudicar-vos, a vós que sois apenas bebês. Perdoai-me
a este respeito, pois não sendo capazes de receber todo seu peso,
seríeis sufocados por elas. Pois mesmo eu, embora ligado (por Cristo)
e sendo capaz de entender coisas celestiais, as ordens angélicas,
e os diferentes tipos de anjos e hierarquias, a diferença entre tronos
e potestades, a grandiosidade dos éons, e a preeminência dos
querubins e serafins, a sublimidade do Espírito, o reino do Senhor,
e acima de tudo a incomparável majestade de Deus Todo-poderoso -
embora eu conheça estas coisas, ainda não sou de modo algum
perfeito, nem sou um discípulo da estatura de Paulo ou Pedro"
(Ibid., To the Trallians, vol. 2). Esta passagem é interessante,
ao indicar que a organização das hierarquias celestes era
um dos assuntos sobre os quais era dada instrução nos Mistérios.
Novamente ele fala do Sumo Sacerdote, do Hierofante, "a quem foi confiado
o Santo dos Santos, e quem sozinho foi informado dos segredos de Deus"
(Ibid., To the Philadelphians, cap. IX).
Passamos a seguir para São Clemente de Alexandria e seu discípulo
Orígenes, os dois escritores dos séculos II e III que mais
nos contam sobre os Mistérios na Igreja Primitiva; embora a atmosfera
geral seja cheia de alusões místicas, os dois são claros
e categóricos em suas asserções de que os Mistérios
eram uma instituição reconhecida.
São Clemente foi um discípulo de Panteno, e fala dele e de
dois outros, ditos ser provavelmente Tatiano e Teódoto, como "preservando
a tradição da doutrina bendita derivada diretamente dos santos
Apóstolos Pedro, Tiago, João e Paulo" (Clemente de Alexandria,
Stromata, livro I, cap., I - A.-N.C.L, vol. IV), assim seu elo com os próprios
Apóstolos tem apenas um intermediário. Ele foi o diretor da
Escola Catequética de Alexandria em 189 dC, e morreu cerca de 220
dC. Orígenes nasceu em torno de 185 dC, foi seu discípulo,
e é, talvez, o mais instruído dos Padres, e um homem da mais
rara beleza moral. Estas são as testemunhas de quem recebemos o mais
importante registro da existência de Mistérios definidos na
Igreja Primitiva.
Os Stromata, ou Miscelânea, de São Clemente, são nossa
fonte de informação sobre os Mistérios naquela sua
época. Ele mesmo fala destes escritos como uma "miscelânea
de notas Gnósticas, de acordo com a verdadeira filosofia" (Stromata,
livro I, cap. XXVIII - A.-N.C.Lib., vol. IV), e as descreve também
como memorandos dos ensinamentos que ele mesmo recebera de Panteno. A passagem
é instrutiva: "O Senhor... permitiu-nos comunicar aqueles Divinos
Mistérios, e aquela santa luz, àqueles capazes de os receber.
Ele certamente não revela à multidão o que não
pertence à multidão, mas aos poucos que Ele sabe que lhes
pertencem, que são capazes de recebê-los e ser moldados de
acordo com eles. Mas coisas secretas são confiadas á voz,
e não ao escrito, como é o caso com Deus. E se alguém
diz (parece que mesmo naquele tempo havia alguns que objetavam de alguma
verdade ser ensinada secretamente!) que está escrito 'Não
há nada escrito que não seja revelado, nem oculto que não
seja descoberto', que também ouça de nós, que àquele
que ouve secretamente, mesmo o que é secreto será manifesto.
Isto é o que foi predito por aquele oráculo. E para aquele
que é capaz de conservar em segredo o que lhe é transmitido,
o que é velado lhe será descoberto como verdade; e o que está
oculto da maioria aparecerá manifesto aos poucos... Os Mistérios
são confiados misticamente, para o que é falado possa estar
na boca do que fala; não em sua voz, mas em seu entendimento... O
escrito destes meus memoranda, bem o sei, é fraco quando comparado
com aquele espírito, que é cheio de graça, o qual eu
tive o privilégio de ouvir. Mas será uma imagem para recordar
o arquétipo àquele que foi tocado com o Tirso". O Tirso,
podemos assinalar, era a vareta levada pelos Iniciados, e os candidatos
eram tocados com ela durante a cerimônia de Iniciação.
Tinha uma significação mística, simbolizando a medula
espinhal e a glândula pineal nos Mistérios Menores, e um Bastão,
conhecido dos Ocultistas, nos Maiores. Dizer, portanto, "àqueles
que foram tocados com o Tirso", era exatamente o mesmo que dizer, "àquele
que foi iniciado nos Mistérios'. Clemente prossegue: "Nós
professamos não explicar coisas secretas suficientemente - longe
disto - mas apenas recordá-las à memória, se tivermos
esquecido algum detalhe, ou com o intuito de não esquecer. Muitas
coisas, sei bem, nos escapam, na da passagem do tempo, e que deixamos de
lado sem as escrever... Há coisas então de que não
guardamos memória alguma; pois o poder que estava nos homens benditos
era grande". Uma experiência freqüente daqueles ensinados
pelos Grandes Seres, pois Sua presença estimula e torna ativos poderes
que normalmente estão latentes, e que o discípulo, desassistido,
não pode evocar. "Também há coisas que permanecem
de todo não registradas; que agora nos fogem; e outras que estão
confusas, tendo se desvanecido na própria mente, uma vez que tal
tarefa não é simples para os inexperientes; estas eu reavivo
em meus comentários. Algumas coisas eu omito de propósito,
exercitando uma sábia seleção, receando escrever o
que eu evitei falar; não para enganar - pois seria errado - mas temendo
por meus leitores, para que não tropecem tomando-as num sentido equívoco;
e, como diz o ditado, estaríamos 'dando uma espada para uma criança'.
Pois é impossível que o que fosse escrito não fosse
percebido (se tornasse sabido), assim permanece impublicado por mim. Mas
sendo sempre circunspecto, usando apenas uma voz, a do escrito, (as coisas
escritas) não respondem nada para aquele que faz perguntas além
do que foi escrito; pois elas requerem necessariamente a ajuda de alguém,
seja de quem escreveu, ou de outro que seguiu em seus passos. Meu tratado
esconde certas coisas; em outras se demora; outras apenas menciona. Ele
tenta falar discretamente, exibir secretamente, e demonstrar silenciosamente"
(Ibid., livro I, cap. I).
Esta passagem, se apenas ela existisse, seria suficiente para confirmar
a existência de um ensinamento secreto na Igreja Primitiva. Mas de
modo algum é um espécimen isolado. No capítulo XII
do mesmo livro I, sob o título "Os Mistérios da Fé
não devem ser divulgados a todos", Clemente declara que, uma
vez que outros além do sábio podem chegar a ver sua obra,
"é obrigatório portanto ocultar em um Mistério
a sabedoria enunciada, que o Filho de Deus ensinou". Língua
purificada de quem fala, ouvido purificado de quem ouve, isto era necessário.
"Tais foram as restrições no caminho de minha escrita.
E mesmo agora eu temo, como se diz, de 'lançar as pérolas
aos porcos, para que não as calquem sob seus pés e se voltem
contra nós e nos despedacem'. Pois é difícil exibir
as palavras realmente puras e transparentes a respeito da verdadeira luz
aos ouvidos suínos e destreinados. Pois dificilmente haveria coisas
que pudessem ser mais ridículas do que estas para a multidão;
nem, por outro lado, qualquer assunto poderia ser mais admirável
ou mais inspirador para aqueles de natureza nobre. Mas o sábio não
profere com sua boca o que discute em concílio. Mas o que ouvis no
ouvido, disse o Senhor, 'proclamai acima das casas', fazendo com que recebam
as tradições sagradas do verdadeiro conhecimento, e expondo-as
alto e conspicuamente; e já que 'ouvimos no ouvido', então
as entregarmos a outros é obrigatório; mas não nos
agrada comunicar a todos sem distinção o que lhes é
dito em parábolas. Mas só existe um esboço em nossos
memoranda, os quais têm a verdade esparsa e difusa, para que possa
escapar da atenção daqueles que apanham sementes como gralhas;
mas quando elas encontram um homem que as acolhe bem cada uma delas germinará
e produzirá grão".
Clemente poderia ter acrescentado que "proclamar acima das casas"
era proclamar ou expor na assembléia dos Perfeitos, dos Iniciados,
e de modo algum bradá-las para os homens nas ruas.
Novamente ele diz que aqueles que são "ainda cegos e surdos,
não tendo entendimento, ou a visão clara e penetrante da alma
contemplativa... devem ficar de fora do coro divino... Por conseguinte,
em concordância com o método de ocultação, o
Verbo verdadeiramente sagrado, verdadeiramente divino e necessário
para nós, depositado no escrínio da verdade, era indicado,
pelos egípcios, pelo que eles chamavam de adyta, e os Hebreus, de
véu. Somente os consagrados... eram autorizados a ter-lhe acesso.
Pois Platão também ensinou que não é lícito
para 'o impuro tocar no que é puro. Por isso as profecias e oráculos
são proferidos em enigmas, e os Mistérios não são
exibidos de imediato e em amplitude a todos, mas somente depois de certas
purificações e instruções prévias"
(Ibid., livro V, cap. IV). Ele então discorre longamente sobre os
Símbolos, expondo os Pitagóricos, os Hebreus, Egípcios,
e então assinala que o ignorante e o inculto falham em entendê-los.
"Mas o Gnóstico compreende. Pois não é desejado
que todas as cosias sejam expostas indiscriminada e completamente a todos,
nem que os benefícios da sabedoria sejam comunicados àqueles
que nem em sonho se purificaram na alma (pois não é permitido
entregar a qualquer arrivista o que foi procurado com tantos esforços
laboriosos); nem serão expostos ao profano os Mistérios da
Palavra". Os Pitagóricos e Platão, Zenão e Aristóteles
tinham ensinamentos exotéricos e esotéricos. Os filósofos
estabeleceram os Mistérios, pois "não seria mais benéfico
para a santa e bendita contemplação das realidades serem ocultas?"
(Ibid., cap. IX). Os Apóstolos também aprovavam "o velamento
dos Mistérios da Fé". "pois existe uma instrução
para os perfeitos", à qual se alude em Colossenses, 9-11 e 25-27.
"Tanto é que, por outro lado, então, existem os Mistérios
que estavam ocultos até o tempo dos Apóstolos, e foram pregados
por eles assim como foram recebidos do Senhor, e, ocultos no Antigo Testamento,
foram manifestos aos santos. E, por outro lado, há 'as riquezas da
glória do mistérios entre os Gentios', que é a fé
e esperança em Cristo; o que em outra parte ele chama de "o
fundamento". Ele cita São Paulo para demonstrar que este "conhecimento
não pertence a todos", e diz, referindo-se a Hebreus V e VI,
que "certamente existem entre os Hebreus algumas coisas transmitidas
oralmente"; e então se refere a São Barnabé, que
fala de Deus, "que colocou em nossos corações a sabedoria
e o entendimento de seus segredos", e diz que "é dado a
poucos entender estas coisas", como se apresentando "um traço
de tradição Gnóstica". "Portanto a instrução
que revela coisas ocultas é chamada de iluminação,
assim como é somente o instrutor que levanta a tampa da arca"
(Ibid., livro V, cap. X). Referindo-se mais a São Paulo, ele comenta
sua declaração em Romanos de que ele "virá na
plenitude da bênção de Cristo" (loc. cit., XX,
29), e diz que ele significa com isto "o dom espiritual e a interpretação
Gnóstica, que ao estar presente deseja transmitir a eles como 'a
plenitude de Cristo, de acordo com a revelação do Mistérios
selado nas eras da eternidade, mas agora manifesto pelas Escrituras proféticas'
(Ibid., XVI, e 25-26; a versão citada difere em palavras, mas não
em sentido, da Edição Inglesa Autorizada)... Mas apenas a
uns poucos dentre eles é mostrado o que são estas coisas que
o Mistério contém. Corretamente, então, Platão,
nas cartas tratando de Deus, diz: 'Devemos nos expressar em enigmas; para
que se por qualquer acaso o escrito, por terra ou por mar, cair nas mãos
de alguém, este permaneça ignorante" (Stromata, livro
V, cap. X).
Depois de muito exame dos escritores gregos, e uma investigação
na filosofia, São Clemente declara que a Gnose "transmitida
e revelada pelo Filho de Deus é sabedoria... E a Gnose em si é
aquilo que continuou pela transmissão a uns poucos, tendo sido transmitida
oralmente pelos Apóstolos" (Ibid., livro VI, cap. VII). É
feita uma exposição muito alentada da vida do Gnóstico,
do Iniciado, e São Clemente a conclui dizendo: "Que isto baste
para aqueles que têm ouvidos. Pois não é preciso desvelar
o mistério, mas apenas indicar o que baste, para aqueles que são
partícipes no conhecimento, para traze-lo de novo à mente"
(Ibid., livro VII, cap. XIV).
Considerando a Escritura como consistindo de alegorias e símbolos,
e como escondendo o sentido a fim de estimular a indagação
e para preservar o ignorante do perigo (ibid., livro VI, cap. XV), São
Clemente naturalmente confinou a instrução superior aos mais
cultos. "Nosso Gnóstico será profundamente culto"
(Ibid., livro VI, cap. X), diz ele. "Pois o Gnóstico deve ser
erudito" (ibid., livro VI, cap. VII). Aqueles que adquiriram desenvoltura
através de treinamento prévio poderiam dominar o conhecimento
mais profundo, pois embora "um homem possa ser um crente sem estudo,
também declaramos que é impossível para um homem sem
estudo compreender as coisas que são expostas na doutrina" (Ibid.,
livro I, cap. VI). "Alguns que se imaginam naturalmente dotados não
desejam se aproximar da filosofia ou da lógica; antes não
desejam aprender a ciência natural. Eles requerem apenas a fé
pobre... Assim também eu chamo de verdadeiramente erudito aquele
que leva tudo à base da verdade - para que, da geometria, da música,
da gramática e da própria filosofia, selecionando o que é
útil, preserve a fé contra assaltos. Quão necessário
é, para o que deseja compartilhar do conhecimento de Deus, tratar
dos assuntos intelectuais através da filosofia" (ibid., cap.
IX). "O Gnóstico se vale dos ramos do conhecimento como exercícios
preparatórios auxiliares" (Ibid., livro VI, cap. X). Quão
longe estava São Clemente de pensar que o ensinamento do Cristianismo
devesse ser medido pela ignorância do inculto. "Aquele que é
familiarizado com todos os tipos de sabedoria será preeminentemente
um Gnóstico" (Ibid., livro I, cap. XIII). Assim enquanto acolhe
o ignorante e o pecador, e encontra no Evangelho o que atende às
suas necessidades, considera que somente o culto e o puro seriam candidatos
adequados para os Mistérios. "O Apóstolo, distintamente
da perfeição Gnóstica, chama a fé comum de fundamento,
e algumas vezes de leite" (Stromata, vol. XII, livro V, cap. IV), mas
sobre aquele fundamento devia ser erguido o edifício da Gnose, e
o alimento próprio de homens devia suceder ao dos bebês. Não
há nenhuma intolerância ou complacência na distinção
que ele faz, mas apenas um calmo e sábio reconhecimento dos fatos.
Mesmo o candidato bem preparado, o discípulo culto e treinado, só
poderiam esperar avançar passo a passo nas profundas verdades desveladas
nos Mistérios. Isto aparece claramente em seus comentários
sobre a visão de Hermas, onde ele também dá algumas
sugestões sobre o método de ler-se obras ocultas. "Não
deu também o Poder, que apareceu a Hermas na Visão, sob a
forma da Igreja, para transcrição o livro que ele desejava
que fosse conhecido dos eleitos? E isto, ele diz, ele transcreveu ao papel,
não sabendo como completar as sílabas. E isto significa que
a Escritura é clara para todos, quando tomada ao pé da letra;
e que isto é a fé que ocupa o lugar dos rudimentos. Daí
é empregada também a expressão figurada 'leitura de
acordo com a letra', enquanto que nós entendemos que a interpretação
gnóstica das Escrituras, quando a fé chegou a um grau avançado,
é comparada com a leitura de acordo com as sílabas... Porém
aquilo o Salvador ensinou os Apóstolos, a interpretação
oral dos escritos (Escrituras) foi dada também a nós, inscrita
pelo poder de Deus nos corações renovados, de acordo com a
renovação do livro. Assim aqueles de grande reputação
entre os gregos dedicam o fruto da romãzeira a Hermes, a quem chamam
de fala, por conta de sua interpretação. Pois a fala oculta
muito... Portanto não é apenas àqueles que lêem
com simplicidade que a aquisição da verdade é tão
difícil, mas a história de Moisés ensina que nem mesmo
àqueles cuja prerrogativa é o conhecimento da verdade a sua
contemplação é desvelada completamente; assim como
os hebreus foram acostumados a contemplar a glória de Moisés,
e os profetas de Israel as visões dos anjos, assim também
nós nos tornamos capazes de olhar os esplendores da verdade face
a face" (Ibid., livro VI, cap. XV).
Poderiam ser dadas ainda outras referências, mas estas serão
suficientes para estabelecer o fato de que São Clemente sabia da
existência dos Mistérios no seio da Igreja, havia sido iniciado
neles, e escreveu para o benefício daqueles que também haviam
sido iniciados.
A testemunha seguinte é o discípulo Orígenes, aquela
brilhantíssima luz de erudição, coragem, santidade,
devoção, brandura e zelo, cujas obras permanecem como minas
de ouro onde o estudante pode garimpar os tesouros da sabedoria.
Em sua famosa controvérsia contra Celso, foram feitos ataques ao
Cristianismo que suscitaram uma defesa da posição Cristã
onde foram feitas freqüentes referências aos ensinamentos secretos
(Contra Celsus, livro I. Este livro é encontrado no volume X da A.-N.C.Lib.
Os livros restantes estão no volume XXIII).
Celso alegou, como argumento de seu ataque, que o Cristianismo era um sistema
secreto, e Orígenes refuta isto dizendo que conquanto certas doutrinas
fossem secretas, muitas outras eram públicas, e que este sistema
de ensinamentos exotéricos e esotéricos, adotado no Cristianismo,
era também de uso geral entre os filósofos. O leitor notará,
na passagem abaixo, a distinção feita entre a ressurreição
de Jesus, considerada sob uma luz histórica, e o "mistério
da ressurreição":
"Acima de tudo, uma vez que ele (Celso) freqüentemente chama a
doutrina Cristã de sistema secreto (de fé), devemos confutá-lo
também neste ponto, uma vez que quase todo o mundo está mais
familiarizado com aquilo que os Cristãos pregam do que com as opiniões
favoritas dos filósofos. Pois quem desconhece a declaração
de que Jesus nasceu de uma virgem, e que foi crucificado, e que Sua ressurreição
é um artigo de fé, e que é esperado um juízo
final, no qual os maus serão punidos de acordo com suas faltas, e
os justos serão devidamente recompensados? Mesmo assim, o Mistério
da ressurreição, não sendo compreendido, é feito
objeto de ridículo entre os descrentes. Nestas circunstâncias,
falar da doutrina Cristã como sendo um sistema secreto é um
completo absurdo. Mas que deva haver certas doutrinas, não descobertas
à multidão, que o são depois que o profano é
ensinado, não é uma peculiaridade apenas do Cristianismo,
mas também de sistemas filosóficos nos quais certas verdades
são exotéricas e outras são esotéricas. Alguns
dos ouvintes de Pitágoras se contentavam com seu ipse dixit, enquanto
que outros eram ensinados em segredo naquelas doutrinas que não eram
consideradas próprias para serem comunicadas aos ouvidos profanos
e insuficientemente preparados. Além disso, todos os Mistérios
que são celebrados em toda a Grécia e em todos os países
bárbaros, embora mantidos em segredo, não sofrem de nenhum
descrédito, de modo que é vão que ele procure caluniar
as doutrinas secretas do Cristianismo, constatando-se que ele não
compreende corretamente sua natureza" (Origen against Celsus, livro
I, cap. VII - A.-N.C.Libr, vol. X).
É impossível negar que nesta importante passagem Orígenes
nitidamente coloca os Mistérios Cristãos na mesma categoria
dos do mundo Pagão, e invoca que aquilo que não é considerado
como um descrédito em relação a outras religiões
não deveria constituir motivo de ataque quando encontrado no Cristianismo.
Ainda escrevendo contra Celso, ele declara que os ensinamentos secretos
de Jesus foram preservados na Igreja, e se refere especificamente às
explicações que Ele deu a Seus discípulos a respeito
de Suas parábolas, ao responder á comparação
de Celso entre "os Mistérios internos da Igreja de Deus"
e o culto egípcio aos animais. "Ainda não falei da observância
de tudo o que está escrito nos Evangelhos, cada um dos quais contém
muita doutrina difícil de ser entendida, não apenas pela multidão,
mas mesmo por alguns dos mais inteligentes, incluindo uma profundíssima
explicação das parábolas que Jesus aplicava 'àqueles
de fora', ao mesmo tempo reservando a exibição de seu pleno
significado àqueles que haviam passado pelo estágio do ensino
exotérico, e que vinham a Ele em privado na casa. E quando estes
passam a entendê-la, admiram a razão pela qual alguns são
ditos ser 'de fora' e outros 'de casa' (Origen against Celsus, livro I,
cap. VII).
E ele se refere discretamente à "montanha" de onde Jesus
ascendeu, e de onde Ele desceu para auxiliar "aqueles que eram incapazes
de seguí-Lo para onde foram os Seus discípulos". A alusão
é à "Montanha da Iniciação", uma frase
mística bem conhecida, do mesmo modo que Moisés fez o Tabernáculo
segundo o modelo "mostrado a ti no monte" (Êxodo, XX, 40;
XXVI, 30, e compare-se com Hebreus, VIII, 5, e IX, 25). Orígenes
se refere novamente a isto mais tarde, dizendo que Jesus mostrou-se bem
diferente, em sua aparência real quando estava na "Montanha",
daqueles que O viram e não podiam "seguí-Lo tão
alto" (Origen against Celsus, livro IV, cap. XVI).
Igualmente em seu comentário sobre o Evangelho de Mateus, capítulo
XV, tratando do episódio da mulher sírio-fenícia, Orígenes
assinala: "E talvez, também, das palavras de Jesus existam alguns
pães que são passíveis de serem dados somente aos mais
racionais, como se fosse a crianças; e outras haja como se fossem
migalhas da mansão e mesa dos bem-nascidos, que podem ser usadas
por algumas almas semelhantes a cães".
A Celso, que lamentava que pecadores fossem trazidos para dentro da Igreja,
Orígenes responde dizendo que a Igreja tinha o remédio para
os que estavam doentes, mas também o estudo e conhecimento das coisas
divinas para aqueles que estavam sãos. Os pecadores eram ensinados
a não pecar, e somente quando era visto que havia sido feito progresso,
e os homens estivessem "purificados pela Palavra", "então,
e não antes, nós os convidamos à participação
em nossos Mistérios. Pois nós falamos sabedoria entre os que
são perfeitos" (Origen against Celsus, livro III, cap. LIX).
Os pecadores vêm para serem curados: "Pois existe na divindade
do Verbo alguns auxílios para a cura dos que estão doentes...
(Existem) outros, ainda, que ao puro de alma e corpo exibem a 'revelação
do Mistério, que foi mantido secreto desde que o mundo começou,
mas que agora foi feito manifesto pelas Escrituras dos profetas', e 'pelo
aparecimento de Nosso Senhor Jesus Cristo', cuja 'aparição'
é manifesta a cada um dos que são perfeitos, e que ilumina
a razão no verdadeiro conhecimento das coisas" (Origen against
Celsus, livro III, cap. LXI). Tais aparições de Seres divinos
tinham lugar, como vimos, nos Mistérios Pagãos, e aqueles
da Igreja tinham igualmente visitantes gloriosos. "Deus, o Verbo",
ele diz, "foi enviado como um médico para os pecadores, mas
como um Instrutor dos Mistérios Divinos para aqueles que já
são puros, e que não pecam mais" (Ibid., cap. LXII).
"A sabedoria não entrará na alma de um homem vil, nem
irá residir em um corpo que está imerso no pecado"; daí
que estes ensinamentos elevados são dados apenas àqueles que
são "atletas na piedade e em todas as virtudes".
Os Cristãos não admitiam o impuro neste conhecimento, mas
diziam: "Quem quer que haja limpado as mãos, e, portanto, ergue
mãos limpas para Deus... que venha a nós... quem quer que
seja puro não somente de todo aviltamento, mas também do que
é considerado como transgressões menores, que seja intrepidamente
iniciado nos Mistérios de Jesus, que são feitos propriamente
conhecidos somente aos santos e aos puros". Também assim, antes
que a cerimônia de Iniciação começasse, aquele
que atuava como Iniciador, de acordo com os preceitos de Jesus, o Hierofante,
fazia a significativa proclamação "àqueles que
foram purificados no coração: Aquele cuja alma desde há
muito tempo não tem consciência de nenhum mal, especialmente
desde que sujeitou-se à cura pelo Verbo, que este ouça as
doutrinas que eram ditas em privado por Jesus a Seus genuínos discípulos".
Esta era a abertura das portas da "Iniciação, dos que
já estavam purificados, para os sagrados Mistérios" (Origen
against Celsus, livro III, cap. LX). Só estes poderiam aprender as
realidades dos mundos invisíveis, e poderiam entrar nos recintos
sagrados onde, como antigamente, os anjos eram os instrutores, e onde o
conhecimento era dado pela visão e não pelas palavras. É
impossível não perceber o tom diferente destes Cristãos
em relação aos seus sucessores modernos. Para aqueles a perfeita
pureza de vida, a prática da virtude, o cumprimento da Lei divina
em cada detalhe na conduta exterior, a perfeição da justiça,
eram - assim como para os Pagãos - somente o início do caminho
ao invés de seu final. Hoje em dia considera-se que a religião
completou gloriosamente seu objetivo quando produz um Santo; assim foi aos
Santos que devotou suas mais altas energias, e, tomando os puros de coração,
levava-os à Visão Beatífica.
O mesmo fato do ensinamento secreto aparece novamente quando Orígenes
discute os argumentos de Celso sobre a sabedoria de preservar costumes ancestrais,
baseada na crença de que "as várias regiões da
Terra foram desde o início entregues a diferentes Espíritos
superintendentes, e foram assim distribuídas entre certos Poderes
diretores, e deste modo a administração do mundo é
levada adiante" (Origen against Celsus, livro V, cap. XXV - A.-N.C.Libr.,
vol. XXIII).
Tendo Orígenes condenado as deduções de Celso, prossegue:
"Mas como imaginamos ser provável que alguns daqueles acostumados
a investigações mais profundas se deparem com este tratado,
arrisquemos a deixar algumas considerações de um tipo mais
profundo, com uma visão mística e secreta a respeito da distribuição
original das várias regiões da Terra entre diferentes Espíritos
superintendentes" (Ibid., cap. XXVIII). Ele diz que Celso havia entendido
mal as razões mais profundas a respeito do arranjo dos assuntos terrenos,
algumas das quais são abordadas mesmo na história grega. Então
ele cita o Deuteronômio, XXXII, 8-9,: "Quando o Altíssimo
dividiu as nações, quando Ele dispersou os filhos de Adão,
estabeleceu os limites dos povos de acordo com o número dos Anjos
de Deus; e a porção do Senhor foi Seu povo Jacó, e
Israel a linhagem de Sua herança". Este é o fraseado
da edição Septuaginta, não a da Inglesa Autorizada,
mas é muito sugestivo de que o título de "Senhor"
fosse atribuído ao Anjo Regente dos Judeus, apenas, e não
ao "Altíssimo", isto é, Deus. Esta visão
desapareceu, pela ignorância, e disto deriva a inadequação
de muitas das declarações que se referem ao "Senhor",
quando são transferidas ao "Altíssimo", como por
exemplo em Juizes, I, 19 ["O Senhor estava com Judá, e ele conquistou
a montanha, porém não pôde despojar os habitantes da
planície, que possuíam carruagens de ferro" - NT].
Orígenes então relata a história da Torre de Babel,
e continua: "Mas muito poderia ser dito sobre estes assuntos, e coisas
de tipo místico, como o que segue: 'É bom ocultar o segredo
de um rei', Tobias, XII, 7, 'a fim de que a doutrina da entrada das almas
nos corpos (porém não a da transmigração de
um corpo para outro) não seja divulgada ao entendimento comum, nem
o que é santo dado aos cães, nem pérolas jogadas aos
porcos. Pois tal procedimento seria ímpio, sendo equivalente a uma
traição das declarações misteriosas da sabedoria
de Deus... É suficiente, contudo, representar no estilo de uma narrativa
histórica, com uma vestimenta de história, o que é
planejado para veicular um significado secreto, para que aqueles que têm
capacidade desenvolvam por si mesmos tudo o que se relaciona ao assunto"
(Origen against Celsus, livro V, cap. XXIX - A.-N.C.Libr., vol. XXIII).
Ele então expõe mais completamente a história da Torre
de Babel, e escreve: "Porém, a seguir, se alguém tiver
capacidade, que entenda aquilo que assume a forma de história, e
que contém algumas coisas que são literalmente verdade, embora
ao mesmo tempo veicule um significado mais profundo..." (Ibid., cap.
XXXI).
Depois de tentar mostrar que o "Senhor" era mais poderoso do que
os outros Espíritos superintendentes de diferentes partes da Terra,
e que ele enviou seu povo para ser punido vivendo debaixo do domínio
de outros poderes, e depois alinhou-os com todas as nações
menos favorecidas que podiam ser reunidas, Orígenes conclui dizendo:
"como observamos previamente, estas declarações devem
ser entendidas como sendo feitas por nós com um sentido oculto, indicando
os erros daqueles que asseveram... " (Ibid., cap. XXXII) como o fez
Celso.
Depois de assinalar que "o objetivo do Cristianismo é que nos
tornemos sábios" (Ibid., cap. XIV), Orígenes prossegue:
""Se consultamos os livros escritos depois do tempo de Jesus,
veremos que aquelas multidões de crentes que ouviram as parábolas
são, como se diz, "de fora', e dignos apenas das doutrinas exotéricas,
enquanto que os discípulos aprendem em privado a explicação
das parábolas. Pois privadamente Jesus descerrou todas as coisas
aos Seus discípulos , estimando acima das multidões aqueles
que desejavam conhecer Sua sabedoria. E Ele promete àqueles que acreditam
n'Ele torná-los homens sábios e escribas... E Paulo também
em seu catálogo dos 'Charismata' outorgados por Deus, colocou em
primeiro lugar 'a Palavra da sabedoria', e em segundo, como sendo-lhe inferior,
a 'palavra do conhecimento', mas em terceiro, e mais abaixo, a 'fé'.
E porque ele considerava 'a palavra' mais alto do que os poderes miraculosos,
ele por esta razão coloca a 'operação de milagres'
e os 'dons de cura' em um lugar mais baixo do que os dons da 'Palavra' "
(Ibid., cap. XLVI).
O Evangelho em verdade ajudava o ignorante, "mas não é
impedimento algum para o conhecimento de Deus, antes é uma assistência,
ter sido educado, e ter estudado as melhores opiniões, e ser sábio"
(Ibid., caps. XLVII e LIV). Assim, para o inculto, "eu tento melhorá-lo
também com o melhor de minha habilidade, embora eu não deseje
construir a comunidade Cristã a partir de tais materiais. Pois eu
busco de preferência os que são mais sagazes e argutos, porque
são capazes de compreender o significado dos ditos mais difíceis"(Ibid.,
cap. LXXIV). Aqui expusemos claramente a antiga idéia Cristã,
inteiramente de acordo com as considerações apresentadas no
Capítulo I deste livro. No Cristianismo existe espaço para
o ignorante, mas ele não foi planejado somente para estes, e tem
ensinamentos mais profundos para os "sagazes e argutos".
É para estes últimos que ele tem grande empenho em mostrar
que as Escrituras Cristãs e Judaicas têm significados ocultos,
velados debaixo de histórias cujo significado exterior ele repele
como absurdos, aludindo à serpente e a árvore da vida, e "as
outras declarações que se seguem, que poderiam em si conduzir
um leitor cândido a ver que todas estas coisas têm, não
impropriamente, um significado alegórico" (Ibid., livro IV,
cap. XXXIX). Muitos capítulos são devotados a estes sentidos
alegóricos e místicos, escondidos debaixo das palavras do
Velho e do Novo Testamentos, e ele alega que Moisés, como os Egípcios,
contou histórias que ocultavam o significado" (Origen against
Celsus, livro I, cap. XVII e outros - A.-N.C.Libr., vol X). "Aquele
que lida candidamente com as histórias" - este é o cânone
geral de interpretação de Orígenes - "e deseje
se preservar de ser confundido por elas, exercitará seu julgamento
sobre a quais declarações dará seu consentimento, e
o que aceitará figuradamente, procurando descobrir a intenção
dos autores destas invenções, e contra quais declarações
ele preservará suas crenças, como tendo sido escritas para
a gratificação de certos indivíduos. E dissemos isto
como antecipação a respeito de toda a história relatada
nos Evangelhos a respeito de Jesus" (Ibid., cap. XIII). Uma grande
parte de seu Livro IV é tomada por ilustrações das
explicações místicas das histórias das Escrituras,
e qualquer um que deseje seguir o assunto pode lê-lo.
No De Principiis, Orígenes dá como sendo o ensinamento recebido
da Igreja "que as escrituras foram escritas pelo Espírito de
Deus, e tendo um significado, não apenas aquele aparente á
primeira vista, mas também um outro, que escapa da percepção
da maioria. Pois aquelas (palavras) que são escritas são as
formas de certos Mistérios, e as imagens das coisas divinas. A este
respeito existe uma única opinião em toda a Igreja, de que
toda a lei é em verdade espiritual; mas que o significado espiritual
que a lei veicula não é conhecido de todos, mas só
àqueles em quem a graça do espírito Santo é
outorgada na palavra da sabedoria e do conhecimento" (De Principiis,
prefácio, p. 8 - A.-N.C.Libr., vol. X). Aqueles que lembram o que
já foi citado verão na "Palavra de sabedoria" e
na "palavra do conhecimento" as duas instruções
místicas típicas, a espiritual e a intelectual.
NO Livro IV de De Principiis, Orígenes explica longamente suas concepções
sobre a interpretação da Escritura. Ela tem um "corpo",
que é "o senso histórico e comum"; uma "alma",
um significado figurado a ser descoberto pelo exercício do intelecto;
e um "espírito", um sentido interno e espiritual, a ser
conhecido somente por aqueles que têm "a mente de Cristo".
Ele considera que coisas incongruentes e impossíveis são inseridas
na história para estimular um leitor inteligente, e compeli-lo a
buscar uma explicação mais profunda, enquanto que as pessoas
simples a lerão sem perceber as dificuldades (Ibid., cap. I).
O Cardeal Newman, em seu Arians of the Fourth Century, faz certas declarações
interessantes sobre a Disciplina Arcani, mas, com o ceticismo profunda e
indelevelmente enraizado do século XIX, ele não pode acreditar
de todo nas "riquezas da glória do Mistério", ou
provavelmente nem por um momento concebeu a possibilidade da existência
de tais esplêndidas realidades. Mesmo sendo ele um crente em Jesus,
e as palavras da promessa de Jesus sendo claras e definidas: "Eu não
vos deixarei sem conforto; Eu virei a vós. Ainda um pouco mais, e
o mundo já não Me verá; mas vós me vereis: porque
Eu vivo, e viverei. Naquele dia devereis saber que Eu estou no meu Pai,
e vós em Mim, e Eu em vós" (João, XIV, 18-20).
A promessa foi amplamente cumprida, pois Ele veio a eles e os ensinou em
Seus Mistérios; lá eles O viram, embora o mundo já
não O visse, e reconheceram o Cristo neles, e sua vida como a do
Cristo.
O cardeal Newman reconhece uma tradição secreta, transmitida
desde os Apóstolos, mas ele considera que consistia das doutrinas
Cristãs, mais tarde divulgadas, esquecendo que aqueles que eram informados
de que ainda não estavam prontos para recebê-la (a doutrina
secreta) não eram pagãos, nem mesmo catecúmenos, mas
membros plenos e comungantes da Igreja Cristã. Assim ele diz que
esta tradição secreta foi mais tarde (divulgada com autoridade
e perpetuada sob a forma de símbolos", e foi corporificada "nos
credos dos primeiros Concílios" (Loc. cit., cap. I, seç.
III, p. 55). Mas como as doutrinas nos credos são encontráveis
nos Evangelhos e nas Epístolas, esta posição é
completamente insustentável, tudo isto já tendo sido divulgado
ao mundo amplamente; e os membros da Igreja certamente estavam instruídos
de tudo a respeito de todas elas. As repetidas declarações
a respeito do sigilo se tornam sem sentido se explicadas desta forma. O
Cardeal, entretanto, diz que o que quer que "não tenha sido
autenticado desta forma, seja informação profética
ou comentário sobre as antigas dispensações, é,
pelas circunstâncias do caso, perdido para a Igreja" (Loc. cit.,
cap. I, seç., III, pp. 55-56). Isto é muito provável,
de fato é certamente verdadeiro, até onde interessa à
Igreja, mas não obstante é recuperável.
Comentando sobre Irineu, que em sua obra Contra as Heresias dá muita
ênfase sobre a existência de uma Tradição Apostólica
na Igreja, o Cardeal escreve: "Ele então passa a falar da clareza
e poder de persuasão das tradições preservadas na Igreja,
como contendo a verdadeira sabedoria dos perfeitos, da qual fala São
Paulo, e à qual pretendem os Gnósticos. E, na verdade, (mesmo)
sem provas formais da existência e da autoridade nos primeiros tempos
de uma Tradição Apostólica, é claro que deve
ter havido uma tal tradição, supondo que os Apóstolos
conversassem, e seus amigos tivessem lembranças, como outros homens.
É de todo inconcebível que eles não tivessem sido levados
a arranjar as séries de doutrinas reveladas mais sistematicamente
do que as registram nas Escrituras, assim que seus seguidores foram expostos
aos ataques e más interpretações dos heréticos;
a menos que tenham sido proibidos disto, uma suposição que
não se sustenta. Suas declarações surgidas nestas circunstâncias
obviamente seriam preservadas, juntamente com os outros segredos, mas que
eram verdades de menor importância, aos quais São Paulo parece
aludir, e que os primeiros escritores mais ou menos reconhecem, seja a respeito
dos modelos da Igreja Judaica, ou dos destinos futuros da Cristã.
E tais recordações dos ensinamentos apostólicos evidentemente
seriam imperativas sobre a fé daqueles que eram instruídos
nelas; a menos que se possa supor que, embora provindo de instrutores inspirados,
não fossem de origem divina" (Ibid., pp. 54,55). Em uma parte
da seção que trata do método alegórico, ele
escreve em referência ao sacrifício de Isaac, etc, como sendo
"típico da revelação do Novo Testamento":
"Em reforço a esta declaração, seja observado
que parece ter havido ('parece ter havido' é uma expressão
algo fraca, depois do que é dito sobre Clemente e Orígenes,
dos quais algumas citações são dadas no texto) na Igreja
uma explicação tradicional destes modelos históricos,
derivada dos Apóstolos, mas mantidas entre as doutrinas secretas,
por serem perigosas à maioria dos ouvintes; e certamente São
Paulo, na Epístola aos Hebreus, nos dá um exemplo desta tradição,
tanto como existente quanto como secreta (mesmo sendo mostrado ser de origem
Judaica), quando, primeiro provando-se e questionando a fé de seus
irmãos, comunica, não sem hesitação, a visão
evangélica da passagem sobre Melquisedec, do modo como foi introduzida
no livro do Gênesis" (Ibid., p. 62).
As convulsões sociais e políticas que acompanharam a morte
do Império Romano agora começavam a torturar sua vasta moldura,
e mesmo os Cristãos foram colhidos no torvelinho dos interesses egoístas
em combate. Ainda encontraremos referências esparsas ao conhecimento
especial concedido aos líderes e instrutores da Igreja, conhecimento
das hierarquias celeste, instruções dadas por anjos, e assim
por diante. Mas a ausência de discípulos aceitáveis
fez com que os Mistérios se extinguissem como uma instituição
cuja existência era reconhecida publicamente, e o ensinamento passou
a ser dado mais e mais secretamente àquelas almas mais e mais raras,
que pela cultura, pureza e devoção se mostravam capazes de
recebê-lo. Já não havia escolas onde os ensinamentos
preliminares fossem dados, e com seu desaparecimento "a porta foi fechada".
Não obstante pode-se detectar duas correntes na Cristandade, as quais
tiveram suas fontes nos Mistérios desaparecidos. Uma era a corrente
do aprendizado místico, fluindo da Sabedoria, da Gnose transmitida
nos Mistérios; outra era a corrente da contemplação
mística, igualmente parte da Gnose, conduzindo ao êxtase, à
visão espiritual. Esta última, contudo, divorciada do conhecimento,
raramente atingiu o verdadeiro êxtase, e tendeu ou a correr desenfreada
para as regiões mais baixas dos mundos invisíveis, ou perder-se
entre uma variegada multidão de formas sutis superfísicas,
visíveis como aparições objetivas à visão
oculta - forçada prematuramente por jejuns, vigílias e atenção
concentrada - mas em sua maioria nascidas dos pensamentos e emoções
do vidente. Mesmo quando as formas observadas não eram pensamentos
externalizados, eram vistas através de uma atmosfera distorcedora
de idéias e crenças preconcebidas, e assim tornadas largamente
indignas de crédito. Não obstante, algumas das visões
foram veramente de coisas celestiais, e Jesus realmente apareceu de tempos
em tempos aos Seus amantes devotados, e anjos algumas vezes iluminaram com
sua presença a cela do monge e da freira, a solitude do devoto apaixonado
e do paciente buscador de Deus. Negar a possibilidade de tais experiências
seria amputar na própria raiz aquilo "que tem sido acreditado
com mais certeza" em todas as religiões, e é conhecido
dos ocultistas - a intercomunicação entre Espíritos
encerrados na carne e aqueles revestidos de vestimentas mais sutis, o contato
de mente com mente através das barreiras da matéria, o desabrochar
da divindade no homem, o conhecimento seguro de uma vida além dos
portões da morte.
Olhando pelos séculos não vemos tempo algum em que a Cristandade
estivesse de todo privada de mistérios. "Foi provavelmente em
torno do final do século V, bem na época em que a antiga filosofia
estava morrendo na Escola de Atenas, que a filosofia especulativa do Neoplatonismo
estabeleceu-se definitivamente no pensamento Cristão através
das falsificações literárias do Pseudo-Dionísio.
As doutrinas do Cristianismo estavam naquela altura tão firmemente
estabelecidas que a Igreja poderia encarar uma interpretação
simbólica ou mística delas sem ansiedade. O autor da Theologica
Mystica e de outras obras atribuídas ao Areopagita passa, assim,
a desenvolver as doutrinas de Proclo sem muita modificação
em um sistema de Cristianismo esotérico. Deus é o Ser inominável
e supra-essencial, acima da própria bondade. Daí a 'teologia
negativa', que sobe da criatura até Deus retirando um após
outro todos os atributos determinados, e que nos conduz para mais perto
da verdade. O retorno para Deus é a consumação de todas
as coisas e a meta indicada pelo ensino Cristão. As mesmas doutrinas
foram pregadas com maior fervor eclesiástico por Máximo, o
Confessor (580-622). Máximo representa quase a última atividade
especulativa da Igreja grega, mas a influência dos escritos do Pseudo-Dionísio
foi transmitida para o Ocidente no século IX por Erígena,
em cujo espírito especulativo tiveram origem tanto o escolasticismo
quanto o misticismo da Idade Média. Erígena traduziu Dionísio
para o latim junto com os comentários de Máximo, e seu sistema
é essencialmente baseado no deles. É adotada a teologia negativa,
e Deus é considerado um Ser sem atributos, acima de todas as categorias,
e portanto não impropriamente chamado de Nada. Fora deste Nada ou
essência incompreensível é criado eternamente o mundo
das idéias ou causas primordiais. Este é o Verbo ou Filho
de Deus, em quem existem todas as coisas, até onde possuam existência
substancial. Toda a existência é uma teofania, e como Deus
é o início de todas as coisas, também é seu
final. Erígena ensina o resgate de todas as coisas sob a forma da
adunatio ou deificatio Dionisiana. Estas são as linhas gerais permanentes
do que pode ser chamado a filosofia do misticismo nos tempos Cristãos,
e é notável a escassez de variação com que são
repetidas de era em era" (Artigo sobre Misticysm, in Encyclopaedia
Britannica).
No século XI Bernardo de Claraval (1091-1153) e Hugo de São
Victor continuaram a tradição mística, com Richard
de São Victor no século seguinte, e São Boaventura,
o Doutor Seráfico, e o grande Tomás de Aquino (1227-1274)
no século XIII. Tomás de Aquino domina a Europa da Idade Média,
pela força de seu caráter não menos do que por sua
erudição e piedade. Ele estabelece a "Revelação"
como uma fonte de conhecimento, sendo a Escritura e a tradição
os dois canais por onde corre, e a influência, perceptível
em seus escritos, do Pseudo-Dionísio o conecta aos Neoplatônicos.
A segunda fonte é a Razão, e aqui os canais são a filosofia
Platônica e os métodos de Aristóteles - este uma aliança
que não fez bem ao Cristianismo, pois Aristóteles se tornou
um obstáculo para o progresso do pensamento superior, o que se evidencia
nas lutas de Giordano Bruno, o Pitagórico. Tomás de Aquino
foi canonizado em 1323, e o grande Dominicano permanece como um modelo da
união da teologia e da filosofia - o anelo de sua vida. Eles pertencem
à grande Igreja da Europa ocidental, e sustentam sua reivindicação
de ser considerada a transmissora da tocha santa do ensinamento místico.
Em torno dela também se disseminaram muitas seitas, julgadas heréticas,
mas que continham tradições verdadeiras do sagrado conhecimento
secreto, como os Cátaros e muitos outros, perseguidos por uma Igreja
ciumenta de sua autoridade, temerosa de que as pérolas santas passassem
à custódia profana. Também naquele século Santa
Elisabeth da Hungria rebrilha com doçura e pureza, enquanto que Eckhart
(1260-1329) prova ser um digno herdeiro das Escolas Alexandrinas. Eckhart
ensinou que "a Divindade é a Essência (Wesen) absoluta,
incognoscível não só pelos homens, mas também
por Si mesmo; Ela é escuridão e absoluta indeterminação,
Nicht, em contraste a Icht, ou existência definida e cognoscível.
Mas é a potencialidade de todas as coisas, e Sua natureza, num processo
triádico, passa à consciência de Si como o Deus trino.
A criação não é um ato temporal, mas uma necessidade
eterna da natureza divina". Eckhart se compraz em dizer que "eu
sou necessário para Deus, assim como Deus é necessário
para mim. Em meu conhecimento e amor Deus conhece e ama a Si mesmo"
(Verbete Mysticism; Encyclopaedia Britannica).
Eckhart é seguido, no século XIV, por John Tauler e Nicolas
de Basel, "o amigo de Deus em Oberland". Deles nasceu a Sociedade
dos Amigos de Deus, verdadeiros místicos e seguidores da antiga tradição.
Mead assinala que Tomás de Aquino, Tauler e Eckhart seguiram o Pseudo-Dionísio,
que seguiu Plotino, Jâmblico e Proclo, que por sua vez seguiram Platão
e Pitágoras (Mead, Orpheus, pp. 53-54). Deste modo são interligados
os seguidores da Sabedoria em todas as eras. Foi provavelmente um "Amigo"
o autor da Die Deustche Theologie, um livro de devoção mística,
que teve o curioso destino de ser aprovado por Schaupitz, o Vigário-Geral
da ordem Agostiniana, que foi recomendado a Lutero e pelo próprio
Lutero, que o publicou em 1516, como um livro que deveria estar logo depois
da Bíblia e dos escritos de Santo Agostinho de Hipona. Um outro "Amigo"
foi Ruysbroeck, cuja influência em Groot foi devida à fundação
dos Irmãos do Quinhão Comum ou da Vida Comum - uma Sociedade
que deve permanecer sempre memorável, já que tinha entre seus
membros aquele príncipe dos místicos, Thomas a Kempis (1380-1471),
o autor da imortal Imitação de Cristo.
No século XV o lado mais puramente intelectual do misticismo desponta
mais fortemente do que o extático - tão dominante nestas sociedades
do século XIV - e temos o Cardeal Nicolau de Cusa, junto com Giordano
Bruno, o martirizado cavaleiro errante da filosofia, e Paracelso, o caluniadíssimo
cientista, que retirou seu conhecimento diretamente das fontes orientais
originais, em vez de através de canais gregos.
O século XVI presenciou o nascimento de Jacob Böhme (1575-1624),
o "remendão inspirado", verdadeiramente um Iniciado em
obscurecimento, dolorosamente perseguido por homens não iluminados;
e então veio Santa Teresa, a oprimidíssima e sofredora mística
espanhola; e São João da Cruz, uma flama ardente de intensa
devoção; e São Francisco de Sales. Roma foi sábia
ao canonizá-los, mais sábia que a Reforma, que perseguiu Böhme,
mas o espírito da Reforma foi sempre intensamente antimístico,
e onde quer que seu alento tenha passado as formosas flores do misticismo
murcharam como debaixo do Sirocco.
Assim, embora tendo apoiado, canonizando, uma Teresa morta, depois de tê-la
atormentado amargamente em vida, a Igreja procedeu pior com Madame de Guyon
(1648-1717), uma verdadeira mística, e com Miguel de Molinos (1627-1696),
digno de sentar-se ao lado de São João da Cruz, que continuou
no século XVII a alta devoção do místico, transformada
em uma forma peculiarmente passiva - o Quietismo.
Neste mesmo século surgiu a escola dos Platônicos em Cambridge,
de quem Henry More (1614-1687) pode servir como exemplo eminente; também
Thomas Vaugham, e Robert Fludd, o Rosacruz; e lá foi formada ainda
a Sociedade dos Filadelfos, e vemos William Law (1686-1761) ativo no século
XVIII, e ultrapassando Saint-Martin (1743-1803), cujos escritos fascinaram
tantos estudantes do século XIX (Aqui devo prestar reconhecimento
ao artigo Mysticism da Encyclopaedia Britannica, embora esta publicação
não possa de modo algum ser responsabilizada pelas opiniões
expressas).
Nem devemos omitir Christian Rosenkreutz (morto em 1484), cuja mística
Sociedade da Rosa e da Cruz, aparecida em 1614, tinha verdadeiro conhecimento,
e cujo espírito renasceu no "Conde de Saint-Germain", a
misteriosa figura que apareceu e desapareceu na melancolia, iluminada por
lúgubres lampejos, do final do século XVIII. Também
místicos foram alguns Quakers, a muito perseguida seita dos Amigos,
procurando a iluminação da Luz Interior, e ouvindo sempre
a Voz Interior. E houve muitos outros místicos, "de quem o mundo
não foi digno", como a completamente adorável e sábia
Mãe Juliana de Norwich, do século XIV, jóias da Cristandade,
escassamente conhecidas, mas justificando o Cristianismo diante do mundo.
Assim, ao mesmo tempo em que saudamos reverentes estas Crianças da
Luz, espalhadas pelos séculos, somos forçados a reconhecer
nelas a ausência daquela união de intelecto agudo e alta devoção
que seriam fundidos pelo treinamento nos Mistérios, e enquanto nos
maravilhamos de que tenham se alçado tão alto, não
podemos senão desejar que tivessem seus raros dons sido desenvolvidos
debaixo da magnífica disciplina arcani.
Alphonse Louis Constant, mais conhecido por seu pseudônimo Eliphas
Levi, expressou muito bem a perda dos Mistérios, e a necessidade
de sua reinstituição. "Um grande infortúnio se
abateu sobre a Cristandade. A traição dos Mistérios
pelos falsos Gnósticos - pois Gnósticos, isto é, aqueles
que sabem, eram os Iniciados do Cristianismo primitivo - fizeram com que
a Gnose fosse rejeitada, e alienaram a Igreja das supremas verdades da Kabbala,
que contém todos os segredos da teologia transcendental... Que a
ciência mais absoluta, que a mais excelsa razão, se tornem
uma vez mais o patrimônio dos líderes dos povos; que a arte
sacerdotal e a arte régia tomem o duplo cetro das antigas iniciações,
e o mundo social será uma vez mais tirado de seu caos. Chega de queimar
as imagens, basta de derrubar os templos; templos e imagens são necessários
para os homens; mas expulsem os mercenários da casa de oração;
que o cego deixe de ser o líder para os cegos, reconstrua-se a hierarquia
de inteligência e santidade, e reconheçam somente aqueles que
sabem como instrutores dos que crêem" (The Mysteries of Magic,
trad. para o inglês de A.E.Waite, pp 58 e 60).
Retomarão as Igrejas de hoje o ensinamento místico, os Mistérios
Menores, preparando assim seus filhos para o restabelecimento dos Mistérios
Maiores, atraindo mais uma vez o Anjos para ensinar, e tendo como Hierofante
o Divino Mestre, Jesus? Da resposta a esta pergunta depende o futuro do
Cristianismo.