A direita e a esquerda do Filho
ELIPHAS LÉVI


A direita e a esquerda de Jesus, o Thabor e o deserto, o povo organizado em grupos. Jesus revela-se a seus três discípulos mais inteligentes, como o centro da humanidade, colocando-se, no passado, entre Moisés, o homem da ordem e da doutrina, e Elias, o homem do protesto e da profecia insubmissa. Tal é a significação dessa transfiguração do Thabor onde Pedro queria edificar três tabernáculos, um para Moisés, um para Cristo e o terceiro para Elias: mas o tempo da síntese não havia ainda chegado.

Não esqueçamos que os evangelistas colocaram em ação toda a`parte esotérica ou oculta do Evangelho, e que para dizer: Jesus elevou o espírito de seus discípulos a uma grande altura e fez com que compreendessem toda a verdade de sua doutrina, eles dizem: Jesus os conduziu sobre uma montanha e, transfigurando-se, diante deles, apareceu a todos resplandecente de luz, de modo que seu rosto estava brilhante como o sol e suas roupas deslumbrantes como a neve. João e Tiago disseram-lhe então: Mestre, fazei-nos sentar um à vossa direita, outro à vossa esquerda, quando vosso reino tiver chegado.


Jesus disse-lhes: Posso conceder-vos parte em meu cálice e em meu batismo; mas sentar-se à minha direita ou à minha esquerda, não cabe a mim conceder; esses lugares estão reservados àqueles que são predestinados por meu Pai. Assim Jesus esperava ainda dois homens para completar sua doutrina e concluir sua obra: o homem da direita, isto é, o homem da ordem e da organização; e o homem da esquerda, isto é, o homem da expansão, do amor e da harmonia. Quanto à organização social, Jesus indicou-a sumariamente na parábola da multiplicação dos pães, onde lemos que Jesus dividiu o povo em grupos de cem e de cinqüenta, secundum contubernia, segundo morassem ou pudessem morar juntos. Depois repartiu, entre todos, os cinqüenta pães e os dois peixes que representavam o primeiro avanço da pobreza crente na associação, e a associação multiplicou de tal modo esses débeis recursos, que, com aquilo que sobrou, podiam-se encher doze cestos. Aqui, o que afirmamos sobre o simbolismo dos milagres evangélicos está suficientemente comprovado pelo absurdo da letra e a impossibilidade material do fato, como o doutor Strauss teve o trabalho de demonstrar. Mas o sentido da parábola é admirável, a parábola é necessária quando a verdade é perigosa ou inútil de ser revelada.


Também Jesus dissera: Tenho ainda muitas coisas a vos ensinar, mas não podereis carregá-las agora. O espírito de inteligência virá e vos ensinará toda a verdade. Primeiro todo o velho mundo deveria dissolver-se e perecer, depois esse espírito deveria chegar e renovar a face da terra. Talvez estejamos na hora da dissolução universal, mas tranqüilizamos nosso coração e esperamos: porque, sobre as ruínas, já podemos ver a pomba celeste e o sopro da revelação renovada já se ergue nas nuvens do Oriente.

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