O CASTELO DE TOMAR - PORTUGAL
Os Templários que conseguiram escapar ao destroço causado em Soure pela arremetida: muçulmana de 1144 juntaram-se, na primavera de 1147, à hoste que o Primeiro Rei De Portugal preparava para a conquista de Santarém. Movia-os, simultaneamente, o seu dever, próprio de frades militares, e o desejo de libertarem os seus confrades caídos em poder do inimigo por ocasião daquele ataque e para ali trazidos em cativeiro.
Realizada a conquista, D. Afonso Henriques recompensou-lhes a eficiente
colaboração dando à Ordem do Templo os rendimentos
eclesiásticos da terra conquistada; mas logo meses depois, integrada
também Lisboa na posse cristã, o sacerdote inglês Gilberto,
primeiro bispo da restaurada diocese lisbonense, contestou a validade daquela
doação, travando-se demorado litígio, que só
terminou mais de dez anos depois, quando D. Afonso Henriques harmonizou
os desavindos, cedendo ao prelado o benefício que disputava e doando
aos Templários, na pessoa do seu Mestre, então Gualdim Pais,
o castelo de Cera (hoje Ceras) com seu vasto termo. O diploma régio
de concórdia, lavrado em Fevereiro de 1159, definindo o âmbito
das terras doadas, limitava-as por uma linha que partindo do Zézere
em leste-oeste na direcção de Murta, a acerca de seis quilómetros
ao norte de Cera, seguia a Freixianda, e daqui rodando ao sul e a sul-sudoeste
alcançava, primeiro, um certo lugar de passagem do curso médio
do Nabão (então chamado Tomar) onde a estrada romana de Santarém
a Coimbra atingia esse afluente do Zézere (et inde venit ad portum
de Thomar qui est in strata de Colimbria ad Santarém), e depoisum
vau da sub-afluente ribeira de Ourém (et inde per portum de Ourens),
que o Prof. Rui de Azevedo crê situado entre Ceiça e Chão
de Maças. Costeando assim o termo de Leiria, a linha divisória
seguia ao ribeiro de Bezelga, e, sucessivamente inflectida a sueste e a
leste acompanhava aquele modesto veio de água, afluente do Nabão,
e depois este até à sua confluência no Zézere
(et inde per lombum de Santarém... ad Bezelga et descendit ad Thomar
et inde in Ozezar); finalmente, o curso do Zézere para o norte até
ao lugar indicado como inicio da delimitação, balizava por
leste a região doada, de configuração vagamente circular
e cujo circuito se alongava por cerca duns 90 quilómetros.
Após um ano de estadia no castelo de Cera, reconheceu Gualdim Pais
que ele não reunia as condições apropriadas a servir
de sede da Ordem, e resolveu edificar, com esse fim, um castelo em lugar
que lhe pareceu mais adequado, e esse foi um outeiro na margem direita do
Nabão e em cujo sopé se estendia viçosa planície
apropriada a profícuo povoamento humano.
Começou a construção no dia 1 de Março de 1160
conforme consta de inscrições que penduram no castelo, de
cujo conjunto embora mutilado pela invasão de outras edificações
e afetado pelas habituais causas de ruína, ainda resta o suficiente
para bem se conhecerem as peças componeabes. Adaptada às condições
tipográficas, uma muralha de forma irregularmente angulosa, guarnecida
de torreões, de acesso ao terreiro geral, dentro do qual descentradamente
para nordeste se situa, em plano mais elevado, o terreiro da alcáçova,
de configuração escutiforme com o vértice voltado ao
sul, e dentro do qual se ergue, quase encostada à respectiva muralha
circundante, a torre de mensagem.
Pelo mesmo tempo se construiu a célebre charola, mais tarde adaptada,
com mutilações, a capela-mor dum mais vasto templo, e decerto
também se edificaram as primitivas instalações conventuais
que serviram de residência aos monges-cavaleiros da fundação
desse núcleo construtivo.
Entretanto, e dando cumprimento a uma das obrigações inscritas
na carta de doação do castelo de Cera, e seu termo, a de promover
neste o povoamento e conseqüente desenvolvimento econômico, Gualdim
Pais logo procurou criar na subjacente planície marginal do Nabão
um núcleo populacional a que foi dado como denominação
o nome então dado aquele rio, o de Tomar; e para incentivar a concentração
de povoadores e o seu enraizamento no local, já em 1162 lhe concedia
os direitos inscritos em foral, doze anos depois reformado em termos de
adequada aplicação.
Não tardou que a esses começos de vida outras vicissitudes
viessem somar-se, inaugurando gloriosamente a história do castelo
de Tomar, Em 1190 o emir de Marrocos, lacube Ibne Iúçufe,
desembarcado em Tarifa com importantes forças, a que logo se juntaram
as da Espanha muçulmana, marchou para ocidente com o fito de conquistar
Silves, notável prado do Algarve muçulmano que D. Sancho I
no ano anterior conquistara; deixando ali algumas tropas sitiantes, logo
se dirigiu com o groso do seu poderoso exercito para a linha do Tejo, que
transpôs a montante de Santarém, tomando o Ribatejo até
Tomar, a cujo castelo deu sucessivos assaltos durante seis dias, sem obter
a desejada rendição dos Templários, que heroicamente
o defendiam. Desistindo então do intento, ordenou o emir a retirada;
não, porém, sem deixar assoladas as terras circunjacentes,
cujos habitantes foram em parte mortos, ou em grandíssimo número
levados como cativos.
Mantiveram-se os Templários ao serviço da Coroa nas campanhas
militares que contra muçulmanos ele travou dentro e fora de Portugal
nos séculos XII e XIII, até que, extinta em 1312 a Ordem do
Templo pelo papa Clemente V, como remate da iníqua perseguição
movida contra os seus membros pelo monarca francês Felipe-o-Belo,
D. Dinis acautelando para a Coroa os bens dos Templários portugueses
obteve em 1321 a bula pontifícia de criação duma nova
Ordem militar, a de Cristo, na qual, segundo se crê, alguns daqueles
ingressaram. Estabelecida como sede do novo instituto a vila de Castro Marim,
já em 1338, ou data muito próxima, ela foi transferida para
Tomar, cujo castelo passou à guarda dos cavaleiros da Ordem de Cristo,
como o estivera à dos Templários, e eles o mantiveram fiel
à causa portuguesa, personificada no Mestre de Avis, D. João,
quando nos fins daquele século se abriu a crise dinástica
decorrente do falecimento de D. Fernando em 1383 e subsequente sucessão
de sua filha, infanta D. Beatriz, então casada com o monarca espanhol
João I, ao trono de Portugal.
Esteve alerta o castelo de Tomar quando por esta vila apressadamente passou
com sua hoste, em Janeiro de 1384, o consorte de D. Beatriz, a caminho de
Lisboa, no malogrado intento de conquistar a capital portuguesa, que determinara
essa primeira invasão. No verão do ano seguinte, de novo o
castelo de Tomar se inseriu na campanha luso-castelhana, visitado decerto
pelo ex-Mestre de Avis, já então Rei D. João I de Portugal,
que, vindo do norte para enfrentar a segunda invasão castelhana,
nessa vila concentrou uma parte das forças militares levadas à
vitoriosa batalha de Aljubarrota.
Ao tratar do gloriosa passado do castelo de Tomar, uma palavra deve ainda
acrescentar-se, memorando inserir-se nela o fato de relacionar-se, em certo
aspecto, com a atividade ultramarina do Infante D. Henrique, pois este,
na qualidade de Governador da Ordem de Cristo, ali teve casa sua.
Quantas vezes, sem duvida, subira o glorioso Infante, meditando seus graves
problemas, aquelas muralhas, já então sem eficiência
militar, mas onde ecoavam três séculos da gloriosa história
de Portugal.
Este belo castelo aguarda obras de restauro pois encontra-se em algum estado
de degradação embora tenha sido bastante recuperado há
cerca de 10 anos quando passou a ser Patrimônio da Humanidade