A preparação Interior
Para os que aderem mais de perto aos preceitos primitivos do cristianismo,
as estações penitenciais são um momento de introspecção,
calma e auto-reflexão cujo propósito fundamental visa a preparação
para as grandes festas, como a da Natividade, da Ressurreição,
de Pentecostes etc.
Paramahansa Yogananda descreve este trabalho interno de preparação
como um trabalho de limpeza interior e purificação. Escreveu
ele:
"Vou preparar-me para a vinda do Omnipresente Cristo bebé, limpando
o berço da minha consciência e sentidos a ela presos. Assim,
diariamente através da meditação e da introspecção
divina, vou remodelar o berço impregnando-o das qualidades reais
da Alma tais como: o amor fraterno, a humildade, a fé, o desejo de
Deus, a força de vontade, o autocontrolo, a renúncia e a abnegação,
para que eu possa dignamente celebrar o nascimento da Criança Divina."
Também apelidada no ocidente de menino Rei.
A procura da luz da Gnose requer uma permeabilidade e uma abertura à
experiência espiritual impossível às consciências
que não tenham sofrido algum grau de purificação. Uma
das diretrizes do cristianismo foi a substituição das antigas
leis Mosaicas de purificação e as suas respectivas prescrições
alimentares, substituindo-as pela prática das purificações
interiores dos nossos corações e mentes. Este é o significado
do que hoje lemos no Livro de Sophia:
"Procurai de dia e de noite até encontrardes os mistérios
purificadores da Luz que refinam o corpo material transmutando-o num robe
de glória, manancial de luz purificada." O que demandamos é
a Luz, para que estes mistérios interiores de purificação
possam dar à luz o corpo iluminado, também chamado de corpo
de diamante em alguns trabalhos de literatura budista. Contudo, o refinamento
do corpo da matéria não é um processo totalmente agradável.
Na verdade é algo muito idêntico ao processo alquímico
de putrefacção. É natural portanto que em alguns aspectos
seja repugnante já que como se refere em alguns tratados se terá
de visualizar o corpo da matéria como um cadáver em vários
estágios de decomposição. No entanto, para lá
da escuridão putrefata do Nigredo, está a brancura purificada
do Albedo, o vermelho do Rubedo, e eventualmente a Aurora Real, o "corpo
de diamante" ou Robe de Glória, que emana todas as cores do
arco-íris e que se relaciona também com o centro de energia
a que se chama rosa ou chacra da coroa, que vedes representado pelo Solidéu
bispal que reveste esse ponto. (mostrar) a coroa do nosso real e verdadeiro
Eu, o centro de nossa ligação espiritual com o Ser Divino,
para cima e para dentro, longe das coisas externas e materiais.
Este ciclo de cores, tão importante na literatura alquímica
encontra-se também presente nas estações eclesiásticas
que compõem o ano litúrgico. Como podeis ver, pela minha casula,
a cor do advento, roxo ou violeta, exprime as qualidades da purificação
e da realeza. Tomé, refere que essa realeza é como que uma
sub-pele que aguarda o despertar dentro de cada um de nós. Assim
ele nos diz:
"Quem procura, não cesse de procurar até encontrar. Quando
encontrar, ficará estupefato, depois de estupefato ficará
maravilhado. Então terá domínio sobre o Universo. "
Este domínio de plenitude, relaciona-se com a palavra grega: Pleroma,
e respeita à totalidade do nosso universo onde o mundo externo e
material ocupa apenas uma parte. Quando começamos a procurar a Luz,
como Sophia, que anseia pela luz do Pai Desconhecido, deparamo-nos com os
abismos, passamos por uma queda psicológica. O nosso primeiro confronto
com o inconsciente provoca um sentimento de angústia na psique, uma
ferida do ego mundano.
Esse contato inicial com o inconsciente representa o início do processo
que Jung chamou de "individuação".
Assim, o início do ano litúrgico, representa o começo
do caminho da individuação, exemplificado na história
mítica do Mensageiro de Luz, Jesus. O caminho da individuação
é a jornada da alma. Este caminho mostra-nos a sua procura, o seu
caminho para o lugar de apoteose e de descanso, onde reinará sobre
o Todo. No Advento, celebramos a vinda do mensageiro da luz, doo Libertador
que nos pode guiar das trevas da ignorância à Luz da Gnose.
O Advento é pois um período de introversão e de preparação
para o nascimento da luz interior, representada pelo solstício de
inverno. É também a época do ano em que damos graças
pelos bens terrenos e materiais. Por isso damos ofertas, sinais de frutificação.
Durante o período do Advento temos mais consciência dos menos
afortunados e dos carentes. Percebemos melhor a dor e o sofrimento no mundo.
Teremos pois de estar também mais abertos ao maravilhoso trabalho
da obra divina da redenção e de como podemos cooperar nela.
O Livro de Sophia descreve esta obra de redenção na simplicidade
maravilhosa, não como uma projeção externa, mas como
um mistério interior.
"Ajudai todos os que de vós de aproximam: os que ouvem as vossas
palavras e que acreditam na mensagem que ensinais e que se são dignos
dos Mistérios da Luz. A esses comunicareis os mistérios sem
nada lhes esconderdes. Sabei que aquele que acendendo a chama da vida numa
única alma ajudando a libertá-la, somará à sua
própria luz a glória da alma que libertou."
O dom mais precioso que possuímos e que devemos ofertar são
então os mistérios da luz, não como uma forma de evangelismo
ou de contacto porta a porta, mas pelo exemplo. Então os que procuram
os mistérios virão até nós. Um a um, poder-nos-emos
ir despertando, então a dor e o sofrimento no mundo poderão
ser transformados. Progressivamente
A penitência
desta época, é pois interior e pessoal. Longe de pontos morais
prescritos, devemos olhar para dentro de nós de forma a conscientemente
podermos perdoar-nos e ajudar-nos. Só assim poderemos ajudar e perdoar
os outros. Reparar a nossa ligação com o divino através
do ano que vai começar: Eis o nosso trabalho! Deixemos que a nossa
própria luz se manifeste à imagem daquele que veio trazer
a verdade.
Ámen
Mons. T+ Lusignan