APOLÔNIO E OS GOVERNANTES DO IMPÉRIO
Mas não só Apolônio vivificou e reconsagrou os antigos
centros religiosos por algum motivo inescrutável, e fez o que pôde
para ajudar a vida religiosa do seu tempo em suas múltiplas formas,
mas também tomou uma parte decisiva, embora indireta, na influência
dos destinos do Império através das pessoas de seus governantes
supremos.
Esta influência, contudo, era invariavelmente de natureza moral e
não política. Era levada a cabo através de conversas
e instrução filosóficas, pela palavra falada ou escrita.
Do mesmo modo que Apolônio em suas viagens conversou sobre filosofia,
e discursou sobre a vida de um homem sábio e sobre os deveres de
um governante sábio com reis (ele passou, nos dizem, não menos
de um ano e oito meses com Vardan, Rei da Babilônia, e foi o honrado
hóspede do Rajá Indiano "Fraotes"), governantes
e magistrados, também tentou aconselhar para seu bem aqueles imperadores
que se dispunham a ouví-lo.
Vespasiano, Tito e Nerva eram todos, antes de sua elevação
à púrpura, amigos e admiradores de Apolônio, enquanto
que Nero e Domiciano olhavam o filósofo com temor.
Durante a breve estada de Apolônio em Roma, em 66 d.C., mesmo que
nem uma só palavra lhe houvesse escapado que pudesse ser transformada
em um pronunciamento traidor pelos numerosos informantes, não obstante
ele foi trazido perante Tigelino, o infame favorito de Nero, e submetido
a um cerrado interrogatório cruzado. Aparentemente até esta
época Apolônio estava trabalhando para o futuro, e tinha restringido
sua atenção inteiramente à reforma da religião
e à restauração das antigas instituições
das nações, mas a tirânica conduta de Nero, que não
deu paz nem mesmo ao mais inatacável dos filósofos, abriu
completamente seus olhos para um mal mais imediato, que parecia ser nada
menos que a ab-rogação da liberdade de consciência por
uma tirania irresponsável. Daí em diante, portanto, encontramo-lo
vivamente interessado nas pessoas dos imperadores seguintes.
Na verdade, Damis, ainda que confesse sua inteira ignorância do propósito
da viagem de Apolônio à Espanha depois de sua expulsão
de Roma, presume que tenha sido para apoiar a iminente revolta contra Nero.
Ele conjetura isso a partir de três dias de entrevistas secretas de
Apolônio com o Governador da Província da Bética, que
veio a Cádiz especialmente para vê-lo, e declara que as últimas
palavras do visitante de Apolônio foram: "Adeus, e lembre-se
de Vindex" (v, 10).
É verdade que quase imediatamente depois irrompeu a revolta de Vindex,
o Governador da Gália, mas toda a vida e caráter de Apolônio
são opostos a qualquer idéia de intriga política; ao
contrário, ele bravamente contestou a tirania e a injustiça
face a face. Ele se opunha à idéia de Eufrates, um filósofo
de perfil muito diverso, que teria posto um fim na monarquia e restaurado
a república (v, 33); ele acreditava que o governo por um monarca
era o melhor para o Império, mas desejava acima de tudo ver "o
rebanho da humanidade" conduzido por "um pastor sábio e
fiel" (v, 35).
De modo que embora Apolônio tenha apoiado Vespasiano enquanto ele
tentou realizar dignamente seu ideal, imediatamente censurou-o pessoalmente
quando ele privou as cidades gregas de seus privilégios. "Vós
escravizastes a Grécia", ele escreveu. "Vós reduzistes
um povo livre à escravidão" (v, 41). De qualquer maneira,
a despeito de sua censura, Vespasiano, em sua última carta a seu
filho Tito, confessou que eles eram o que eram exclusivamente por virtude
do bom conselho de Apolônio (v, 30).
De igual modo ele viajou a Roma para encontrar Domiciano face a face, e
mesmo que tenha sido posto em julgamento e todos os esforços tenham
sido feitos para prová-lo culpado de complot traidor com Nerva, ele
não pôde ser indiciado por nada de natureza política.
Nerva era um bom homem, disse ao Imperador, e não um traidor. Não
que Domiciano tivesse realmente alguma suspeita de que Apolônio estivesse
pessoalmente intrigando contra ele; ele o colocou na prisão somente
na esperança de que poderia induzir o filósofo a revelar as
confidências de Nerva e outros homens eminentes que lhe eram objetos
de suspeita, e que ele imaginava que tinham consultado Apolônio sobre
suas chances de sucesso.
Os negócios de Apolônio não eram com a política,
mas com "os príncipes que lhe pediam conselho sobre a virtude"
(vi, 43).