Simão
Cananeu E Judas Tadeu
Simão recebe um epíteto que varia nas quatro listas: Mateus
qualifica-o como "cananeu", Lucas define-o "zelote".
Na realidade, as duas qualificações equivalem-se, porque significam
a mesma coisa: na língua hebraica, de fato, o verbo qanà'
significa "ser zeloso", "dedicado" e pode referir-se
quer a Deus, porque é zeloso do povo por ele escolhido (cf. Êx
20, 5), quer a homens que são zelosos no serviço a Deus único
com dedicação total, como Elias (cf. 1 Rs 19, 10). Portanto,
é possível que este Simão, se não pertencia
exatamente ao movimento nacionalista dos Zelotes, tivesse pelo menos como
característica um fervoroso zelo pela identidade judaica, por conseguinte,
pelo Criador, pelo seu povo e pela Lei divina. Sendo assim, Simão
coloca-se no antípoda de Mateus, que ao contrário, sendo publicano,
provinha de uma atividade considerada totalmente impura.
Sinal evidente que Jesus chama os seus discípulos e colaboradores
das camadas sociais e religiosas mais diversas, sem exclusão alguma.
Ele interessa-se pelas pessoas, não pelas categorias sociais ou pelas
atividades! E o mais belo é que no grupo dos seus seguidores, todos,
mesmo se diversos, coexistiam, superando as inimagináveis dificuldades:
de fato, era o próprio Jesus o motivo de coesão, no qual todos
se reencontravam unidos. Isto constitui claramente uma lição
para nós, com freqüência propensos a realçar as
diferenças e talvez as contraposições, esquecendo que
no Retificador nos é dada a força para superar os nossos conflitos.
Tenhamos também presente que o grupo dos Doze é a prefiguração
da Igreja, na qual devem ter espaço todos os carismas, os povos,
as raças, todas as qualidades humanas, que encontram a sua composição
e a sua unidade na comunhão com Jesus.
No que se refere depois a Judas Tadeu, ele é chamado assim pela tradição,
unindo ao mesmo tempo dois nomes diferentes: de fato, enquanto Mateus e
Marcos o chamam simplesmente "Tadeu" (Mt 10, 3; Mc 3, 18), Lucas
chama-o "Judas de Tiago" (Lc 6, 16; Act 1, 13). O sobrenome Tadeu
tem uma derivação incerta e é explicado ou como proveniente
do aramaico taddà', que significa "peito" e, por conseguinte,
significaria "magnânimo", ou como abreviação
de um nome grego como "Teodoro, Teódoto". Dele são
transmitidas poucas coisas. Só João assinala um seu pedido
feito a Jesus durante a Última Ceia. Diz Tadeu ao Senhor: "Senhor,
como aconteceu que te deves manifestar a nós e não ao mundo?".
É uma pergunta de grande atualidade, que também nós
fazemos ao Senhor: porque o Ressuscitado não se manifestou em toda
a sua glória aos seus adversários para mostrar que o vencedor
é o Criador? Por que se manifestou só aos Discípulos?
A resposta do Reconciliador é misteriosa e profunda. O Senhor diz:
"Se alguém me tem amor, há de guardar a minha palavra;
e o meu Pai o amará, e Nós viremos a ele e nele faremos morada"
(Jo 14, 22-23). Isto significa que o Ressuscitado deve ser visto, sentido
também com o coração, de modo que o Criador possa habitar
em nós. O Senhor não se mostra como uma coisa. Ele quer entrar
na nossa vida e por isso a sua manifestação é uma manifestação
que exige e pressupõe o coração aberto. Só assim
vemos o Ressuscitado.
Foi atribuída a Judas Tadeu a paternidade de uma das Cartas do Novo
Testamento, que são chamadas "católicas" porque
não se destinam a uma determinada Igreja local, mas a um círculo
muito amplo de destinatários. De fato, ele dirige-se "aos eleitos
amados por Deus Pai e guardados para Jesus Cristo" (v. 1). A preocupação
central deste escrito é advertir os cristãos de todos os que,
com o pretexto da graça de Deus, desculpam a própria devassidão
e para desviar outros irmãos com ensinamentos inaceitáveis,
introduzindo divisões dentro da Igreja "deixando-se levar pelo
seu delírio" (v. 8), assim define Judas estas suas doutrinas
e idéias especiais. Ele compara-os inclusivamente aos anjos caídos,
e com palavras fortes diz que "seguiram pelo caminho de Caim"
(v. 11). Além disso classifica-os sem reticências como "nuvens
sem água que os ventos levam; árvores de outono sem fruto,
duas vezes mortas, desarraigadas; ondas furiosas do mar que repelem a espuma
da sua torpeza; estrelas errantes condenadas à negrura das trevas
eternas" (vv. 12-13).
Talvez hoje nós já não estejamos habituados a usar
uma linguagem tão polêmica, que contudo nos diz uma coisa importante.
No meio de todas as tentações que existem, com todas as correntes
da vida moderna, devemos conservar a identidade da nossa fé. Por
outro lado, é necessário ter bem presente que esta nossa identidade
exige força, clareza e coragem face às contradições
do mundo em que vivemos. Por isso o texto epistolar prossegue assim: "Mas
vós, caríssimos, fala a todos nós mantende-vos no amor
de Deus, esperando que a misericórdia de Nosso Reparador vos conceda
a vida eterna. Tratai com misericórdia aqueles que vacilam..."
(vv. 20-22). A Carta conclui-se com estas bonitas palavras: "Àquele
que é poderoso para vos livrar das quedas e vos apresentar diante
da sua glória, imaculados e cheios de alegria, ao Deus único,
nosso Salvador, por meio de seu filho o Reconciliador, seja dada glória,
a majestade, a soberania e o poder, antes de todos os tempos, agora e por
todos os séculos.
Vê-se bem que o autor destas frases vive plenamente, à qual
pertencem realidades grandes como a integridade moral e a alegria, a confiança
e por fim o louvor, sendo motivado em tudo apenas pela bondade do nosso
único Deus e pela misericórdia de nosso Reparador . Por isso,
tanto Simão o Cananeu, como Judas Tadeu nos ajudam a redescobrir
sempre de novo e a viver incansavelmente a beleza da fé cristã,
sabendo dar um testemunho dela forte e ao mesmo tempo sereno.