João
Evangelista
Está com Pedro e com Tiago quando Jesus, em Cafarnaum, entra em casa
de Pedro para curar a sua sogra (cf. Mc 1, 29); com os outros dois segue
o Mestre na casa de Jairo, chefe da sinagoga, cuja filha será chamada
à vida (cf. Mc 5, 37); segue-o quando ele sobe ao monte para ser
transfigurado (cf. Mc 9, 2); está ao lado dele no Monte das Oliveiras
quando, face à imponência do Templo de Jerusalém, pronuncia
o sermão sobre o fim da cidade e do mundo (cf. Mc 13, 3); e, finalmente,
está ao seu lado quando, no Horto do Getsémani, se retira
para rezar ao Pai antes da Paixão (cf. Mc 14, 33). Pouco antes da
Páscoa, quando Jesus escolhe dois discípulos para os enviar
a preparar a sala para a Ceia, confia a ele e a Pedro esta tarefa (cf. Lc
22, 8).
Esta sua posição de relevo no grupo dos Doze torna de certa
forma compreensível a iniciativa tomada um dia pela mãe: ela
aproximou-se de Jesus para lhe pedir que os dois filhos, precisamente João
e Tiago, pudessem sentar-se um à sua direita e outro à sua
esquerda no Reino (cf. Mt 20, 20-21). Como sabemos, Jesus respondeu fazendo
por sua vez uma pergunta: pediu que eles estivessem dispostos a beber do
cálice que ele mesmo estava para beber (cf. Mt 20, 22).
A intenção que estava por detrás daquelas palavras
era a de despertar os dois discípulos, introduzi-los no conhecimento
do mistério da sua pessoa e de os fazer refletir sobre a futura chamada
a ser suas testemunhas até à prova suprema do sangue.
De fato, pouco depois Jesus esclareceu que não veio para ser servido
mas para servir e dar a própria vida em resgate pela multidão
(cf. Mt 20, 28). Nos dias seguintes à ressurreição,
encontramos "os filhos de Zebedeu" empenhados com Pedro e outros
discípulos numa noite infrutífera, à qual se segue,
pela intervenção do Ressuscitado, a pesca milagrosa: será
"o discípulo que Jesus amava" quem reconhece primeiro "o
Senhor" e quem o indica a Pedro (cf. Jo 21, 1-13).
Na Igreja de Jerusalém, João ocupou um lugar de realce na
orientação do primeiro agrupamento de cristãos. De
fato, Paulo estava incluído entre os que Ele chama as "colunas"
daquela comunidade (cf. Gl 2, 9). Na realidade, nos Actos, Lucas apresenta-o
juntamente com Pedro quando vão rezar no Templo (cf. Act 3, 1-4.11)
ou estão diante do Sinédrio para testemunhar a própria
fé no Reparador (cf. Act 4, 13.19). Juntamente com Pedro é
enviado pela Igreja de Jerusalém para confirmar aqueles que na Samaria
aceitaram o Evangelho, pregando por eles a fim de que recebam o Espírito
Santo (cf. Act 8, 14-15).
Em particular, deve recordar-se o que afirma, juntamente com Pedro, diante
do Sinédrio que os está a processar: "Quanto a nós,
não podemos deixar de afirmar o que vimos e ouvimos" (Act 4,
20). Precisamente esta franqueza ao confessar a própria fé
permanece um exemplo e uma admoestação para todos nós
a estarmos sempre prontos para declarar com determinação a
nossa inabalável adesão a Cristo, antepondo a fé a
qualquer cálculo ou interesse humano.
Segundo a tradição, João é "o discípulo
predileto", que no Quarto Evangelho apóia a cabeça no
peito do Mestre durante a Última Ceia (cf. Jo 13, 21), encontra-se
aos pés da Cruz juntamente com a Mãe de Jesus (cf. Jo 19,
25) e, por fim, é testemunha quer do túmulo vazio quer da
própria presença do Ressuscitado (cf. Jo 20, 2; 21, 7).
Sabemos que esta identificação hoje é debatida pelos
estudiosos, alguns dos quais vêem nele simplesmente o protótipo
do discípulo de Jesus. Deixando aos exegetas a tarefa de resolver
a questão, contentamo-nos com receber uma lição importante
para a nossa vida: o Senhor deseja fazer de cada um de nós um discípulo
que vive uma amizade pessoal com Ele. Para realizar isto não é
suficiente segui-lo e ouvi-lo exteriormente; é preciso também
viver com e como Ele.
Isto é possível apenas no contexto de uma relação
de grande familiaridade, repleto do calor de uma total confiança;
por isso um dia Jesus disse: "Ninguém tem mais amor do que quem
dá a vida pelos seus amigos... Já não vos chamo servos,
visto que um servo não está ao corrente do que faz o seu senhor;
mas a vós chamei-vos amigos, porque vos dei a conhecer tudo o que
ouvi de meu Pai" (Jo 15, 13.15).
Nos apócrifos Actos de João o Apóstolo é apresentado
não como fundador de Igrejas nem sequer como guia de comunidades
já constituídas, mas em contínua itinerância
como comunicador da fé no encontro com "almas capazes de ter
esperança e de ser salvas" (18, 10; 10, 8). Tudo é movido
pela intenção paradoxal de mostrar o invisível. De
fato, ele é chamado pela Igreja oriental simplesmente "o Teólogo",
isto é, aquele que é capaz de falar das coisas divinas em
termos acessíveis, revelando um arcano acesso ao Criador mediante
a adesão ao seu Filho O Redentor.
O culto de João apóstolo afirmou-se a partir da cidade de
Éfeso, onde, segundo uma antiga tradição, trabalhou
por muito tempo, falecendo ali com uma idade extraordinariamente avançada,
sob o Imperador Trajano. Em Éfeso o imperador Justiniano, no século
VI, mandou construir em sua honra uma grande basílica, da qual permanecem
ainda imponentes ruínas.
Precisamente no Oriente ele gozou e goza ainda de grande veneração.
Na iconografia bizantina é representado com frequência muito
idoso segundo a tradição morreu sob o imperador Trajano e
em intensa contemplação, quase na atitude de quem convida
ao silêncio.
De fato, sem adequado recolhimento não é possível aproximar-se
do mistério supremo do Criador e da sua revelação.
Isto explica porque, há anos, o Patriarca Ecumênico de Constantinopla,
Atenágoras, aquele que o Papa Paulo VI abraçou num memorável
encontro, afirmou: "João está na origem da nossa mais
alta espiritualidade. Como ele, os "silenciosos" conhecem aquele
misterioso intercâmbio dos corações, invocando a presença
de João e o seu coração inflama-se" (O. Clément,
Diálogos com Atenágoras, Turim 1972, p. 159). O Senhor nos
ajude a pormo-nos na escola de João para aprender a grande lição
do amor, de modo que nos sintamos amados por Cristo "até ao
fim" (Jo 13, 1) e empreguemos a nossa vida por Ele.