MAGIA
E MISTICISMO
Traduzido pelo Amado Irmão Albertus SI - Grupo Hermanubis
As razões deste erro são também, ao mesmo tempo, as razões pelas quais a magia apresenta perigos essencialmente graves para os ocidentais modernos, e dos quais o primeiro é a sua tendência a atribuir uma importância excessiva a tudo o que são "fenômenos", como testemunha por outra parte o desenvolvimento que tem dado as ciências experimentais; se forem tão facilmente seduzidos pela magia, e si se imaginam até o ponto acerca de seu alcance real, é porque é, também, uma ciência experimental, ainda que bastante diferente, com segurança, daquelas que o ensino universitário conhece debaixo dessa denominação.
Não é preciso então se enganar: trata-se de uma ordem de coisas que não tem em si mesmo absolutamente nada de "transcendente"; e, se uma ciência semelhante pode, com todas as demais, estar legitimada por sua relação com os princípios superiores dos quais tudo depende, seguindo a concepção geral das ciências tradicionais, não se situará sem dúvida na última categoria das aplicações secundárias e contingentes, entre as que estão mais distantes dos princípios, logo entre as que devem ser consideradas como as mais inferiores.
A magia é
considerada em todas as civilizações orientais, que ela existe
é um feito inegável, porém está muito longe
de ser tão bem vista como se imaginam muitas vezes os ocidentais.
No Tibete mesmo, tanto como na Índia ou na China, a prática
da magia, enquanto "especialidade", se pode dizer assim, é
abandonado aquele que são incapazes de elevar-se a uma ordem superior;
isto, por hipótese, não significa que os demais não
possam também produzir de vez em quando, excepcionalmente e por razões
particulares, fenômenos exteriormente semelhantes aos fenômenos
mágicos, porém o objetivo e inclusive os meios colocados em
prática são então na realidade totalmente diferentes.
Ademais, para aderir o que é conhecido no mundo ocidental, que se
tomem simplesmente às histórias de santos e feiticeiros; e
isto demonstra bem que, contrariamente a crença dos modernos "cientistas",
os fenômenos, sejam quais forem, não poderiam em absoluto provar
nada por si mesmos (10).
Agora, é evidente que o feito de iludir-se sobre o valor destas coisas
e sobre a importância que é conveniente atribuir-lhes aumenta
consideravelmente o perigo; o que é particularmente nocivo para os
ocidentais que querem envolver-se na magia, é a completa ignorância
em que necessariamente estão, no atual estado de coisas e na ausência
de todos os ensinamentos tradicionais, acerca daquilo em que se ocupariam
em outras circunstâncias. Inclusive deixando de lado os farsantes
e os charlatões tão numerosos em nossa época, que não
fazem em suma nada mas que exploram a credulidade dos ingênuos, e
também aos simples caprichos que crêem poder improvisar uma
"ciência" a sua maneira, os mesmos que desejam com seriedade
tentar estudar estes fenômenos, não tendo dados suficientes
que os guie, nem uma organização constituída para apóia-los
e protege-los, se vêem reduzidos a um grosseiro empirismo; comportam-se
verdadeiramente como crianças que, isentos de si mesmos, quiseram
manejar forças terríveis sem conhece-las, e, se ocorrem constantemente
deploráveis acidentes, por uma imprudência semelhante, não
têm lugar para maravilhar-se mais da conta.
Falando de acidentes, queremos especialmente fazer alusão aos riscos
de desequilíbrio aos quais se expões quem atuam assim; este
desequilíbrio é com efeito uma conseqüência bastante
freqüente da comunicação com o que alguns têm chamado
o "plano vital", e que não é em suma outra coisa
que o domínio da manifestação sutil, considerada por
outra parte principalmente naquelas de suas modalidades mais próximas
à ordem corporal, e por ele mais facilmente acessível ao homem
comum.
A explicação é simples: trata-se aqui exclusivamente de um desenvolvimento de certas possibilidades individuais, e inclusive de uma ordem demasiado inferior; se este desenvolvimento se produz de uma maneira anormal, desordenada e inarmônica, e em detrimento de possibilidades superiores, é natural e em qualquer caso inevitável que se deva redundar em semelhante resultado, sem falar das reações, que não são em absoluto depreciável e que algumas vezes chegam a ser terríveis, das forças de todos os gêneros com as quais o indivíduo se põe desconsideradamente em contato. Dissemos "forças", sem precisar, pois pouco importa para o nosso propósito; preferimos utilizar esta palavra, por vaga que seja, a de "entidades", que, ao menos para os que estão suficientemente acostumados a certas maneiras simbólicas de falar, corre o risco de dar lugar demasiado facilmente a "personificações" mais ou menos fantasiosas.
Este "mundo
intermediário", é, por outra parte, como muitas vezes
temos explicado, muito mais completo e mais extenso que o mundo corporal;
porém o estudo de ambos encaixa, igualmente, no que se pode chamar
as "ciências naturais", no sentido mais autêntico
desta expressão; querer ver algo mais é, repetimos, iludir-se
da forma mais estranha. Não há aqui absolutamente nada de
"iniciático", não mais por outra parte que de "religioso";
encontram-se inclusive, de maneira geral, muito mais obstáculos que
apoio para alcançar o conhecimento verdadeiramente transcendente,
que é algo completamente diferente das ciências contingentes,
e que, tem ares de um "fenomenismo" qualquer, não proveniente
senão da pura intuição intelectual, que é a
única e pura espiritualidade.
Alguns, depois de se entregar durante algum tempo a busca de fenômenos
extraordinários ou supostamente tais, acabam sem dúvida por
abandona-la, por uma razão qualquer, ou por ficar decepcionados pela
insignificância dos resultados obtidos e que não respondem
as suas previsões, e , coisa digna de se assinalar, ocorre freqüentemente
se voltam então para o misticismo (11); e que por estranho que possa
parecer a primeira vista, este responde ainda que debaixo de outro aspecto,
a necessidade ou aspirações similares.
Com segurança, estamos bem longe de dizer que o misticismo tenha, em si mesmo, um caráter notavelmente mais elevado que a magia; porem, apesar de tudo, si se vai ao fundo das coisas, pode um dar conta de que, debaixo de um certo aspecto ao menos, a diferença é menor do que poderia crer-se: aqui todavia, de fato, não se trata em suma mais do que "fenômenos", visões ou não, manifestações sensíveis e sentimentais de todo o gênero, com os quais se permanece sempre exclusivamente no domínio das possibilidades individuais (12).
Os perigos de ilusão e de desequilíbrio estão longe
de serem superados, e, se revestem aqui de formas tão diferentes,
não são possivelmente menores por isso; estão inclusive
agravando, em um sentido, pela atitude passiva do místico, que, como
afirmamos, deixa a porta aberta a todas as influências que podem apresentar-se,
enquanto o mago está ao menos protegido até certo ponto pela
atitude ativa que se esforça em conservar com respeito às
mesmas influências, o que certamente não significa, por outra
parte, que resista sempre e que não termine por ser submetido a elas,
Daqui vem também, ademais, que o místico, quase sempre, seja
muito facilmente vítima de sua imaginação, cujas produções,
sem dúvida, se entrecruzam muitas vezes com os resultados reais de
suas "experiências" de uma maneira um pouco mais ou menos
inconstante.
Por esta razão,
não é preciso exagerar a importância das "revelações"
dos místicos, ou, ao menos, não se deve jamais aceitar sem
controle (13); o que possui todo o interesse em certas visões é
que estão de acordo, em numerosos pontos, com os dados tradicionais
evidentemente ignorados pelo místico que teve as visões (14);
porém o que seria um erro, e inclusive uma inversão das relações
normais, é querer encontrar aqui uma "conformação"
dos ditos dados, da que não tem por outra parte nenhuma necessidade,
e que são, pelo contrário, a única garantia de que
há realmente nas visões em questão algo diferente a
um simples produto da imaginação ou da fantasia individual.
Notas
10. Cf. Le Règne de la Quantité et les Signes des Temps, cap.
XXXIX.
11. É preciso dizer que às vezes também ocorre que
outros, após haver entrado realmente na via iniciática, e
não somente nas ilusões da pseudoiniciação como
os mencionados anteriormente, tem abandonado esta via pelo misticismo; os
motivos são então naturalmente diferentes, e principalmente
de ordem sentimental, porém, sejam quais forem, é necessário
antes de tudo ver, em semelhantes casos, a conseqüência de um
defeito qualquer com respeito às qualificações iniciáticas,
ao menos no que concerne à atitude para realizar a iniciação
efetiva; um dos exemplos mais típicos que podem citar-se deste gênero
é o de L.C. de Saint-Martin.
12. Por conseguinte, isto não significa em absoluto que os fenômenos
de que se trata sejam unicamente de ordem psicológica como pretendem
alguns modernos.
13. Esta atitude de prudente reserva, que se impõe em razão
da tendência natural dos místicos a "divagação"
no sentido próprio da palavra, é por outra parte a que o Catolicismo
observa invariavelmente a este respeito.
14. Pode citar-se aqui como exemplo as visões de Anne-Catherine Emmerich.