ERROS DIVERSOS CONCERNENTES À INICIAÇÃO
Traduzido pelo Amado Irmão Albertus SI - Grupo Hermanubis


Não cremos supérfluos, para desanuviar o terreno em qualquer caso, assinalar, todavia alguns outros erros concernentes à natureza e o objetivo da iniciação, pois tudo que temos oportunidade de ler acerca do tema, através dos anos, nos contribuiu quase diariamente provas de uma incompreensão mais ou menos geral.

Naturalmente, não podemos sonhar com o fazer aqui uma espécie de "revisão", na qual nos referimos a todos os erros uma a um e em detalhe, o que seria demasiado fastioso e desprovido de interesse; melhor nos limitarmos em considerar alguns casos de qualquer maneira "típicos", o que, ao mesmo tempo, tem a vantagem de dispensarmos de fazer alusões demasiado diretas a tal autor ou tal escola, pois deve ficar claro que estas indicações têm para nós um alcance completamente independente de toda questão de "personalidades", como se diz comumente, ou, melhor dito, para empregar uma linguagem mais exata, de individualidades.

Recordaremos em primeiro lugar, sem insistir mais da conta, as concepções demasiadamente extensas segundo as quais a iniciação seria algo de ordem simplesmente "moral" e "social" (15); estas são demasiadamente limitadas e "terrenas", se algum pode expressar-se assim, e, como a miúdo temos dito com outros motivos, o erro mais grosseiro está longe de ser sempre o mais perigoso.

Somente diremos, para terminar logo com a confusão, que tais conceitos não se adaptam nem sequer a essa primeira parte da iniciação, que a antigüidade designava sobre o nome de "pequenos mistérios"; estes, como mais adiante explicaremos, concernem à individualidade humana, porém no desenvolvimento integral de suas possibilidades, logo mais além do domínio corporal, cuja atividade se exerce no domínio que é comum a todos os homens.

Não vemos realmente qual poderia ser o valor ou inclusive a razão de ser uma pretendida iniciação que se limitara a repetir, incobrindo-se debaixo de uma forma mais ou menos enigmática, o que tem de mais banal na educação profana, o que vulgarmente está "ao alcance de todo o mundo profano".

Por outra parte, não pretendemos em absoluto negar com isso que o conhecimento iniciático possa ter aplicações na ordem social, tanto como em qualquer outra ordem; porém esta é uma outra questão: em primeiro lugar, estas aplicações contingentes não constroem de nenhuma maneira o objetivo da iniciação, igual o que as ciências tradicionais secundárias não constituem a essência de uma tradição; seguidamente, estas têm em si mesmas um caráter totalmente diferente daquele que estamos falando, pois partem de princípios que não tem nada haver com os preceitos da "moral " corrente, sobre tudo quando se trata da muito famosa "moral laica" tão querida de nossos contemporâneos, e, ademais procedem de vias inexeqüíveis para os profanos, em virtude da natureza mesma das coisas; logo estão demasiado distante do que alguém chamou um dia, com estas mesmas palavras, "a preocupação por viver convenientemente". No entanto se limita a "moralizar" sobre os símbolos, com intenções tão louváveis como se queira, não se realizará certamente a obra da iniciação: porém voltaremos sobre ele mais adiante, quando falaremos mais particularmente do ensino iniciático.

Os erros mais sutis, e por conseguinte mais temíveis, se produzem às vezes quando se fala, a propósito da iniciação, de uma "comunicação" com os estados superiores ou dos "mundos espirituais", e, antes de tudo, se dá demasiada, constantemente, a ilusão que consiste em tomar por "superior" o que realmente não é, senão que simplesmente aparece como o mais extraordinário o "anormal". Nos restaria em suma repetir aqui tudo o que já temos dito em outra parte, acerca da confusão entre o psíquico e o espiritual (16), pois é mais freqüentemente cometido nesse aspecto; os estados psíquicos não possuem, de fato, nada de "superior" nem de "transcendente", já que unicamente formam parte do estado individual humano (17); e, quando falamos de estados superiores do ser, sem nenhum abuso de linguagem, entendemos por ele exclusivamente os estados supraindividuais.

Alguns levam inclusive mais longe a confusão e fazem do "espiritual" mais ou menos um sinônimo de "invisível", é dizer, tomam por tal, indistintamente, todo o que não ocorre sob os sentidos ordinários e "normais"; temos visto qualificar assim até ao mundo "etérico", é dizer, simplesmente a parte menos grosseira do mundo corporal.

Nestas condições, é temeroso que a "comunicação" de que se trata se reduza em definitivo a "clarividência", a "clariaudiência", ou ao exercício de qualquer outra faculdade psíquica do mesmo gênero e não menos significante, inclusive ainda quando seja real.

É isto que ocorre sempre de fato, e, no fundo, todas as escolas pseudoiniciática do Ocidente moderno desembocam aqui; alguns tomam inclusive expressamente por objetivo "o desenvolvimento dos poderes psíquicos latentes no homem"; deveremos todavia voltar, mais adiante, sobre esta questão de pretensos "poderes psíquicos" e das ilusões as quais dão lugar.

Porém isto não é tudo: admitamos que, no pensamento de alguns, se trata verdadeiramente de uma comunicação com os estados superiores; ele estará todavia longe de ser suficiente para caracterizar a iniciação.

Com efeito, uma comunicação semelhante é estabelecida também pelos ritos religiosos; não deve esquecer-se que, igualmente neste caso, as influências espirituais, e não simplesmente psíquicas, entram realmente em jogo, ainda que para fins totalmente diferentes aos relacionados com o domínio iniciático.

A intervenção de um elemento "não humano" pode definir, de maneira geral, a tudo o que é autenticamente tradicional; porém a presença desse caráter comum não é razão suficiente para não estabelecer as necessárias diferenças, e em particular para confundir o domínio religioso com o domínio iniciático, ou para ver entre eles todos a mais uma simples diferença de grau, quando realmente tem uma diferença de natureza, e inclusive, poderíamos dizer, de natureza profunda.

Esta confusão é também muito freqüente, sobretudo entre aqueles que pretendem estudar a iniciação "a partir de fora", com intenções que podem ser por outra parte muito diversas; também é indispensável denuncia-la formalmente: o esoterismo é essencialmente algo diferente de religião, e não a porção "interior" de uma religião como tal, inclusive quando toma sua base e seu ponto de apoio nesta, como ocorre em certas formas tradicionais, no Islamismo, por exemplo (18); e a iniciação é uma espécie de religião especial reservada a uma minoria, como parece imaginar-se, por exemplo, os que falam dos mistérios antigos qualificando-os de "religiosos (19).

Não é possível se desenvolver aqui todas as diferenças que separam os domínios religiosos e iniciático, pois, ainda mais que quando se tratava somente do domínio místico, que não é senão uma parte do primeiro, ele nos levaria com segurança demasiado longe; porém bastará, para o que pretendemos agora, precisar que a religião considera o ser unicamente no estado individual humano e não aspira em absoluto a fazer sair dele, senão pelo contrário a assegurar-lhe as condições mais favoráveis nesse mesmo estado(20), enquanto que a iniciação tem essencialmente como objetivo superar as possibilidades deste estado e tornar efetivamente possível passar aos estados superiores, e inclusive, finalmente, conduzir o ser mais além de todo o estado condicionado, seja qual seja.

Resulta disso que, no que concerne a iniciação, a simples comunicação com os estados superiores não pode ser considerada como um fim, senão unicamente como um ponto de partida; se esta comunicação deve ser estabelecida principalmente pela ação de uma influência espiritual, é para permitir seguidamente uma tomada de posição efetiva desses estados, e não simplesmente, como na ordem religiosa, para fazer descer sobre o ser uma "graça" envolva de certa maneira, porém sem penetrar neles.

Para expressar isto de forma quem sabe mais facilmente compreensível, diremos que, se por exemplo, qualquer um pode entrar em contato com os anjos, sem deixar por isto de estar confinado na condição de indivíduo humano, não estará por isto mais adiantado sob o ponto de vista iniciático (21); não se trata aqui de comunicar com outros seres que estão em um estado "angélico", senão de alcançar e realizar em si mesmo um tal estado supra-individual, não, hipoteticamente, enquanto que indivíduo humano, o que evidentemente seria absurdo, senão enquanto que o ser humano que manifesta como indivíduo humano em certo estado tem também nas possibilidades de todos os demais estados.

Toda realização iniciática é então essencial e puramente "interior", ao contrário dessa "saída de si" que constitui o "extasies" no sentido próprio e etimológico da palavra (22); isto é, não a única diferença, por certo, senão ao menos uma das grandes diferenças que existe entre os estados místicos, os quais pertencem por completo ao domínio religioso, e aos estados iniciático.

É a isto, efetivamente, a que devemos retornar sempre em definitivo, pois a confusão do ponto de vista iniciático com o ponto de vista místico, da qual temos feito ressaltar desde o princípio seu caráter particularmente insidioso, está naturalmente dirigido a enganar aos espíritos que não se deixariam apanhar com as deformações mais grosseiras das pseudoiniciações modernas, e que inclusive poderiam, quem sabe, chegar sem demasiada dificuldade, a compreender o que verdadeiramente é a iniciação, se não tropeçarem em seu caminho com erros sutis que parecem ser colocados expressamente para desviar-lhes de tal compreensão.

Notas
15. Este ponto de vista é especialmente o da maioria dos maçons atuais, e, ao mesmo tempo, se encontra também sobre o mesmo terreno exclusivamente "social" em que se situam a maior parte de quem os combatem, o que prova que as organizações iniciáticas não dão pretexto aos ataques do exterior, senão na medida de sua própria degeneração.
16. Ver Le Règne de la Quantitè et les Signes des Temps, cap. XXXV.
17. Segundo a representação geométrica que temos exposto no Le Simbolisme de la Croix, estas modalidades de um mesmo estado são simples extensões desenvolvendo-se no sentido horizontal, é dizer, em um mesmo nível, e não no sentido vertical, segundo o qual se diferencia a hierarquia dos estados superiores e inferiores do ser.
18. É conveniente, para evitar todo equívoco, assinalar que se deve dizer "esoterismo islâmico" ou esoterismo cristão", e não, como fazem alguns, "Islamismo esotérico" ou Cristianismo esotérico"; é fácil compreender que há aqui algo mais que um matiz.
19. Sabe-se que a expressão "religião de mistérios" é uma das que constantemente reaparecem na especial terminologia adotada pelos "historiadores das religiões".
20. Supostamente, se trata aqui do estado humano considerado em sua integridade, compreendendo a extensão indefinida de suas prolongações extracorporais.
21. Pode-se ver com isto quanto se enganam os que, por exemplo, queiram atribuir um valor propriamente iniciático a escritos como os de Swedemborg.
22. Não é exagero dizer, por outra parte, que esta "saída de si" não tem em si mesma absolutamente nada em comum com a pretendida "saída astral" que joga tão grande papel nas insinuações ocultistas.