Doutrina
da Nova Jerusalém
sobre o Senhor
Emanuel Swedenborg
Amsterdã
1763
continuação
"O Senhor cumpriu todas as coisas da Lei" quer dizer que Ele cumpriu
toda a Palavra
8. Muitos hoje acreditam que, onde se diz do Senhor que Ele cumpriu a Lei,
se entende que Ele cumpriu todos os preceitos do Decálogo, e que,
assim, Se fez justiça e também justificou os homens do mundo
por essa fé. Entretanto, não é isso que se entende,
mas que Ele cumpriu todas as coisas que foram escritas a Seu respeito na
Lei nos Profetas, isto é, em toda a Escritura Santa, porque ela trata
somente dEle, como foi dito no capítulo acima. A razão por
que muitos hoje crêem diferentemente tem como causa o fato de não
terem examinado as Escrituras e não terem visto o que ali se entende
pela "Lei". Ali, pela "Lei" se entende, no sentido restrito,
os dez preceitos do Decálogo; num sentido mais amplo, todas as coisas
que foram escrita por Moisés em seus cinco livros; e num sentido
amplíssimo, toda a Palavra. Que pela "Lei" num sentido
restrito sejam entendidos os Dez preceitos do Decálogo, isto é
sabido.
9. Que pela "Lei" num sentido mais amplo sejam entendidas todas
as coisas que foram escrita por Moisés em seus cinco livros, vê-se
pelas seguintes passagens. Em Lucas:
Abrahão disse ao rico no inferno:
"Eles têm Moisés e os Profetas, ouçam-nos... Se
não ouvem a Moisés e aos Profetas, não serão
persuadidos, ainda que algum dos mortos ressurja" (16:29, 31).
Em João, Filipe disse a Natanael:
"Achamos aquele de quem Moisés escreveu na Lei, e nos Profetas"
(1:46).
Em Mateus:
"Não julgueis que Eu tenha vindo para anular a Lei e o Profeta;
não vim para anular, mas para cumprir" (5:17).
No mesmo:
"Todos os Profetas e a Lei profetizaram até João"
(11;13).
Em Lucas:
"A Lei e os Profetas [duraram] até João; a partir de
agora o reino de Deus é anunciado" (16:16).
Em Mateus:
"Todas as coisas que quereis que os homens vos façam, fazei-lhes
vós também; esta... é a Lei e os Profetas" (7:12).
No mesmo:
"Jesus... disse: Amarás o Senhor teu Deus de todo o teu coração,
e em toda a tua alma... e amarás o teu próximo como a ti mesmo.
Destes dois mandamentos dependem a Lei e os Profetas" (22:37, 39, 40).
Nesses lugares, por "Moisés e Profetas", e também
por "Lei e Profetas" são entendias todas as coisas que
foram escritas nos livros de Moisés e nos livros dos Profetas. Que
pela "Lei" em particular se entendam todas as coisas que foram
escritas por Moisés, é evidente ainda por isto, em Lucas:
"Completaram-se os dias da purificação conforme a Lei
de Moisés; trouxeram" Jesus "a Jerusalém, para O
apresentarem ao Senhor, como está escrito na Lei do Senhor, que todo
macho que abre o útero seja chamado santo ao Senhor, e para darem
em sacrifício conforme foi dito na Lei do Senhor, um par de rolinhas,
e dois filhotes de pombas. ... E os pais levaram... Jesus ao templo, para
fazerem por Ele conforme o costume da Lei. ... Quando cumpriam todas as
coisas conforme a Lei do Senhor"... (2:22-24, 27, 39).
Em João:
"Na Lei... Moisés... ordenou apedrejar tais" (8:5).
No mesmo:
"A Lei foi dada por Moisés" (1:7).
Daí é evidente que ora se diz "Lei", ora "Moisés",
onde se trata das coisas que são escritas em seus livros. (Como também
em Mat. 8:4; Mc. 10:2-4; 12:19; Luc. 20:28, 37; Jo. 3:14; 7:19, 51; 8:17;
19:7). Muitas coisas que foram mandadas por Moisés são também
chamadas "Lei", como o que se disse sobre os holocaustos (Lev.
6:9; 7:37), os sacrifícios (Lev. 6:25; 7:1-11), as ofertas de manjares
(Lev. 6:14), a lepra (Lev. 14:2), o ciúme (Núm. 5:29, 30)
e do nazireado (Núm. 6:13, 21). E Moisés mesmo chama os seus
livros "a Lei":
"Escreveu... Moisés esta Lei, e a deu aos sacerdotes, filhos
de Levi, os que carregavam a arca da aliança de JEHOVAH", e
disse-lhes: "Recebendo o Livro desta Lei, depositai-o ao lado da arca
da aliança de JEHOVAH" (Deut. 31:9, 11, 26).
Foi depositado do lado da arca, porque dentro da arca estavam as tábuas
de pedra, que, no sentido restrito, são a Lei. Os livros de Moisés
são depois chamados "Livro da Lei":
"Disse Hilquias, o sumo sacerdote, a Shafan, o escriba: Achei o Livro
da Lei na casa de JEHOVAH. ...Quando o Rei ouviu as palavras do Livro da
Lei, rasgou as suas vestes" (II Re. 22:8).
10. Que pela "Lei", no sentido mais amplo, se entenda toda a Palavra,
pode-se ver por estas passagens:
Jesus disse: "Porventura não está escrito em vossa Lei:
Eu disse: Sois deuses?" (Jo. 10:34);
isto está escrito no Salmo 82:6.
"A multidão respondeu... Nós ouvimos da Lei que o Cristo
permanecerá para sempre" (Jo. 12:34);
isto está escrito nos Salmos 89:29; 110:4; e em Daniel 7:11, 14.
"Para que se cumprisse a palavra escrita na Lei deles: Tiveram ódio
de Mim sem causa" (Jo. 15:25);
isto está escrito no Salmo 25:19.
Disseram os fariseus: "Acaso algum dos principais creu n'Ele? Mas essa
multidão, que não sabe a Lei [é maldita]" (Jo.
7:48, 49).
"É mais fácil... passar o céu e a terra, do que
cair um til da Lei" (Luc. 16:7).
Pela "Lei", aqui, entende-se toda a Sagrada Escritura.
11. Que "o Senhor cumpriu toda a Lei" queira dizer que Ele cumpriu
toda a Palavra, é evidente pelas passagens onde se diz que por Ele
a Escritura foi cumprida, e que todas as coisas foram consumadas, como por
estas:
Jesus "entrou... na sinagoga, e levantou[-Se] para ler. Então
Lhe trouxeram o livro do profeta Isaías; e desenrolou o livro, e
achou a passagem... escrita: O Espírito do Senhor está sobre
Mim, pois que Me ungiu, enviou-Me para evangelizar os pobres, para curar
os contritos de coração, para anunciar a remissão dos
cativos, e a visão dos cegos, e para pregar o ano aceitável
do Senhor. Em seguida, enrolando o livro... e disse: Hoje se cumpriu esta
Escritura em vossos ouvidos" (Luc. 4:16-21).
"Examinai as Escrituras... e elas testificam de Mim" (Jo. 5:39).
"Para que se cumprisse a Escritura: O que comeu pão comigo levantou
sobre Mim o calcanhar" (Jo. 13:8).
"Nenhum deles se perdeu, a não ser o filho da perdição,
para que se cumprisse a Escritura" (Jo. 17:12).
"Para que se cumprisse a Palavra, que disse: Dos que Me deste, não
perdi deles nenhum" (Jo. 18:9).
"Disse Jesus" a Pedro: "Esconde a tua espada no lugar...;
como então se cumpririam as Escrituras, que assim convém que
se faça?... Isto... tudo aconteceu para se cumprissem as Escrituras
dos profetas" (Mat. 26:52, 54, 56).
"O Filho do homem vai, como está escrito sobre Ele... para que
se cumpram as Escrituras" (Mc. 14:21, 49).
"Assim se cumpriu a Escritura, que disse... Com os ímpios foi
contado" (Mc. 15:28; Luc. 22:37).
"Para que a Escritura se cumprisse... Dividiram consigo Minha vestimenta,
e sobre Minha túnica lançaram sorte" (Jo. 19:24).
"Depois disso, sabendo Jesus que todas as coisas já estavam
consumadas, para que se cumprisse a Escritura..." (Jo. 19:28).
"Quando... tomou o vinagre, Jesus disse: Está consumado"
isto é, cumprido. (Jo. 19:30).
"Estas coisas aconteceram para que se cumprisse a Escritura: Um osso
d'Ele não quebrareis. E, de novo, outra Escritura disse: Verão
a Quem traspassaram" (Jo. 19:36, 37).
Além de outros lugares, onde são citadas passagens dos Profetas
e não se diz ao mesmo tempo que a Lei ou a Escritura fosse cumprida.
Que toda a Palavra tenha sido escrita a respeito d'Ele, e que tivesse vindo
ao mundo para a cumprir, foi o que Ele ensinou também aos discípulos,
antes que Se fosse, por estas palavras:
Jesus disse aos discípulos: "Néscios e tardos de coração
para crer em todas as coisas que foram faladas pelos profetas. Porventura
não convinha que o Cristo sofresse isso, e entrasse na glória?
E começando por Moisés e por todos os Profetas, interpretou
para eles todas as Escrituras a Seu respeito" (Luc. 24:25-27).
E, adiante:
Jesus disse aos discípulos: "Estas são as palavras que
falei a vós, quando ainda estava convosco, que convinha cumprir todas
as coisas que foram escritas na Lei de Moisés e nos Profetas e Salmos
sobre Mim" (Luc. 24:44, 45).
Que o Senhor
tenha cumprido no mundo todas as coisas da Palavra, até as mais singulares
dali, vê-se por essas Suas palavras:
"Amém vos digo, ainda que o céu e a terra passem, nem
um iota ou um til passará da Lei, até que todas as coisas
aconteçam" (Mat. 5:18).
Por aí se pode ver claramente agora que por essa expressão,
que o Senhor cumpriu todas as coisas da Lei, não se entende que Ele
cumpriu todos os preceitos do Decálogo, mas todas as coisas da Palavra.
O Senhor veio ao mundo para subjugar os infernos e glorificar o Humano,
e a paixão da cruz foi o último combate, pelo qual venceu
plenamente os infernos e plenamente glorificou Seu Humano.
12. Sabe-se na Igreja que o Senhor venceu a morte, pela qual se entende
o inferno, e que depois subiu ao céu em glória. Mas ainda
não se sabe o Senhor, por meio dos combates, que são tentações,
venceu a morte ou inferno e, ao mesmo tempo, por esse meio, glorificou o
Seu Humano, e que a paixão da cruz foi o último combate ou
tentação, pela qual venceu e glorificou [o Humano]. A esse
respeito se trata muitas vezes nos Profetas e em David [Salmos], mas não
tantas vezes nos Evangelhos. Nesses, as tentações que suportou
desde a infância são descritas, em sumário, pelas Suas
tentações no deserto e, depois, as que vieram do diabo; por
último, pelas que passou no Gethsemani e na cruz. Sobre as tentações
no deserto e, depois, pelo diabo, veja-se em Mat. 4:1-11; Mc. 1:12, 13;
e Luc. 4:1-13. Por essas, porém, se entendem todas as outras, até
às últimas. Sobre isso, Ele não revelou muitas coisas
aos discípulos, porque foi dito em Isaías:
"Suportou o degredo... todavia não abriu a Sua boca; como cordeiro
para a matança... e como a ovelha diante dos seus tosquiadores, emudeceu,
e não abriu a Sua boca" (53:7).
Sobre Suas tentações no Gethsemani, veja-se em Mat. 26:36-44;
Mc. 14:32-42; e Luc. 22:39-46. E sobre as tentações na cruz,
em Mat. 27:33-50; Mc. 15:22-37; Luc. 23:33-49; e Jo. 19:17-34. As tentações
não são outra coisa senão o combate contra os infernos.
Sobre as tentações ou combates do Senhor, veja-se a obra Nova
Jerusalém e Sua Doutrina Celeste, editada em Londres, n. 201 e 302.
E sobre as tentações em geral, n. 187-200 naquele livro.
13. Que o Senhor, pela paixão na cruz, tenha vencido plenamente os
infernos, Ele o ensina em João:
"Agora é o juízo deste mundo; agora o príncipe
deste mundo será lançado fora" (12:31);
essas palavras o Senhor falou quando ia sofrer a paixão da cruz.
No mesmo:
"O príncipe deste mundo está julgado" (16:11).
No mesmo:
"Confiai. Eu venci o mundo" (16:33).
E em Lucas:
"Disse Jesus: Vi Satanás como caindo do céu como raio"
(10:18).
Por "mundo", "príncipe do mundo", "Satanás"
e "diabo" se entende o inferno. Que o Senhor, pela paixão
da cruz, também tenha glorificado plenamente o Seu Humano, Ele o
ensina em João:
"Depois que" Judas "saiu, disse Jesus: Agora é glorificado
o Filho do homem, e Deus é glorificado n'Ele. Se Deus é glorificado
nEle, também Deus O glorificará em Si mesmo, e logo O glorificará"
(13:31, 32).
No mesmo:
"Pai, chegou a hora. Glorifica o Teu Filho, para que também
o Filho glorifique a Ti" (17:1).
No mesmo:
"Agora Minha alma está turbada", e disse: "Pai, glorifica
o Teu nome; e saiu uma voz do céu: E glorifiquei, e de novo glorificarei"
(12:27-28).
Em Lucas:
"Não convinha que o Cristo sofresse isso, e entrasse na Sua
glória" (24:26).
Estas coisas foram ditas a respeito da paixão. A glorificação
é a união do Divino com o Humano, pelo que foi dito: "E
Deus O glorificará em Si mesmo".
14. O Senhor veio ao mundo para repor na ordem todas as coisas nos céus
e, daí, nas terras, e fez isto por meio de lutas contra os infernos,
que então infestavam todo homem que nascia no mundo e saía
do mundo. Por esse ato Ele Se fez Justiça e salvou os homens, os
quais, sem isso, não poderiam ser salvos. Isto foi predito em muitas
passagens nos Profetas, das quais serão trazidas algumas.
[2] Em Isaías:
"Quem é Este que vem de Edom, de Bozra com as vestes salpicadas?
Este, honroso em Sua vestimenta, que avança na multidão de
Sua força? Eu, que falo em justiça, grande para salvar. Por
isso estás vermelho quanto às Tuas vestes, e Tuas vestes como
as do que pisa no lagar. Sozinho Eu pisei no lagar, e, do povo, nenhum varão
comigo. Por causa disso pisei-os na Minha ira, e os espezinhei na Minha
inflamação. Donde a vitória sobre eles espargiu as
Minhas vestes... Porque o dia da vingança está em Meu coração,
e o ano dos Meus redimidos chegou. Meu braço Me trouxe salvação;
fiz descer em terra a vitória dolos. Disse: Eis, eles são
Meu povo, filhos... Assim Se fez Salvador para eles. ... Por Seu amor e
por Sua clemência Ele os redimiu" (Isa. 63:1-9).
Essas palavras tratam dos combates do Senhor contra os infernos. Pela "veste"
que era vermelha e na qual estava honroso se entende a Palavra, à
qual o povo judeu fez violência. O combate mesmo contra os infernos,
e a vitória sobre eles, se descreve por esta expressão: "que
os pisou na Sua ira, e os espezinhou na Sua inflamação".
Que o Senhor tenha combatido sozinho, por Seu próprio poder, descreve-se
por estas palavras: "Do povo, nenhum varão comigo; Meu braço
Me trouxe a salvação; fiz descer à terra a vitória
sobre eles". Que, por esse meio, Ele os tenha salvado e redimido, descreve-se
por estas palavras: "Assim tornou-Se para eles Salvador. Por Seu amor
e por sua clemência Ele os redimiu". Que esta tenha sido a causa
do Seu advento, descreve-se por estas palavras: "O dia da vingança
está em meu coração e o ano dos Meus redimidos chegou".
[3] Em Isaías:
"Viu que ninguém havia, e admirou[-Se] de que não houvesse
quem intercedesse, pelo que Seu braço Lhe trouxe salvação,
e a Sua justiça O ergueu; assim vestiu a justiça como couraça,
e o capacete da salvação sobre a Sua cabeça, e vestiu
as vestes da vingança, e como manto teceu [para] Si o zelo; ... então
veio a Sião o Redentor" (59:16, 17, 20).
Estas palavras também tratam dos combates do Senhor contra os infernos,
quando estava no mundo. Que, por Seu próprio poder, tenha combatido
contra eles, entende-se por estas palavras: "Viu que ninguém
havia, pelo que Seu braço Lhe trouxe salvação".
Que, assim, Se tenha feito justiça, por estas: "Sua justiça
O ergueu; assim vestiu a justiça como couraça". Que dessa
maneira os tenha redimido, por estas: "então veio a Sião
o Redentor".
[4] Em Jeremias:
"Eles ficaram consternados... os fortes deles foram contundidos...
em fuga fugiram, nem olharam para trás. ...Esse dia é para
o Senhor JEHOVAH Zebaoth dia de vingança, para fazer vingança
aos seus adversários, e para que a espada devore, e fique saciada"
(46:5, 10);
o combate do Senhor contra os infernos, e a vitória sobre eles, é
descrita aqui pelas expressões "ficaram consternados",
"os fortes dentre eles, contundidos, em fuga fugiram, e não
olharam para trás". Os "fortes deles" e os "adversários"
são os infernos, porque todos lá têm ódio ao
Senhor. Por causa disso, o Seu advento ao mundo é entendido por estas
palavras: "Esse dia é para o Senhor JEHOVAH Zebaoth dia de vingança,
para fazer vingança aos seus adversários".
[5] Em Jeremias:
"Caem os jovens nas praças, e todos os varões de guerra
serão cortados naquele dia" (49:26).
Em Joel:
"JEHOVAH proferiu uma palavra... perante Seu exército; ... Grande
dia de JEHOVAH, muito terrível. Quem o suportará?" (2:11).
Em Sofonias:
"No dia do sacrifício de JEHOVAH visitarei os príncipes,
e os filhos do rei, e todos os vestidos de trajes estrangeiros naquele dia,
dia de angústia... dia de trombeta e de clangor" (1:8, 15, 16).
Em Zacarias:
"JEHOVAH sairá, e combaterá contra as nações...
como o dia em que Ele combater no dia da batalha... Estarão os Seus
pés, naquele dia, sobre o Monte das Oliveiras, que está perante
as faces de Jerusalém. ... Então fugireis nos vales dos Meus
montes. ...Naquele dia não haverá luz e esplendor. ... JEHOVAH,
porém, será por Rei sobre toda a terra; naquele dia, JEHOVAH
será Um, e o Seu nome, Um" (14:3-6, 9).
Nessas passagens também se trata dos combates do Senhor. Por "Seu
dia" se entende o Seu advento; o "Monte das Oliveiras, que está
perante as faces de Jerusalém" era onde o Senhor costumava ficar
(Veja-se Mc. 13:3; 14:26; Luc. 21:37; 22:39; Jo. 8:1; e em outros lugares).
[6] Em David:
"Cercaram-Me cordas da morte... cordas do inferno Me cercaram, afrontaram-Me
laços da morte; ... por isso enviou dardos... e muitos raios, e os
perturbou. Perseguirei meus adversários, e os encerrarei, não
retornarei até que os tenha consumido... Feri-los-ei, para que não
possam se levantar. ... Cinges-Me de força para a guerra e darás...
os adversários em fuga esmiuçarei como pó diante das
faces do vento, como lama das praças os reduzirei" (Sal. 18:5,
14, 37-40, 42).
"Cordas" e "laços da morte" que cercaram e afrontaram
significam as tentações; visto que elas vêm do inferno,
são também chamadas "cordas do inferno". Essas frases
e as restantes em todo esse Salmo tratam dos combates e das vitórias
do Senhor, pelo que também se diz: "Pões-Me por cabeça
das nações; povos que Eu não conhecera Me servirão"
(vers. 44, 45).
[7] Em David:
"Cinge... tua espada sobre a coxa, ó Poderoso;... tuas flechas
agudas, os povos caem sob Ti, do coração dos adversários
do Rei. Teu trono ... para sempre e eternamente;... amas a justiça,
pelo que Deus Te ungiu" (Sal. 45:3, 5-7);
essas coisas também se referem aos combates contra os infernos e
à subjugação deles, pois em todo o salmo se trata do
Senhor, isto é, de Seus combates, de Sua glorificação
e da salvação dos fiéis por Ele. Em David:
"Um fogo irá diante d'Ele... inflamará os Seus adversários
em redor; ... a terra verá e temerá; os montes derreterão
como cera... diante do Senhor de toda a terra. Os céus anunciarão
a Sua justiça, e todos os povos verão a Sua glória"
(97:3-6).
Igualmente, nesse Salmo se trata do Senhor e de assuntos semelhantes.
[8] Em David:
"Dito de JEHOVAH ao meu Senhor: Assenta-Te à Minha direita,
até que ponha os Teus inimigos por escabelo dos teus pés;
...dominar no meio dos teus inimigos. ...O Senhor à Tua direita feriu
os reis no dia de Sua ira;... encheu de cadáveres, feriu o cabeça
sobre muita terra" (Salmo 110:1, 2, 5, 6).
Que essas palavras sejam pronunciadas a respeito do Senhor, é evidente
por Suas próprias palavras em Mat. 22:44; Mc. 12:36 e Luc. 20:42.
Por "sentar-se à mão direita" é significada
a Onipotência; pelos "inimigos" são significados
os infernos; pelos "reis", os que ali estão nas falsidades
do mal; "pô-los por escabelo", "feri-los no dia da
ira, encher de cadáveres", significa destruir o poder deles;
e por "ferir o cabeça sobre muita terra" significa destruí-los
a todos.
[9] Visto que
o Senhor, só, venceu os infernos, sem ajuda de anjo algum, por isso
é chamado: "Herói" e "Varão de guerras"
(Isa. 42:13); "Rei da glória", "JEHOVAH forte",
"Herói de guerra" (Salmo 24:8); "Forte de Jacob"
(Salmo 132:2); e, em muitas passagens, "JEHOVAH Zebaoth", isto
é, JEHOVAH dos exércitos da guerra. E o Seu advento é
também chamado "Dia terrível de JEHOVAH", "cruel",
"de indignação", "de inflamação",
"de ira", "de vingança", "de destruição",
"de guerra", "de clangor de trombetas", "de tumulto",
como se pode ver pelas passagens referidas acima.
[10] Visto
que o Juízo Final foi efetuado pelo Senhor, quando veio ao mundo,
por meio de combates contra os infernos, e pela subjugação
deles, por isso em muitas passagens se trata do juízo que Ele deveria
fazer, como em David:
JEHOVAH "veio para julgar a terra; julgará o mundo em justiça,
e os povos em verdade" (Salmo 96:13),
assim como em outros lugares. Essas citações vêm da
Palavra profética.
[11] Na Palavra
histórica, porém, coisas semelhantes foram representadas pelas
guerras dos filhos de Israel com várias nações, pois
que na Palavra, tanto na parte profética quanto na histórica,
tudo o que se acha escrito, foi escrito a respeito do Senhor; daí
é que a Palavra é Divina. Nos rituais da Igreja Israelita,
como nos holocaustos e sacrifícios, depois nos sabbath e nas suas
festas, e no sacerdócio de Arão e dos levitas, estão
contidos muitos arcanos da glorificação do Senhor; da mesma
forma nos livros restantes, em Moisés, que se chamam "leis",
"juízos" e "estatutos", o que também se
entende pelas palavras do Senhor aos discípulos:
Que "convinha a Ele cumprir todas as coisas que foram escritas a Seu
respeito na Lei de Moisés" (Luc. 24:44),
e também aos judeus:
Que "Moisés tinha escrito a respeito d'Ele" (Jo. 5:46).
[12] Por aí
se pode agora ver que o Senhor veio ao mundo para subjugar os infernos e
glorificar Seu Humano, e que a paixão da cruz foi o último
combate, pelo qual Ele venceu plenamente os infernos e plenamente glorificou
o Humano. Mas muitas coisas sobre esse assunto serão vistas na obra
seguinte, Da Escritura Santa, onde serão reunidas todas as passagens
da Palavra profética que tratam dos combates do Senhor contra os
infernos e das vitórias sobre eles, ou, o que é o mesmo, que
tratam do Juízo Final feito por Ele, quando estava no mundo. Depois
as que tratam da paixão e da glorificação de Seu Humano,
que são tantas que, se fossem referidas, encheriam páginas.
O Senhor, pela paixão da cruz, não tirou os pecados, mas os
portou
15. Há alguns dentro da Igreja que acreditam que o Senhor, pela paixão
da cruz, tirou os pecados e satisfez ao Pai e, assim, fez a redenção.
Alguns crêem, também, que, por terem fé no Senhor, Ele
levou em Si os seus pecados, carregou-os como se tivesse lançado
num profundo mar, isto é, no inferno. Confirmam isso por essas palavras
de Jesus em João:
"Eis o Cordeiro de Deus que carrega os pecados do mundo" (Jo.
1:29),
e pelas palavras do Senhor em Isaías:
"Ele levou as nossas doenças, e nossas dores portou; ... ferido
por nossas prevaricações, traspassado por nossas iniqüidades,
o castigo de nossa paz [estava] sobre Ele... por Suas feridas nos deu a
sanidade. ... JEHOVAH fez lançar sobre Ele as iniqüidades de
todos nós. O desterro suportou, e foi afligido, todavia, não
abriu a Sua boca; como cordeiro para a matança foi levado... da terra
dos viventes por causa da prevaricação do Meu povo, a praga
deles; para dar os ímpios por Seu sepulcro, e os ricos em Sua morte;
... do trabalho de Sua alma viverá, e ficará saciado. Por
sua ciência justificará a muitos, pois que em Si portou a iniqüidade
deles... Esvaziou até à morte a Sua alma, e com os prevaricadores
foi contado, e o pecado de muitos tirou, e pelos prevaricadores intercedeu"
(53:4-12).
Estas palavras foram ditas a respeito das tentações do Senhor
e de Sua paixão. E por "tirar os pecados e as enfermidades",
como também por "fazer lançar sobre Ele a iniqüidade
de todos" se entende o mesmo que "portar as dores e as iniqüidades".
[2] Assim, pois, dir-se-á em primeiro lugar o que se entende por
"portar as iniqüidades" e, em seguida, o que se entende por
"tirá-las". Por "portar as iniqüidades"
não se entende outra coisa senão suportar graves tentações,
assim, sofrer como os judeus fizeram com Ele da maneira que tinham feito
com a Palavra, pois o trataram semelhantemente, porque Ele era a Palavra.
Com efeito, a Igreja que então havia com os judeus tinha sido inteiramente
devastada. E foi devastada pelo fato de terem pervertido toda a Palavra,
até o ponto de não haver nenhum resíduo do vero. Por
esse motivo não reconheceram o Senhor. Fez-se de modo semelhantemente
com os profetas, que representavam para eles o Senhor quanto à Palavra
e, daí, quanto à Igreja, e o Senhor foi o Profeta mesmo.
[3] Que o Senhor tenha sido o Profeta mesmo, pode-se ver por estas passagens:
"Jesus disse... Um profeta não é menos honrado do que
aquele em sua pátria, e em sua casa" (Mt. 13:57; Mc. 6:4; Luc.
4:24);
Jesus disse: "Não convém ao profeta perecer fora de Jerusalém"
(Luc. 13:33);
Disseram sobre Jesus: "Ele é o profeta de Nazareth" (Mat.
21:11; Jo. 7:40).
"Apoderou de todos o temor, louvando a Deus e dizendo que um grande
profeta foi levantado entre" eles" (Luc. 7:16) .
Que um profeta "sairia do meio dos irmãos, cujas palavras obedecessem"
(Deut. 18:15-19).
Que tenha sucedido o mesmo com os profetas, vê-se pelas citações
que agora se seguem. Foi ordenado ao profeta Isaías, para que representasse
o estado da Igreja,
Que desprendesse o cilício de sobre seus ombros, e tirasse o calçado
de seu pé, e fosse nu e descalço por três anos, por
sinal e por prodígio (Isa. 20:2-3).
[4] Foi ordenado ao profeta Jeremias, para que representasse o estado da
igreja,
Que conseguisse para si um cinto, e o pusesse sobre seus lombos, que não
passasse pela água, e o escondesse numa fenda da rocha junto ao Eufrates;
que, depois de dias o achasse apodrecido (Jer. 13:1-7).
O mesmo profeta representou o estado da Igreja por isto,
Que não tomasse para si esposa naquele lugar, nem entrasse em casa
de luto, nem saísse a lamentar, nem entrasse em casa de banquete
(Jer. 16:2, 5, 8).
[5] Foi ordenado ao profeta Ezequiel, para que representasse o estado da
Igreja,
Que fizesse passar uma navalha de tosquiadores sobre sua cabeça,
e sobre sua barba, e depois a dividisse, e queimasse terça parte
dela no meio da cidade, terça [parte] ferisse com espada, terça
[parte] espalhasse ao vento, e um pouco deles atasse na roupa e, finalmente,
o lançasse no meio do fogo e o queimasse (Ezeq. 5:1-4).
Ao mesmo profeta, para que representasse o estado da Igreja, foi ordenado
Que fizesse vasos de migração, e migrasse para outro lugar,
aos olhos dos filhos de Israel, e tirasse os vasos durante o dia, e saísse
à tarde por uma abertura na parte, e cobrisse as faces para que não
visse a terra; e que, assim, fosse um prodígio para a casa de Israel;
e que o profeta dissesse: "Eis, sou um prodígio para vós;
da maneira como fiz, assim lhes fará" (Ezeq. 12:3-7, 11).
[6] Ao profeta Oséias, para que representasse o estado da Igreja,
foi ordenado
Que tomasse para si uma meretriz por esposa; e que também a recebesse,
e ela parisse para ele três filhos, dos quais um se chamou "Jisreel",
o outro "Não digno de compaixão", e o terceiro "Não
[Meu] povo" (Oséias 1:2, 9).
E, de novo, foi-lhe ordenado
Que fosse e amasse uma mulher amada de um amigo e adúltera, a qual
também comprou para si por quinze [peças] de prata (Oséias
3:1, 2).
[7] Ao profeta Ezequiel, para que representasse o estado da Igreja, foi
ordenado
Que tomasse um tijolo e gravasse sobre ele "Jerusalém",
e fizesse cerco, e fizesse uma trincheira e um amontoado contra ela; pusesse
uma panela de ferro entre si e a cidade, e se deitasse sobre o lado esquerdo,
e depois sobre o direito, trezentos e noventa dias. Depois tomasse trigo,
cevada, lentilha, milho e espelta, e com esses fizesse pão para si,
o qual comeria conforme a medida. E, também, que fizesse para si
um bolo de cevada com esterco de fezes de homem; e como ele suplicou, foi
ordenado que o fizesse com excremento de boi (Ezeq. 4:1-15).
Além disso, os profetas também representaram outras coisas,
como Zedequias, pelos chifres de ferro que fez para si (I Re. 22:11), e
outro profeta, por ser ferido e cortado, e ter posto cinza sobre os olhos
(I Re. 20:35, 38).
[8] Em geral, os profetas, ao usarem uma túnica de pele, representavam
a Palavra em seu sentido último, que é o sentido da letra
(Zac. 13:4). Por isso Elias se vestia de uma tal túnica, e cingia-se
de um cinto de couro em volta dos lombos (2 Re. 1:8). João Batista,
semelhantemente, tinha vestes de pelo de camelo, e um cinto de couro em
volta de seus lombos, e comia gafanhoto e mel agreste (Mat. 3:4). Por aí
se pode ver que os profetas representaram o estado da Igreja e da Palavra.
Com efeito, o que representa um, representa também o outro, pois
a Igreja provém da Palavra, e segundo sua recepção
de vida e fé. Por isso, também, pelos "profetas",
onde são nomeados em e outro Testamentos, é significada a
doutrina da Igreja proveniente da Palavra, mas pelo Senhor, como o Maior
Profeta, é significada a Igreja mesma e a Palavra mesma.
16. Sendo representado nos profetas, o estado da Igreja proveniente da Palavra
era o que se entende por "portar as iniqüidades e os pecados do
povo". Que seja assim, é evidente pelas coisas que são
referidas sobre o profeta Isaías: que ele fosse nu e descalço
por três anos, por sinal e prodígio (Isa. 20:3). E sobre o
profeta Ezequiel, que trouxesse os vasos da migração e cobrisse
as faces para que não visse a terra, e que, assim, fosse um prodígio
para a casa de Israel; e, também, que dissesse: "Eu sou um prodígio
para vós" (Eze. 12:6, 11).
[2] Que isto tenha sido, para eles, portar as iniqüidades, vê-se
claramente em Ezequiel, quando foi-lhe ordenado deitar-se trezentos e noventa
dias e quarenta dias sobre os lados esquerdo e direito contra Jerusalém,
e comer bolo de cevada feito com excremento de boi. Ali se lê também:
"Tu, deita-te sobre o teu lado esquerdo e sobre ele põe a iniqüidade
da casa de Israel; o número de dias que te deitarás sobre
ele portarás a iniqüidade deles. Eu, pois, darei a ti os anos
da iniqüidade deles conforme o número dos dias, trezentos e
noventa dias, para que portes a iniqüidade da casa de Israel. Mas,
no momento em que os tiveres completado, jazerás outra vez, sobre
o teu lado direito, para que portes a iniqüidade da casa de Judá
quarenta dias" (Eze. 4:4-6).
[3] O profeta, ao portar assim as iniqüidades da casa de Israel e da
casa de Judá, não as tirou nem, daí, as expiou, mas
somente as representou e mostrou. Isto é evidente pelo que se segue
ali:
"Assim diz JEHOVAH: Os filhos de Israel comerão seu pão
imundo, entre as nações para onde os expulsei. ... Eis que
Eu quebro o cetro do pão em Jerusalém... para que careçam
de pão e de água, e sejam desolados o varão e o seu
pai, e se definhem por causa da iniqüidade deles" (vers. 13, 16,
17).
[4] Semelhantemente, quando o mesmo profeta se mostrasse e dissesse,
"Eis que sou um prodígio para vós", também
diria: "Do mesmo modo que fiz, assim lhes fará" (12:6,
11).
E o mesmo se entende a respeito do Senhor, onde se diz:
"Nossas doenças Ele levou; ... nossas dores portou; ... JEHOVAH
fez lançar sobre Ele as iniqüidades de todos nós; ...
por Sua ciência justificou... a muitos, pois que em Si portou as iniqüidades
deles" (Isa. 53:4, 6, 11),
onde se trata, em todo o capítulo, da paixão do Senhor.
[5] Que Ele, como o Maior Profeta, tenha representado o estado da Igreja
quanto à Palavra, vê-se por cada uma das coisas da paixão
d'Ele, a saber, que foi traído por Judas; que foi preso e condenado
pelos principais dos sacerdotes e pelos anciãos; que Lhe deram bofetadas;
que Lhe feriram a cabeça com uma cana; que Lhe impuseram uma coroa
de espinhos; que dividiram Suas vestes e lançaram sorte sobre a túnica;
que O crucificaram; que Lhe deram vinagre para beber; que traspassaram-Lhe
o lado; que foi sepultado e, no terceiro dia, ressurgiu.
[6] Que "foi traído por Judas" significava ser traído
pela nação judaica, com quem então estava a Palavra,
pois Judas representava aquela nação. Que "foi preso
e condenado pelos principais dos sacerdotes e pelos anciãos"
significava que o fora por toda aquela Igreja. Que "foi açoitado,
cuspiram-Lhe na face, deram-Lhe bofetadas e feriram-Lhe a cabeça
com uma cana" significava que fizeram de semelhante modo com a Palavra
quanto às suas Divinas verdades, todas as quais tratam do Senhor;
que "Lhe impuseram uma coroa de espinhos" significava que a tinham
falsificado e adulterado"; que "dividiram Suas vestes, e sobre
a túnica lançaram sorte" significava que tinham dispersado
todos os veros da Palavra, mas não seu sentido espiritual; esse sentido
da Palavra era significado pela "túnica do Senhor". Que
"O crucificaram" significava que tinham destruído e profanado
toda a Palavra". Que "Lhe ofereceram vinagre para beber"
significava coisas meramente falsificadas e falsas, por isso não
o bebeu, e então disse: "Está consumado". Que "traspassaram-Lhe
o lado" significava que extinguiram completamente todo vero da Palavra
e todo seu bem; que "foi sepultado" significava a rejeição
do humano que restara da mãe; que "no terceiro dia ressurgiu"
significava a glorificação.
[7] Coisas semelhantes foram significadas por estas nos Profetas e em David,
onde foram preditas. Por causa disso, depois que foi açoitado e saiu
portando uma coroa de espinhos, e os soldados lhe puseram uma vestimenta
púrpura, foi dito: "Eis o Homem" (Jo. 19: 1, 5). Isto foi
dito porque "Homem" significa a Igreja. De fato, "Filho do
homem" significa a verdade da Igreja, assim a Palavra. Por aí
se pode ver agora o que se entende por "portar as iniqüidades",
isto é, representar e figurar em Si os pecados contra as Divinas
verdades da Palavra. Que o Senhor tenha suportado e sofrido tais coisas
como o Filho do homem e não como o Filho de Deus, ver-se-á
na seqüência. Com efeito, "Filho do homem" significa
o Senhor quanto à Palavra.
17. Dir-se-á agora alguma coisa sobre o que se entende por "levar
os pecados". Por "levar os pecados" se entende o mesmo que
redimir o homem e salvá-lo. Porque o Senhor veio ao mundo para que
o homem pudesse ser salvo. Sem Seu advento nenhum mortal poderia ser reformado
e regenerado, assim, ser salvo. Mas isso pôde ser feito depois que
o Senhor suprimiu todo o poder do diabo, isto é, do inferno, e glorificou
Seu Humano, isto é, uniu-O ao Divino de Seu Pai. Se essas coisas
não tivessem sido feitas, nenhum dos homens poderia receber coisa
alguma do Divino vero que fosse duradoura nele, e ainda menos coisa alguma
do Divino bem, pois o diabo, cujo poder antes era superior, as arrancaria
do coração.
[2] Daí é evidente que o Senhor, pela paixão da cruz,
não tirou os pecados, mas os afasta, isto é, remove naqueles
que crêem n'Ele, vivendo segundo os Seus preceitos, como o Senhor
também o ensina em Mateus:
"Não julgueis que vim para anular a Lei e os Profetas. ... Qualquer
que anular o menor desses preceitos, e assim ensinar aos homens, será
chamado menor no reino dos céus. Mas quem os pratica e ensina, esse
será chamado grande no reino dos céus" (5:17, 19).
[3] Pela razão só qualquer um pode ver, contanto que esteja
em alguma iluminação, que os pecados não podem ser
tirados do homem a não ser por penitência ativa, qual seja,
que o homem veja seus pecados, implore o auxílio do Senhor e desista
deles. Ver outra coisa, assim acreditar e ensinar não vem da Palavra,
tampouco vem da razão sã, mas da cobiça e da vontade
depravada, que são o proprium do homem, pelo que a inteligência
se torna estúpida.