COMO
DEUS PODE SER CONSIDERADO SEM A NATUREZA E A CRIATURA
por Jacob Böehme
Moisés disse: "O Senhor nosso Deus é senão um
único Deus". Em outra parte é dito: "Dele, por Ele
e Nele estão todas as coisas", e ainda: "Não sou
eu, homem, que preenche todas as coisas?" e mais, "Através
de sua Palavra todas as coisas são feitas"; contudo pode-se
dizer que Ele é a Origem de todas as coisas: Ele é a Eterna
Imensurável Unidade.
Por exemplo, quando penso o que poderia existir no lugar deste mundo se
os quatro Elementos, o estrelado Firmamento e a Natureza propriamente dita
pudessem perecer e deixassem de existir, e assim não mais se encontrasse
nenhuma Natureza ou Criatura, acredito que permaneceria esta Unidade eterna,
da qual a Natureza e a Criatura receberam sua Origem.
Da mesma forma, quando penso comigo mesmo o que existe a centenas de milhares
de milhas, acima do estrelado Firmamento, ou o que se encontra naquele lugar
onde não há Criaturas, acredito que a Eterna Imutável
Unidade esteja lá, Unidade que é somente o Bem, da qual não
há nada, nem antes, nem depois, da qual não se pode acrescentar
ou retirar nada, nem mesmo de onde esta unidade pudesse ter sua Origem:
Não há espaço, tempo ou superfície, mas somente
o Deus Eterno, ou aquele Único Bem, que um homem não pode
expressar.
Uma outra consideração: como este único Deus é
triplo?
A Santa Escritura mostra-nos que este único Deus é triplo,
isto é, uma única Essência tripla, tendo três
formas de atuação, e ainda sendo senão uma única
Essência, como pode ser visto na emanação do Poder e
Virtude, presentes em todas as coisas, mas especialmente representadas pelo
Fogo, Luz e Éter, que são três diferentes formas de
atuação, e ainda assim dentro de um único fundamento
e substância.
Assim como o Fogo a Luz e o Éter, surgem da vela (embora a vela não
seja nenhum dos três, mas a causa deles), da mesma forma a Unidade
Eterna é a causa e o fundamento da Trindade Eterna, que se manifesta
a partir da Unidade, e gera-se a si mesmo, Primeiro em Desejo ou Vontade,
Segundo em Prazer ou Satisfação, Terceiro em Ação
ou Expansão.
O Desejo ou a Vontade é o Pai, ou seja, o ativo, a manifestação
da unidade, é através dele que a própria unidade quer
ou deseja.
O Prazer ou a Satisfação, é o Filho que a Vontade quer
ou deseja, ou seja, seu Amor e Satisfação, como pode ser visto
no Batismo de Nosso Senhor Jesus Cristo, quando o Pai testemunhou dizendo:
"Tu és meu Filho bem-amado, eu hoje te gerei!".
A satisfação é a compressão na vontade, é
por esta compressão que a vontade da unidade se manifesta em um espaço
e atua; por seu meio a vontade atua e realiza e este é o sentimento
e a virtude da vontade.
A Vontade é o Pai, isto é, o desejo ativo, e a Satisfação
é o Filho, ou a virtude e a ação da vontade, é
através desta satisfação que a vontade atua; e o Espírito
Santo é o procedimento da vontade através da Satisfação
da virtude, ou seja, a vida da vontade, da virtude e da satisfação.
Deste modo, há três tipos de atuação na Unidade
Eterna a saber: a Unidade é a própria vontade e desejo; a
Satisfação é a substância atuante da vontade
e um Eterno êxtase de perceptibilidade na vontade; e o Espírito
Santo é o procedimento do Poder: a similitude que pode ser notada
numa planta.
A Atração; que é o Desejo Essencial da Natureza, ou
seja, a vontade do Desejo da Natureza, se comprime dentro de uma insígnia
ou substância, para se tornar uma planta; e esta compressão
do Desejo se transforma em sentimento ou atuação, onde surge
o Poder e a virtude, pelo qual o Magnético Desejo da Natureza, ou
a vontade fluída de Deus, atua de maneira natural.
Nesta perceptibilidade atuante, a vontade desejosa magnética é
elevada e extasiada saindo da Virtude e do Poder atuante; por esta razão
ocorre o crescimento e o aroma da planta: e assim, vemos uma representação
da Trindade de Deus em tudo o que cresce e vive.
Se não houvesse tal perceptibilidade do desejo e uma operação
emanada da Trindade na Eterna Unidade, esta seria nada além de um
eterno silêncio, um nada; não haveria natureza, nenhuma cor,
forma ou figura; da mesma forma não haveria nada neste mundo; sem
esta atuação tripla não haveria mundo em absoluto.