OS GRANDES SEGREDOS PRÁTICOS OU AS
REALIZAÇÕES DA CIÊNCIA
Eliphas Levi
Se quereis que eu acredite no que sabeis, mostrai-me o que fazeis.
Deus, para elevar o homem à emancipação moral, esconde-se
dele e de certo modo abandona-lhe o
governo do mundo. Deixa-se adivinhar pelas grandezas e harmonias da natureza,
a fim de que o
homem se aperfeiçoe progressivamente, sempre ampliando a idéia
que faz de seu autor.
O homem conhece Deus apenas pelos nomes que dá a esse Ser dos seres
e só o distingue pelas
imagens que dele tenta traçar. Assim, ele é de certo modo
o criador daquele que o criou. Acredita-se
o espelho de Deus e, ampliando indefinidamente sua própria miragem,
acredita poder esboçar no
espaço infinito a sombra daquele que é sem corpo, sem sombra
e sem espaço.
CRIAR DEUS, CRIAR-SE A SI PRÓPRIO, TORNAR-SE INDEPENDENTE, IMPASSÍVEL
E
IMORTAL: aí está com certeza um programa mais temerário
do que o sonho de Prometeu. Pois bem,
esse programa é paradoxal apenas na forma que empresta a uma falsa
e sacrílega interpretação. Num
sentido ele é perfeitamente razoável, e a ciência dos
adeptos promete realizá-lo e dar-lhe uma
perfeita execução.
O homem, com efeito, cria um Deus conforme à sua própria inteligência
e à sua própria bondade,
não pode elevar seu ideal mais alto do que lhe permite seu desenvolvimento
moral. O Deus que ele
adora é sempre seu próprio reflexo aumentado. Conceber o que
seja o absoluto em bondade e em
justiça é ser ele próprio muito justo e muito bom.
As qualidades do espírito, as qualidades morais são riquezas,
e as maiores de todas as riquezas. É
preciso adquiri-las pela luta e pelo trabalho. Objetar-nos-ão a desigualdade
das aptidões e as
crianças que nascem com uma organização mais perfeita.
Mas devemos crer que tais organizações
são o resultado de um trabalho mais avançado da natureza e
que as crianças delas dotadas
adquiriram-nas, senão por seus próprios esforços, ao
menos pelas obras solidárias dos seres
humanos a quem sua existência está ligada. É um segredo
da natureza, que nada faz ao acaso; a
propriedade das faculdades intelectuais mais desenvolvidas como a do dinheiro
e das terras constitui
um direito imprescritível de transmissão e de herança.
Sim, o homem é chamado a terminar a obra de seu Criador, e cada um
dos instantes por ele
empregados para tornar-se melhor ou perder-se é decisivo para toda
uma eternidade. É pela
conquista de uma inteligência para sempre reta e de uma vontade para
sempre justa que ele se torna
vivo para a vida eterna, pois que nada sobrevive à injustiça
e ao erro, a não ser a pena por sua
desordem. Compreender o bem é querê-lo, e, na ordem da justiça,
querer é fazer. Eis por que o
Evangelho nos diz que os homens serão julgados segundo suas obras.
Nossas obras tanto nos fazem o que somos, que, como já dissemos,
nosso corpo sofre modificação
com nossos hábitos e, algumas vezes, transformação
total de sua forma.
Uma forma conquistada ou suportada torna-se para toda a existência
uma providência ou uma
fatalidade. Essas figuras estranhas que os egípcios davam aos símbolos
humanos da divindade
representam as formas fatais. Tífon, por sua boca de crocodilo, está
condenado a devorar
incessantemente para encher seu ventre de hipopótamo. Assim, por
sua voracidade e sua fealdade, é
consagrado à destruição eterna.
O homem pode matar ou vivificar suas faculdades pela negligência ou
pelo abuso. Pode criar para si
faculdades novas pelo bom uso das que recebeu da natureza. Freqüentemente
se diz que as afeições
não podem ser comandadas, que a fé não é possível
a todos, que não se refaz o caráter, e todas essas
asserções são verdadeiras apenas para os preguiçosos
ou os perversos. Alguém pode se tornar crente,
piedoso, amante, devoto, quando sinceramente o quer. Pode-se dar a calma
da justeza ao espírito
como a onipotência da justiça à vontade. Pode-se reinar
no céu pela fé, e na terra pela ciência. O
homem que sabe comandar a si próprio é rei de toda a natureza.
Vamos mostrar, neste último livro, por que meios os verdadeiros iniciados
tornaram-se mestres de
vida comandando a dor e a morte; como operam em si mesmos e nos outros as
transformações de
Proteu; como exercem as adivinhações de Apolônio; como
fazem o ouro de Raimundo Lúlio e de
Flamel; como possuem, para renovar sua juventude, os segredos de Postel,
o Ressuscitado, e do
fabuloso Cagliostro. Vamos dizer, enfim, a última palavra da magia.