Os Arcanos Maiores do Tarô

G.O.Mebes

ARCANO I - ALEPH



LÂMINA I FUNDO: Turbilhões de cor azul-lilás, mais condensados na parte inferior. No primeiro plano, uma mesa em forma de cubo de brancura ofuscante, apresenta de frente uma de suas faces. Sobre essa mesa, no primeiro plano, uma moeda; logo atrás, uma espada, cujo cabo em forma de cruz, acha-se à direita. A lâmina da espada tem uma acanaladura pelo meio. Ainda na mesa, à direita, há um cálice de cristal com pé reto. Atrás do cubo acha-se uma figura masculina, de pé, materializada dos turbilhões do fundo. Ao redor da figura, como passagem para o fundo, uma aura luminosa. A parte inferior do corpo está oculta pela mesa, mais ou menos até os quadris. Acima da cabeça, uma radiação em branco e ouro forma o símbolo do infinito. A testa é cingida por uma fita de ouro. Dessa fita, e somente atrás, desce um tecido branco que cobre a nuca, mas deixando à mostra as orelhas. A parte visível do corpo está desnuda, apenas com um cinto de ouro e franjas brancas. O rosto e o talhe possuem as características dos sete planetas sem que haja predominância de qualquer um deles. O olhar dirige-se para a frente. O braço esquerdo do homem está levantado e empunha uma vara de nogueira, onde ainda se vêm os vestígios de quatro galhos cortados. Seu braço direito cai mansamente; os dedos da mão pairam por cima da mesa. O quadro, no seu conjunto, dá uma impressão profundamente real, embora não concretizada demasiadamente.

[2] ARCANO I - ALEPH
Dirigindo nossa atenção para a construção do símbolo Aleph, vemos nela uma alusão à trindade, apresentada na forma de duas partes, ligadas por uma terceira. A lâmina correspondente do Tarô representa um homem de pé, cujo braço esquerdo erguido empunha uma vara. O seu braço direito está abaixado e a mão aponta para a terra. Em linhas gerais, a imagem lembra o próprio símbolo Aleph. Acima da cabeça do homem vemos o signo do infinito. Uma fita de ouro cinge a cabeça e um cinto, também de ouro, a cintura. Na sua frente, uma mesa em forma de cubo e nela se acham três objetos: um cálice, uma espada e uma moeda. Deste modo, além da indicação da triplicidade (o próprio corpo do homem neutraliza os dois braços orientados em direções opostas), a lâmina nos mostra quatro objetos misteriosos. Vamos, em primeiro lugar, estudar a posição oposta dos braços: Em todos os campos de conhecimento encontram-se binários, ou seja, o conjunto de duas polaridades opostas. Os metafísicos falam de essência e substância - dois objetivos a serem estudados - opondose um ao outro. A ciência fala dos princípios, opondo-se aos fatos. Um outro exemplo de binário freqüentemente mencionado é o espírito-matéria. Na vida diária encontramos os binários: vida - morte consciência - poder de realização bem - mal Os campos mais especializados da ciência nos oferecem vários binários, tais como: luz-sombra, calorfrio, etc. Nos assuntos especializados, na maioria dos casos, é fácil achar a neutralização dos binários, ou seja, o terceiro termo, o médio, que constitui a passagem de um dos elementos extremos ao outro, estabelecendo assim uma escala tríplice, formada por três graus da mesma manifestação. Conseqüentemente, os dois, por meio do terceiro se unem numa unidade. Entre a luz e a sombra se coloca a penumbra, obtendo-se assim graus de iluminação ou, se preferirem, graus de escurecimento. Entre o calor e o frio, existem as temperaturas intermediárias. Entre uma classificação alta e outra baixa, temos a média. Entre as correntes positivas e negativas - o estado neutro.

O antagonismo sexual: marido - mulher, neutraliza-se pelo nascimento da criança e os três elementos se unem formando um só: a família. E assim por diante. Notemos que o termo médio possui o que podemos chamar de construção dual, ou seja, características semelhantes aos dois termos extremos. Nem todos os binários, porém, podem ser facilmente neutralizados. Podemos neutralizar satisfatoriamente o binário essência-substância pelo termo NATUREZA. Mas, não será fácil neutralizar os binários: Espírito - Matéria Vida - Morte Bem - Mal ou mesmo o nosso binário: Consciência - Poder realizador Definiremos o termo INICIAÇÃO como sendo o poder de neutralizar os dois últimos binários mencionados. Esta ciência fazia parte dos antigos Grandes Mistérios. Os Pequenos Mistérios abarcavam um conjunto -de conhecimentos que se Integravam no que, hoje em dia, chamamos de instrução geral. A neutralização do binário espírito-matéria é objeto da Iniciação Teórica. Os três grandes binários restantes -da Iniciação Prática. Passemos agora às idéias gerais referentes à escala unitária em forma de três degraus. Notemos o princípio hierárquico que rege a construção do escalamento ternário. O degrau superior, sendo da mais alta hierarquia, mas idêntico em essência aos outros degraus é como se fosse simplesmente refletido nesses degraus, porém gradualmente diminuído de intensidade. Deduz-se -que o poder subalterno distingue-se do poder superior apenas pela amplitude e intensidade de competência, e não pelo caráter da mesma. Conseqüentemente, um chefe comum de alguns subalternos, responsáveis por tarefas diferentes, deve possuir em si a síntese das competências dessas diversas especializações. Notemos também a idéia de continuidade da passagem entre um e outro degrau. Marcamos apenas três, mas, na maioria dos exemplos citados, a passagem de um degrau para outro é fluídica e ininterrupta. Do estudo dos ternários deduzimos que sua gênese pode ser dual. Podemos começar pelos extremos, como o fizemos, e chegar ao médio. Chamaremos esta gênese de tipo geral de ternário (figura 1). O signo "+" corresponde ao pólo positivo, isto é, àquele princípio do binário que consideramos expansivo, masculino. O signo "-" corresponde ao pólo negativo, atrativo, feminino do binário. A letra "N" representa o termo do meio, o neutro, o andrógino. Em muitos casos podemos também começar pelo termo do meio e, pela sua divisão, determinar seus pólos. A eletricidade neutra, pelo processo de fricção de superfície, separa-se em eletricidade positiva "+" e negativa "-". Nada nos impede de ver na penumbra uma sombra parcialmente iluminada pela luz. A criança apresenta por um lado características absorventes, assimilando diversos elementos, alimentando-se e crescendo. Por outro lado, ela demonstra uma atividade, uma expansão, que se estende aos objetos exteriores. Nela, as duas características estão unidas podendo, no entanto, figurar separadamente em nosso pensamento. Em tais casos teremos um outro tipo de ternário, ao qual daremos o nome de "TERNÁRIO DO GRANDE ARCANO".

Deixaremos por enquanto as idéias e passaremos ao método de obtê-las. Hoje, usando algumas analogias, nos aproximamos do assim chamado Simbolismo. Mas, o que é simbolismo? É um método de analogia aplicado a um caso particular. Vejamos o ternário: Luz -Penumbra - Sombra. Sob estes elementos colocamos outros ternários, e também sob os elementos extremos outros binários não neutralizados. Exemplo: Luz Penumbra Sombra Alta Média Baixa Essência Natureza Substância Espírito - Matéria Vida - Morte Se compararmos os 3 ternários com os 2 binários, poderemos chegar aos termos neutros dos últimos, por analogia, porque os 3 ternários, cujos termos neutralizadores são conhecidos, nos sugerem a idéia. Tal caso seria um exemplo do Poder de Realização do Símbolo no mundo metafísico-lógico. Como vemos, na quarta linha não conseguimos neutralizar o binário "espírito-matéria". O poder "realizador" do símbolo não se manifestou ainda aqui. Apenas chegamos a uma possibilidade de comparação condicional: se assemelharmos o espírito à luz, e a matéria à sombra, então, o termo procurado é análogo à "penumbra". Isto já é alguma coisa. Voltemos ao estudo da lâmina do primeiro Arcano Maior. A figura representa um homem, isto é, um ser individual e significa que o Arcano da Unicidade é, ao mesmo tempo, o Arcano da Individualidade. Se alguns elementos chegarem a ser unificados, o grupo passará então a viver uma vida individual. Cada célula é viva. Se várias células se unem num grupo e formam um órgão, esse órgão passará a viver uma vida individual. Os órgãos, agrupando-se, formam um organismo, o qual, por sua vez, vive também uma vida individual.


Todos os reinos orgânicos do planeta, incluindo o mineral, juntos, formam uma manifestação individual e viva chamada planeta. Um grupo de planetas constitui um sistema planetário, e assim por diante até o infinito. Em geral, uma célula se considera independente e luta com outras células por interesse próprio, ignorando a vida do órgão e do organismo do qual faz parte. Para ela este é um ambiente em que evolui sua pequena vida própria. Um sábio acadêmico, assemelhando-se a essa célula, é do mesmo modo irreverente para com a Terra e o sistema solar, negando-lhes vida individual e considerando-os apenas como o ambiente inanimado no qual se desenrola sua própria e benéfica atividade. A Terra, por sua vez, encara a vida do sábio com o mesmo desprezo que este manifesta em relação às suas células que se renovam. O Arcano I nos ensina que essas individualizações existem, e que não somente um grupo de átomos se individualiza, em nome da vida, na forma de molécula, mas que até uma corporação formada por um grupo casual de homens, se individualiza e, por isso mesmo, passa a viver uma vida corporativa, tratando com desprezo os pequenos interesses particulares de cada um de seus membros . Essa idéia universal foi expressa por Cristo no seguinte texto: "Onde houver dois ou três reunidos em Meu Nome, Eu estarei entre eles" (Mateus XVIII, 20). Fora do Logos não há vida realizada, portanto, a expressão "em Meu nome" significa "em nome da vida". Voltando à lâmina I, notamos que ela representa um Homem de pé, postura que corresponde ao elemento positivo. Isto nos servirá de indicação para o título do Arcano. Os esoteristas chamam-no de "Magus" (Mago); na linguagem comum, seu nome em francês é "Le Bateleur", ou seja, um prestidigitador popular que atua nas feiras. Para nós ele representa um ser individual ativo. Se, no universo, admitirmos três elementos básicos: o Arquétipo, o Homem e a Natureza, poderemos estabelecer um ternário teosófico e dar ao Arcano um título em cada um destes três planos: 1. No plano do Arquétipo (aspecto ativo) - "Divina Essentia" 2. No plano da Humanidade (aspecto ativo) - "Vir", o Homem 3. No plano da Natureza (aspecto ativo) -"Natura Naturans" (na terminologia de Espinosa). Neste breve curso, estudaremos o que significa o Homem do nosso Arcano e sua característica individual, manifestada através de sua atividade. Na atividade do Homem percebemos, antes de tudo, o grande binário: Espírito - Matéria O homem, espiritualmente, vive no plano das idéias. Por outro lado, ele se expressa no plano físico, material, isto é, na região onde as percepções se realizam pela reação dos sentidos aos objetos que chamamos de objetos concretos ou materiais. O nosso primeiro esforço no caminho da auto-iniciação, será procurar neutralizar o binário acima mencionado. O que pede ligar o espírito com a matéria? O que poderá constituir para nós a passagem do plano das idéias para o plano dos objetos concretizados? Responderemos: O plano no qual a Energia determina as Formas. Eis aqui o esquema do nosso ternário escalonado: Espírito - Energia -Matéria Idéias - Formas -Objetos Materiais Chamaremos esse plano intermediário de "Astral" e, aos extremos, daremos os nomes de "Mental" e "Físico". A passagem do Mental ao Astral se faz pelo processo de agrupamento, confronto e adição, ou, expressando-nos mais exatamente, pelo processo de condensação progressiva das idéias, regido pela grande Lei da Individualização das Coletividades, acima exposta. Se, a uma idéia geral de polígono, acrescentamos a idéia de igualdade de seus elementos lineares e angulares, conceberemos uma idéia nova mais condensada, mais precisa, de um polígono regular. Ligando a última idéia com a idéia do número quatro, aparecerá a imagem de um quadrado, imagem que já pode ser considerada como fazendo parte das formas. De modo semelhante, podemos passar do plano Astral para o Físico.

Um disco metálico fixo sobre um eixo não riscará um diamante, mas se ao mesmo disco imprimimos um rápido movimento circular ou, em outras palavras, aumentamos a quantidade de sua energia cinética, ou ainda, concentramos nele novas propriedades astrais -então passará a riscar o diamante. Assim, pela condensação do astral, podem ser modificadas as propriedades puramente físicas, neste caso, a dureza da periferia do disco. A passagem do astral para o físico realizou-se, embora apenas parcialmente. Se alguém se concentrar no desejo de que uma pessoa que se encontra em outro aposento, execute um determinado movimento, essa concentração consistirá numa condensação de idéias em imagens, isto é, formas. Mantendo na imaginação essas formas, ou, em outras palavras, condensando o astral, conseguiremos que o movimento desejado seja executado. Haverá uma manifestação acessível aos sentidos, pertencendo, portanto, ao plano físico. De novo teremos a realização da mencionada passagem. Pode-se objetar que, no primeiro exemplo, o disco imóvel já possuía um certo grau de dureza - uma propriedade física - e que, pela condensação do astral, esse grau de dureza apenas foi aumentado; que, no segundo exemplo, o magnetizador não apenas utilizou sua imaginação, mas, também, controlou sua respiração de acordo com regras definidas e talvez mesmo executou um ou outro movimento com o corpo, momentâneo ou contínuo, rítmico ou não. A essas objeções podemos responder com o aforismo alquímico: "Para fazer ouro, é preciso ter ouro". Esta é a lei que rege a maioria dos processos que têm lugar no campo das manifestações realizadas. Não é exigido de nós que recriemos o Universo e nem sabemos quanto tempo seria preciso para isso. É suficiente que tomemos um ponto de apoio nas realizações já prontas. Somos parecidos com o homem que joga pequenos cristais dentro de uma solução saturada para provocar uma rápida cristalização geral dessa mesma solução. A maioria das operações mágicas, realizadas, possui a mesma característica: uma escolha adequada dos pontos de apoio.

Não possuímos a compreensão do mecanismo da coagulação. Sabemos apenas como utilizar a "máquina" que já existe. Podemos, pelo esforço intenso e perseverante do intelecto e da vontade, chegar a escolher entre as máquinas, a mais simples e eficaz, mas, a construção da mesma, não é assunto nosso. Para isto, como aprenderemos mais tarde, há entidades especiais, conhecidas sob o nome de ANJOS (dentro dos limites do plano mental), SPRITUS DIRECTORES (no plano astral) e ELEMENTAIS (no plano físico). A cada um cabe uma função. Assim, vamos procurar distinguir em todo o Universo e em cada um dos elementos que o compõem, mesmo que seja aproximadamente, as esferas dos três planos: mental, astral e físico. Elas se interpenetram, mas podem ser estudadas separadamente. No HOMEM, conseqüentemente, discernimos três elementos componentes: "MENS" ou espírito, "ANIMA" ou alma, chamada também corpo astral ou astrosoma e, finalmente, "CORPUS" ou corpo físico. Caso o homem se dedique ao trabalho intelectual, diremos que Mens e Anima nele estão mais ativos do que o Corpus. Caso prevaleça a vida passional ou o trabalho da pura imaginação, ativo ou passivo, a preponderância pertence a Anima e assim por diante. A Mens humana, coagulando-se, determina a sua Anima; esta, coagulando-se por sua vez e tomando um ponto de apoio no plano físico, nos elementos materializados - mesmo que seja de forma sutil - fornecidos pelos pais, cria para si um corpo físico, tanto para a vida intra-uterina como para a vida externa. De acordo com a forma já planificada, a alma sustenta as funções do corpo físico, reparando seus eventuais danos. Falar de como a Mens dirige as funções da alma, e como também ela procura, eventualmente, reparála, seria ainda cedo demais. Terminando o presente capítulo, desejamos acrescentar ainda que nada nos impede de substituir a nossa tosca divisão ternária do Universo e do Homem, por outra, mais detalhada, na qual os planos já enumerados dividir-se-ão em sub-planos. Em breve o faremos.

 

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