O
Simbolismo no Pantáculo Martinista
O símbolo oficial e genérico do Martinismo é o Pantáculo.
Em primeiro lugar é importante deixar claro que a palavra Pantáculo
é, na verdade, um neologismo martinista, já que tal palavra
não consta nos dicionários. É importante mencionar
também que é escrita com a vogal "a", e portanto,
não deve ser confundida com sua palavra homônima "Pentáculo"
(escrita com a vogal "e"). Esta última deriva da palavra
grega pente e seu significado é cinco, o que explica a razão
pela qual muitas vezes é usada para designar um talismã na
forma de uma estrela de cinco pontas. Já a palavra Pantáculo,
etimologicamente falando, deriva da palavra grega panta, que significa "o
todo". De acordo com o martinista Adolphe Desbarolles (1804-1886),
essa palavra vem do latim pantaculum, que significa "aquilo que contém
tudo". Da mesma maneira, Papus aponta que a palavra Pantáculo
é um "diagrama do todo, resumindo, num único símbolo,
uma riqueza de significados". Stanislas de Guaita compartilhou a interpretação
de Papus, já que considerava tal símbolo como sendo o sumário
hieroglífico de uma doutrina completa.
Ao observar o Pantáculo você notará que ele é
composto de vários elementos. À primeira vista, distingue-se
de imediato a estrela de seis pontas, formada pela intersecção
de dois triângulos. Em seguida, nota-se que esses triângulos
estão contidos em um hexagrama, o qual se encontra inscrito em uma
circunferência. Esses elementos diversos, os dois triângulos
interseccionados, o hexagrama, o círculo e a cruz, pertencem a uma
simbologia universal; portanto, poderíamos ficar tentados a consultar
o que cada tradição tem a nos dizer a respeito desses símbolos,
de forma a entendermos o significado do Pantáculo Martinista. Contudo,
isso se mostraria um erro. Para descobrirmos o verdadeiro simbolismo, precisamos
atentar para o significado que nossa tradição atribui a esses
símbolos diversos.
Você lembrará que foi Papus quem, quando criou a Ordem Martinista,
escolheu o Pantáculo para simbolizar o Martinismo. Na verdade, ele
se lançou mão apenas dos símbolos essenciais da Ordem
dos Elus-Cohen, fundada, no século XVIII, por Martinès de
Pasqually. Para Pasqually e seus discípulos, o Pantáculo tinha
um significado bastante preciso. Ele representava a Criação
Universal, o mundo material, concebido para servir como um local de exílio
aos seres que se afastaram de Deus, caindo no Abismo. Aos seus olhos, também
simbolizava o local ocupado pela humanidade no início da Criação,
assim como o caminho que devemos seguir para recuperar nossa posição,
enquanto trabalhamos para buscar a nossa própria Reintegração,
e aquela de todos os seres. O próprio Louis-Claude de Saint-Martin
tratou da simbologia do Pantáculo em muitos dos seus escritos, particularmente
em O quadro natural e em Os números. Baseando-se no Pantáculo
desenhado por Saint Martin em sua obra Os números, Papus concebeu
o Pantáculo que se transformaria no símbolo da Ordem Martinista.
No Pantáculo, o círculo representa o limite da Criação.
De fato, quando o círculo é representado sem o ponto que marca
o seu centro, ele não mais simboliza a Imensidão Divina, mas
sim o Eixo do Fogo Divino, que cerca o mundo da matéria, isto é,
o mundo na qual nós não mais conseguimos sentir o Centro Divino,
de onde é emanado. Além do mais, é o seu raio que possibilita
a divisão do círculo em seis partes iguais, produzindo, assim,
um perfeito hexagrama. É interessante notar que, no livro Dos erros
e da verdade, Louis Claude de Saint Martin empenha-se em mostrar que o raio
do círculo fornece a estrutura básica dos dois triângulos
do Pantáculo, os quais formam a estrela de seis pontas.
Louis-Claude de Saint-Martin, assim como Martinès de Pasqually, viu
no hexagrama o símbolo dos Seis Dias de Criação. O
número seis é, também, simbolizado por dois triângulos
entrelaçados. No Pantáculo, ambos os triângulos representam
a criação do mundo material pelo Divino, o qual, para tanto,
integrou o poder triplo do Pensamento, da Vontade e da Ação,
juntamente com o trabalho do enxofre, do sal e do mercúrio. Os espíritos,
cuja missão inicial era produzir matéria, produziram essas
três essências.
Em seu livro, Os números, Louis-Claude de Saint-Martin afirmou: "o
triângulo superior junto ao triângulo inferior, reagindo um
com o outro, manifestam a vida." E acrescenta posteriormente: "É,
assim, que o Homem Quaternário surgiu," sendo representado pela
cruz encontrada no Pantáculo. O centro da cruz coincide com o centro
do círculo, e seus quatro braços vão além dos
limites fixados pelos dois triângulos, para finalmente regressar ao
círculo. Isso significa que o Homem Quaternário, também
chamado de Quaternário Menor, foi colocado no centro da Criação,
não apenas para direcioná-la, mas também para trabalhar
em prol da Reintegração. Essa missão dupla constitui
aquilo que o Filósofo Desconhecido chama de "a primeira religião
da humanidade", através da qual nós "temos de continuar
passando o nosso olhar de Leste a Oeste, de Norte a Sul". De fato,
Saint-Martin considera a humanidade como "um ser continuamente saturado
de Deus, mas no qual Deus não mais manifesta a sua Divindade",
ou melhor, em nenhuma parte da Criação.
No Martinismo, a cruz não simboliza a ideia de morte, como é
comum no caso do Cristianismo. Martinès de Pasqually, Louis-Claude
de Saint-Martin e Jean-Baptiste Willermoz chamavam-na de Receptáculo
porque eles viram em seu formato a ideia de irradiação, tomando
como sua fonte um ponto invisível e então estendendo-o em
todas as direções do espaço. De acordo com eles, no
princípio, o Homem Primordial fora destinado a receber a Divina Energia
emanada do invisível centro da Criação, para então
ser transmitida para todo o universo. Em todas as iniciações
criadas por Martinès de Pasqually, cujo objetivo era reviver simbolicamente
os diversos estágios da história da humanidade, os candidatos
eram colocados deitados no centro de um grande Pantáculo traçado
no chão, com seus braços abertos em forma de cruz. Enquanto
nessa posição, eles eram cobertos com três pedaços
de tecidos sobrepostos - um preto, um vermelho e um branco. Em uma dessas
iniciações, dois pedaços de tecido branco eram adicionados,
com o intuito de formarem uma cruz sobre seus corpos. Essa cruz era chamada
de Receptáculo.
De acordo com o Tratado da reintegração dos seres, o Quaternário
Menor, Adão, foi colocado no centro da Criação para
dirigi-la; entretanto, ele foi incapaz de cumprir sua missão. Tendo
o primeiro Adão caído; foi o Segundo Adão, o Cristo,
que foi convocado para ocupar esse lugar central. No entanto, em seu Tratado
das duas naturezas, Jean-Baptiste Willermoz indica que, se a missão
do Cristo exigiu que ele passasse pela cruz, foi para nos lembrar da nossa
condição original. De acordo com Willermoz, "Essa cruz,
dividindo figurativamente, com seus quatro braços, as quatro partes
do espaço criado, lembra-nos, de maneira clara, das quatro regiões
celestiais que constituíam o primeiro domínio da humanidade
em seu estado de pureza e inocência. Seu centro, onde o Divino Reparador
morreu, lembra o paraíso terrestre, que foi a sede da nossa glória
e domínio." Para Jean-Baptiste Willermoz, assim como para Louis-Claude
de Saint-Martin, a cruz simboliza a Redenção e indica o caminho
que a humanidade deve seguir para recuperar o seu lugar original.
Como é sabido e pode ser visto no diagrama abaixo, o símbolo
S. I. é representado por uma cruz, ladeada pelas letras "S"
e "I", e por dois grupos de três pontos. No que diz respeito
à Tradição Martinista, esse símbolo de alta
significação representa o domínio ao qual o Iniciado
aspira, a Maestria que um dia nos tornará verdadeiros Superiores
Desconhecidos. Depois de ter arrancado o escuro véu da ignorância
que está obscurecendo a nossa missão, iremos nos tornar a
Humanidade Divina na Terra, e, novamente, dirigir a Criação,
representada por esses seis pontos. A partir desse ponto, o círculo
deixará de limitar a radiação das nossas ações,
passando a abraçar o Todo.
Para alcançar essa Maestria, devemos começar voltando-nos
para o Cristo, que desde a queda de Adão, ocupa o centro de toda
criação. Dessa maneira, para Louis-Claude de Saint-Martin,
o Cristo é o mediador, o centro invisível ao qual podemos
nos conectar, a fim de conhecermos a regeneração. Assim como
a rosa no centro da cruz, o Cristo é encontrado em nossos corações
como a fonte da qual podemos beber para nos regenerarmos. É por isso
que o Filósofo Desconhecido insistia tão fortemente na necessidade
de continuamente mergulharmos nas profundezas do nosso interior, a fim de
extrairmos a "raiz vivificante, porque, então, todos os frutos
que devemos manifestar, de acordo com a nossa espécie, serão
produzidos naturalmente tanto dentro de nós, quanto fora de nós."
Assim é, para Louis-Claude de Saint-Martin, a verdadeira iniciação,
que novamente nos torna um Receptáculo do Divino.
Como vimos ao longo deste artigo, o Pantáculo traduz uma expressão
do Todo. Ele representa não apenas o processo pelo qual o Divino
deu a luz à Criação, mas também o lugar da humanidade
na criação e o caminho que devemos seguir para nos regeneramos
enquanto trabalhamos na Reintegração de todos os seres. É
precisamente por esse motivo que o esplendor desse símbolo "dá
auxílio e suporte ao olho treinado do Iniciado na busca pelos mistérios
perdidos". Naturalmente, outros ensinamentos podem ser extraídos
do Pantáculo. Cabe a você, por meio da meditação,
e no silêncio do seu coração, descobri-los.