Em 1869 a
família Encausse veio estabelecer-se em Paris, no bairro Montmar-tre,
onde Papus iniciou seus estudos, primeiro no Colégio Rollin, depois
aos 17 anos, na Fa-culdade de Medicina de Paris. Ainda jovem, dedicou-se
nas horas vagas ao Ocultismo; en-quanto seus colegas preocupavam-se com
os problemas políticos da Europa e em percorrer todos os autores
da Ciência Oficial, Papus passava suas tardes na Biblioteca nacional
de Paris ou na Biblioteca do Arsenal estudando os autores clássicos
da Alquimia e da Cabala, tomando notas dos principais manuscritos tão
zelosamente guardados há séculos nessas preciosas biblio-tecas.
Papus teria sido iniciado por Henri Delaage em 1882, segundo ele mesmo nos
diz, na Sociedade dos Filósofos Desconhecidos, ordem que teria sido
fundada por Louis Claude de Saint-Martin no século XVIII, na França.
Com 17 anos de idade, o jovem Papus passou a destacar-se no seio do Grupo
que passou a integrar, pela seriedade com que procu-rava as chaves da Iniciação.
Em 1887, aos
22 anos, escreveu sua primeira obra, denominada O Ocultismo Contemporâneo.
Seu Tratado Elementar da Ciência Oculta(1), no ano seguinte, alcançou
grande sucesso em vários países e proporcionou a seu autor
grande liderança no meio ocultista parisiense. Fundou, em 1889, o
Grupo Independente de Estudos Esotéricos (Gldee), transfor-mado mais
tarde em Escola Hermética, destinada a divulgar a espiritualidade
e a combater o materialismo, igualmente, as revistas A Iniciação
e Véu de Isis, órgãos de divulgação do
Ocul-tismo, planetas que giravam em torno do centro irradiante de dinamismo,
que era o Iniciador Papus.
Trabalhou como externo nos hospitais de Paris e não abandonou o exercício
da medicina. Em 1894 defendeu sua tese de medicina, intitulada A Anatomia
Filosófica e Suas Divisões, recebendo o título de Doutor
em Medicina, com elogios. Sua obra posterior, Com-pêndio de Fisiologia
Sintética, foi igualmente muito elogiada nos meios acadêmicos.
Ao defender sua tese, Papus confessou-se um iniciante na arte de curar, pois vislumbrava as possibilidades do Ocultismo. Como Paracelso, percorreu vários países da Eu-ropa, estudando todas as medicinas, a oficial, a dos curandeiros, a homeopatia, aprendendo uma série de procedimentos desconhecidos dos médicos tradicionais.
Praticou a alopatia, a homeopatia e a hipnose, realizando curas consideradas extraordinárias por seus biógrafos. É o caso da senhora ricamente vestida, conta-nos Phaneg, que entrou em seu consultório com ares de descrença. Papus sem que ela falasse e após ter chamado sua atenção pela falta de fé no médico em presença, diagnosticou seu mal e falou de sua precária situação financeira. A senhora ficou maravilhada pelas revelações que ouvia e pela nevralgia subitamente desaparecida. Papus não lhe cobrou a consulta, porque aquela era seu último "Louis".(2)
Muitas vezes Papus, para efetuar o diagnóstico, observa em primeiro lugar o astral do doente, depois o curava misteriosamente, apelando à força vital-mãe, fonte de equilí-brio. Ele classificava, assim as doenças, como sendo do Corpo, do Astral e do Espírito. As doenças do Corpo (como febres, traumatismos) podem, segundo Papus, ser curadas pela me-dicina dos contrários; as doenças do Astral (como tuberculose e o câncer) podem ser tratadas pela homeopatia e o magnetismo; e as doenças do Espírito (como epilepsia, histeria e loucura) podem ser tratadas pela oração e pela magia, desde que o mal não seja Cármico (dívida espiri-tual a ser paga pelo doente). Assim, Papus praticava seguidamente a Medicina Oculta, curando à distância, agindo sobre a urina, o sangue e o cabelo do paciente. Contam que Papus realizava diagnósticos insólitos, agindo pelos dons de clarividência e de clariaudiência.
No Umbral do Mistério, Stanislas de Guaita escreve que Papus, "jovem médico dos mais eruditos e fecundos, converteu-se em dupla personalidade: conquistou a notoriedade sob dois nomes diferentes. Suas obras de anatomia e de fisiologia receberam apenas a subscri-ção de Gérard Encausse. Seus Tratados de magia arvoram um outro nome".
"Cabeça enciclopédia e pena infatigável, saudemos este jovem iniciado que dis-farça ou, diríamos, que desfigura o lastimável pseudônimo de Papus. É mister, seguramente, que os seus livros testemunhem uma superioridade assaz transcendente, para que se possa per-doar sua etiqueta! Fato é que os amadores de teosofia pronunciam o nome de Papus sem esbo-çar qualquer sorriso mas, isto sim, com admiração e apreço. Passando pelas brochuras já em número considerável, que têm vigorosamente contribuído para a difusão das ciências esotéri-cas, mencionaremos tão-somente as obras Ocultismo Contemporâneo (Carré, 1887, in 8º), O Sepher Yetsirah (Carré, 1888, in-8º) e a Pedra Filosofal (Carré, 1889, in-12, frontispício)".
"Convém lembrar que Papus publicava, desde 1888, o seu Tratado Elementar de Ciência Oculta(Carré, in-12, com figuras). Trata-se da primeira obra metódica em que se acham resumidos com clareza, agrupados e sintetizados com maestria todos os dados primor-diais do Esoterismo. Este livro excelente, que enfoca a aplicação dos métodos experimentais de nossas ciências ao estudo dos fenômenos mágicos, e ademais, uma ação boa e meritória: os próprios estudantes adiantados podem recorrer a ela com segurança, como ao mais sábios dos gramáticos. Mas, Papus acaba de firmar para sempre a sua reputação de adepto através da aparição de uma monumental obra atinente ao Tarot (3). Em nosso entender, não exageramos ao asseverar que este livro, em que se acha revelada, até às profundezas, a lei ondulatória do ternário universal, constitui, no sentido mais alto do termo, uma Chave absoluta das Ciências Ocultas".
Seu pseudônimo Papus foi retirado do Nuctameron de Apolônio de Tiana e significa o "médico da primeira hora", aquele que não mede sacrifícios para atender seus seme-lhantes.
Papus consagrou-se ao estudo da Luz Astral e de sua influência sobre as doen-ças e sobre sua terapêutica, tal como ensinava Paracelso um dos pais da Medicina. O papel da mente e suas relações com o Plano Astral e o Homem. Durante longos anos dirigiu suas pes-quisas sobre os fenômenos hipnóticos, espíritas, parapsicológicos, exteriorização da sensibili-dade e do magnetismo. Fundou a Escola de Magnetismo de Lyon, tendo o Mestre Philippe como seu Diretor.
Seus estudos dos Corpo Astral e do Plano Astral não tinham como objetivo apenas a cura do Corpo, mas, principalmente, a cura da Alma, isto é, sua terapia pela iniciação. Fez da famosa divisa do Templo de Delfos "Conhece-te a ti mesmo que conhecerás o Universo e os Deuses" o seu lema de trabalho iniciático e profissional. Estudou profundamente a Anti-güidade egípcia e os mistérios gregos e romanos, concluindo que entre eles a Ciência e a Inici-ação estavam intimamente associadas.
A Escola Hermética, que tinha como professores famosos ocultistas da época, tais como Stanislas de Guaita, Sedir, Barlet, Peladan, Chamuel, Marc Haven, Maurice Barrès (academia francesa) Victor-Emile Michelet, entre outros, tinha como objetivo recrutar mem-bros para as sociedades iniciáticas dirigidas por Papus e por Stanislas de Guaita (que ainda existem hoje em pleno vigor), através de cursos, conferências, pesquisas ocultistas e publica-ções. Ensinavam o Hebraico, a Cabala, o Tarot, a Astrologia, a História Oculta, a Magia, a Medicina Oculta, focalizando principalmente seu aspecto menos velado e mais científico. Pa-pus é tido como o divulgador do Ocultismo Científico de Louis Lucas, que se baseia na Ana-logia, método que procura explicar o Invisível por inferência, a partir do Visível.
Papus teve como Mestre Intelectual o Marquês Joseph Alexandre Saint-Yves d´Alveydre e como Mestre Espiritual, como ele próprio afirmava, o "Mestre Philippe de Lyon", a partir de 1887 e 1897, respectivamente. Teve no seu companheiro Stanislas de Guaita um incentivador de primeira grandeza, discípulo póstumos todos os dois de Eliphas Levi, Fabre d´Olivet, Saint Martin e Jacob Boehme, cujas obras sabiam praticamente de cor.
Praticava a Cabala Prática(4), juntamente com seus principais companheiros, com a qual procurava o aperfeiçoamento espiritual até chegar ao conhecimento da Divindade. O adepto deve conhecer toda a teoria da Magia, dizia Papus, os materiais usados pelos magos, os perigos da Magia que enfrentam os praticantes temerários, a chave da magia negra, as cila-das do inimigo invisível, o controle das paixões, a eliminação dos vícios, se o Iniciado desejar, sinceramente, tornar-se um Mestre e obter a Salvação.
Sua vida foi uma ação constante em todos os planos, lutando contra o materia-lismo e o ateísmo e divulgando a espiritualidade. A lembrança do duelo com Jules Blois, que tinha desacatado fortemente a Stanislas de Guaita, ficou gravado na memória de todos os ini-migos de Papus. Quando Jules Blois dirigia-se em um fiacre para o local designado para o combate, os cavalos assustaram-se com a aparição súbita de um vulto e empinaram-se, derru-bando por terra Jules Blois e sua comitiva. Assim, Jules Blois chegou à presença de Papus com dor de cabeça e cambaleante. O duelo começou, sem muito entusiasmo, Papus procurando, dizem seus biógrafos, não ferir gravemente seu opositor. Este recebeu um pequeno ferimento no ombro e a luta teve fim. Papus cumpriu sua obrigação de médico, socorrendo seu adversá-rio e a inimizade terminou.
Papus visitou
a Rússia Três vezes, sendo recebido pelo imperador. Em 1914
foi a Guerra como capitão-médico, onde contraiu tuberculose.
Faleceu em 25 de outubro de 1916, aos 51 anos de idade. Seu corpo repousa
no cemitério de Père Lachaise, em Paris, na divisão
93.
"Imitemos esse Iniciador, disse-nos Sedir, que desejou não ser
mais do que um amigo para nós e que foi bastante forte ao ponto de
nos esconder suas dores e seus desgostos sob um perpétuo sorriso.
Enxuguemos nossas lágrimas; elas o reteriam nas sombras; regozi-jemo-nos,
como ele próprio há três dias o fez, por rever finalmente
face à face o Todo Pode-roso Terapeuta, o autêntico Pastor
das Almas, o Amigo Eterno, o Bem Amado de quem ele foi Eterno, o Bem Amado
de quem ele foi o fiel servidor".
"Digamos, juntos a Gérard Encausse, um até logo vibrante; demos a ele, por nossas boas vontades doravante indefectíveis, a única recompensa digna de tão longas penas que ele suportou por nós"(5).
Papus foi sem dúvida alguma um grande Mestre ocultista, destacando-se por sua realização: escreveu mais de 160 títulos entre livros, artigos, conferências, abordando tanto a medicina como o ocultismo. Os livros principais foram publicados em sua juventude, como o Tratado Elementar de Ciências Oculta (23 anos), o Tarot dos Boêmios (24 anos), o Tratado Metódico de Ciência Oculta (26 anos), a Cabala (27 anos), o Tratado Elementar de Magia Prática (28 anos).
Para seus companheiros de adeptado, suas obras principais foram o Tarot dos Boêmios, o Tratado Metódico de Ciência Oculta e o Tratado Elementar de Magia Prática. São Três "dos mais belos livros e dos mais fundamentais para o estudo do Ocultismo aparecidos após os de Eliphas Levi, Louis Lucas e Saint-Yves d´Alveydre" (Stanislas de Guaita em No Umbral do Mistério (4).
Como ilustração de sua obra literária, apresentamos
a seguir a lista alfabética de suas principais publicações
ocultistas:
01 - ABC Illustré D´Occultisme, Dorbon, 1922 (6º ed.)
02 - l´Almanach de la Chance por 1905 (id.,até 1910).
03 - L´Almanach du Magiste, de 1895 a 1899.
04 - Revista L´Initiation (artigos, de 1891 a 1914).
05 - Revista Le Voile d´Isis (artigos, de 1891 a 1909).
06 - Les Arts Divinatoires. Chamuel, 1895.
07 - La Cabbale, Chacornac, 1903 (3º ed.)
08 - Ce que deviennent nos morts. La Sirene, 1918.
09 - Ce que doit savoir un maitre Maçon. Ficher, 1910.
10 - Comment on lit dans les mains. Ollendorff, 1902 (2º ed.)
11 - La Magie et l´Hypnose. Chamuel,1897.
12 - L´Occultisme
contemporain. Carré, 1901.
13 - Premiers Eléments de Lecture de la Langue Hébraique.
Dorbon 1913
14 - Qu´est-ce que l´Occultisme? Chamuel, 1892.
15 - La Réincarnation. Dorbon, 1912.
16 - La Science des Mages. Chamuel,1892.
17 - La Science des Nombres. Chacornac, 1934.
18 - Le Tarot des Bohémiens. Carré, 1889.
19 - Le Tarot Divinatoire. Libr. Hermetique, 1909.
20 - Traité Elémentaire de Magie Pratique. Chamuel, 1893.
21 - Traité Elémentaire d´Occultisme et d´Astrologie. Dangles, 1936.
22 - Traité Elementaire de Science Occulte. Carré, 1888.
23 - Traité Méthodique de Magie Pratique. Chacornac, 1924.
24 - Traité Méthodique de Science Occulte. Carré, 1891.
Observações:
1- Publicado em português, sob o título Tratado de Ciências Ocultas, pela Ed. Três, Coleção Planeta nº 8 e 9, São Paulo, 1973.
2- Antiga moeda francesa, de ouro valendo 20 francos.
3- Papus. Le Tarot des Bohémiens. Paris Ed. Dangles, s/d ("Papus, continua Guaita, publicou, após a 2º edição do Umbral do Mistério em 1890, dois grandes volumes, onde a mais alta doutrina formula-se numa linguagem luminosa e precisa: Traité Méthodique de Science Oculta (l891) e Traité Elémentaire de Magie Pratique (1894)". "O Tarô dos Boe
4- Guaita, Stanislas. No Umbral do Mistério. Porto Alegre, Grafosul, 1979 (uma segunda edição dessa obra está sendo executada pela Sociedade das Ciências Antigas SCA, que obteve os direitos da tradução brasileira).
5- Discurso de Paul Sédir junto ao túmulo de Papus, na ocasião de seu enterro.
6- A presente
tradução baseia-se na edição de 1903 (3º
edição), revista e ampli-ada por Papus, contendo trabalhos
dos cabalistas Stanislas de Guaita (falecido em 1897). Eli-phas Levi, Lenain,
Marc Haven, Sedir, Jacob, Sair e uma tradução completa do
Sepher Yetzi-rah seguida de uma reimpressão parcial de um tratado
cabalístico do Cav. Drach.