A perspectiva martinezista de DEUS
Ivan Corrêa


Em Teodiceia psíquica, antes de dar inicio a uma minuciosa análise acerca de inúmeras passagens do Tratado da reintegração dos seres (2007), buscamos compreender a forma como o Martines de Pasqually compreendeu a natureza da Divindade. Mesmo em se tratando de um tema complexo e passível de múltiplas formas de interpretação, não enxergamos outro ponto de partida mais acertado. É impossível nos depararmos nem sequer com uma página do texto de Pasqually que não faça menção a Deus ou a um de seus enviados e, além de ser uma personagem central no mito, Deus é o ponto de origem de toda a história.

Pasqually foi bastante minucioso ao tratar de diversos temas bíblicos e, para muitos desses temas, dedicou inúmeras linhas distribuídas em diferentes partes do texto. Essa primeira afirmação, a respeito do esmiuçamento feito por Pasqually, no entanto, não é o caso do tema que pretendemos introduzir nesse momento. Uma vez que o Tratado preocupa-se com as desventuras da, na maioria das vezes conflituosa, relação existente entre Deus e suas criaturas emanadas, é surpreendente a constatação de que Deus poucas vezes é apresentado ou discutido sozinho, longe dessas relações. Quanto à segunda afirmação, a de que um mesmo tema é tratado e retratado em diferentes momentos da obra de Pasqually, ela é bem acertada. De fato, o tema da natureza de Deus é discutido em momentos tão distantes um do outro que, muitas vezes, o leitor fica bastante confuso.

Em Teodiceia psíquica, antes de termos nos dedicado a algumas passagens nas quais Pasqually lança luz sobre a questão que estamos introduzindo, nos dedicamos aos comentários presentes no já consagrado prefácio do Tratado da reintegração dos seres. Nele, Amadou (2007) é bastante sintético e claro:

Martines se escandalizava com as três pessoas em Deus. Para ele, Deus é um e sua essência é quaternária. Essa quaternidade, Deus a manifesta pela emanação dos primeiros seres em quatro classes. Martines denuncia o dogma da Trindade, mas vê em Deus três modalidades de expressão: o pensamento, a vontade e a ação . (p.26)

Quando Martines de Pasqually fala de Deus, então, ele se refere a um Ser que, embora preserve a unidade, possui uma essência quaternária e se expressa de maneira trina. A respeito dessa consideração, poderíamos perfeitamente substituir o verbo "expressar" pelo "agir". Deus, dessa maneira, embora originariamente tenha uma essência que é quátripla, age a partir do ternário. Pasqually torna ainda mais complexo o célebre e misterioso dogma cristão do Deus único que também possuí três hipóstases .

É bastante relevante considerarmos que na maioria das vezes que é citado no texto de Pasqually, Deus é chamado de Criador, uma vez que Nele tudo estava contido, e Eterno, já que sua existência precede a criação do universo. Ele não guarda, portanto, relação imprescindível com qualquer concepção de tempo e de espaço. Em determinado momento, Pasqually (2007) escreve:

O Eterno criou e emanou tudo, e que a todo instante Ele cria e emana de si todas as coisas, através de regras fixas e imutáveis, isto é, através de peso, número e medida. Essas três coisas significam a lei, o preceito e o comando dados aos seres espirituais divinos; significam ainda a virtude, a faculdade e a potência que o Criador colocou em seu menor , desde sua emancipação, para que ele operasse segundo seu pensamento, sua intenção e sua palavra, nas quatro regiões celestes e nas três terrestres. (p.293)


REFERÊNCIA

AMADOU, Robert. "Introdução: a Coisa, a história e a urgência" in PASQUALLY, Martines de. Tratado da reintegração dos seres: em sua primeira propriedade, virtude e potência espiritual divina. Curitiba: Diffusion Rosicrucienne, 2007.

PASQUALLY, Martines de. Tratado da reintegração dos seres: em sua primeira propriedade, virtude e potência espiritual divina. Curitiba: Diffusion Rosicrucienne, 2007.


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