O Magnetismo
Grande Arcano - Eliphas Levy



O magnetismo é uma força análoga à do ímã; está espalhado em toda a natureza.
Seus caracteres são: a atração a repulsão e a polarização equilibrada.
A ciência observa os fenômenos do ímã astral e do ímã mineral. O ímã animal se manifesta todos os dias por fatos que a ciência observa com desconfiança, porém já não pode mais negá-los, embora, para admiti-los, espere com razão que possa ser terminada a sua análise por uma síntese incontestável.
Sabemos que a imantação produzida pelo magnetismo animal determina um sono extraordinário, durante o qual a alma do magnetizado cai sob o domínio do magnetizador, com esta particularidade: a pessoa adormecida parece deixar inativa sua vida própria para manifestar somente os fenômenos da vida universal. Ela reflete o pensamento dos outros, vê sem auxílio dos olhos, torna-se presente em toda parte sem ter consciência do espaço, percebe as for mas mais que as cores, suprime e confunde os períodos do tempo, fala do futuro como se fosse do passado e do passado como se fosse do futuro, explica ao magnetizador seus próprios pensamentos e até as acusações secretas da sua consciência; evoca na sua recordação as pessoas em que pensa e as descreve do modo mais exato, sem que o sonâmbulo ou sonâmbula as tenha visto alguma vez; fala a linguagem da ciência com o sábio e a da imaginação com o poeta, descobrirás doenças e advinha os remédios, dá muitas vezes sábios conselhos, sofre com quem sofre e, às vezes, dá um grito doloroso ao anunciar-vos tormentos que devem surgir.
Estes fatos estranhos, porém incontestáveis, nos levam necessariamente a concluir que existe uma vida comum para todas as almas, ou ao menos uma espécie de refletor comum de todas as imaginações e memórias no qual podemos ver-nos uns aos outros, como acontece para uma multidão que passa diante de um espelho? Tal refletor é a luz óptica do cavalheiro Reichenbach, é nossa luz astral, é o grande agente da vida chamada od. ob e aur pelos hebreus. O magnetismo dirigido pela vontade do operador é Od, o sonambulismo passivo é Ob. As Pitonisas da antiguidade eram sonâmbulas ébrias de luz astral passiva. Esta luz, nos livros sagrados, é chamada espírito de Python, porque na mitologia grega a serpente Python é a sua imagem alegórica.
Ela é representada também na sua dupla ação pelas serpentes do caduceu; a serpente da direita é Od, a da esquerda é Ob, e no meio, no cimo da verga hermética, brilha o globo de ouro que representa Aur ou a luz equilibrada. Od representa a vida livre mente dirigida; Oh representa a vida fatal, É por isso que o legislador hebreu diz: "Infelizes dos que adivinham por Ob, pois evocam a fatalidade, o que é um atentado contra a providência de Deus e contra a liberdade do homem."
Há certamente uma grande diferença entre a serpente Python, que se arrasta no lodo do dilúvio e que o sol feriu com suas flechas; há, dizemos nós, urna grande diferença entre esta serpente e a que se enrosca no bastão de Esculápio. da mesma forma que a serpente tentadora do Éden difere da de bronze que curava os doentes no deserto. Estas duas serpentes opostas figuram efetivamente as forças contrárias que podemos associar, porém que jamais de vem confundir-se. O cetro de Hermes. separando-as as reúne; e é assim que aos olhos penetrantes da ciência, a harmonia resulta da analogia dos contrários.
Necessidade e Liberdade tais s as duas grandes leis da vida; e estas duas leis fazem só uma, pois são indispensáveis uma à outra.
A necessidade sem liberdade seria tão fatal quanto a liberdade que, privada do seu freio necessário, se tornaria insensata. O direito, sem a dever, é a loucura. O dever, sem o direito, é a servidão.
Todo o segredo do magnetismo Consiste nisto: governar a fatalidade do ob pela inteligência e o poder do od a fim de criar o equilíbrio perfeito de cair.
Quando um magnetizador mal equilibrado e sujeito a fatalidade por paixões que o dominam, quer impor sua atividade à luz fatal, assemelha-se a um homem com os olhos vendados que, montado em cego ginete, quisesse aguilhoá-lo às esporadas no meio de uma floresta cheia de sinuosidades e precipícios.
Os adivinhos, tiradores de cartas e sonâmbulos são todos alucinados que adivinham por ob.
O copo de água de hidromancia as cartas de Etteilla, as linhas da mão, etc, produzem no vidente urna espécie de hipnotismo. Vê então o consultante nos reflexos dos seus desejos insensatos ou das suas imaginações cupidas. e, como é, por sua vez, um espírito sem elevação e sem nobreza de vontade adivinha as loucuras e sugere maiores ainda?. o que é, de resto, unta condição de êxito para ele.
Um cartomante que aconselhasse a honestidade e os bons costumes perderia logo sua clientela de concubinas e solteironas histéricas.
As duas luzes magnéticas podiam muito bem chamar-se: uma, a luz viva e a outra, a luz morta; uma, o fluido astral e a outra, o fósforo espectral; uma, o facho do verbo e a outra, a fumaça do sonho.
Para magnetizar sem perigo é preciso ter em si a luz de vida, isto é, deve-se ser um sábio e um justo. O homem escravo das paixões não magnetiza fascina; porém a irradiação da sua fascinação aumenta ao redor dele o círculo da sua vertigem; multiplicasse seus encantos e enfraquece cada vez mais sua vontade. Assemelha-se a uma aranha que se cansa e, enfim fica presa na sua própria teia.
Os homens até agora ainda não conheceram o império supremo da razão; eles a confundem com o raciocínio particular e quase sempre errôneo de cada um. Contudo o próprio Senhor de la Palisse lhes diria que quem se engana não tem razão, a razão pessimamente o contrário dos nossos erros.
Os indivíduos e as massas que a razão não governam, são escravos da fatalidade; é ela que faz a opinião, e a opinião é rainha do mundo,
Os homens querem ser dominados, atordoados, arrastados. As grandes paixões lhes parecem mais belas que as virtudes e a quem chamam grandes homens são, às vezes, grandes insensatos. O cinismo de Diógenes lhes agrada como o charlatanismo de Empédocles. Nada admirariam tanto como Ajax e Capanea, se Polyeucto não fosse ainda mais furioso. Pyrama e Thisbeu. que se matam, são os modelos dos amantes. O autor de um paradoxo sempre tem certeza de adquirir renome. E, pôr mais que condenem ao esquecimento, por despeito e inveja. o nome de Eroastro, este nome tem tanta grandeza de demência que supera a sua raiva e se impõe eternamente à sua recordação!
Os loucos são, pois, magnetizadores ou antes fascinadores, e é o que torna contagiosa a loucura. Por falta de saber medir o que é grande, 'a gente se apaixona pelo que é estranho.
As crianças que ainda não podem andar, querem que a gente as carregue e leve a passeio.
Ninguém ama tanto a turbulência com os impotentes. É a incapacidade do prazer que faz os Tibérios e as Messalinas. O garoto de Paris no paraíso das ruas arborizadas queria ser Cartouche. e ridecoração. quando ridicularizam Telémaco.
Nem todos gostam da embriaguez opiácea ou alcoólica. porém quase todos quereriam embriagar o espírito e comprazer-se facilmente em fazer delirar o coração. Quando o Cristianismo impôs-se ao mundo pela fascinação do martírio, um grande escritor daquele tempo formulou o pensamento de todos, exclamando: "Creio porque é absurdo"
A loucura da Cruz, como o próprio S. Paulo a chamava, era então invencível invasora. Queimavam-se os livros dos sábios e S. Paulo preludiava em Efeso nos feitos de Omar. Derribavam-se templos que eram maravilhas do mundo e ídolos que eram obras primas das artes. Tinham o gosto da morte e queriam despojar a existência presente de todos os seus ornamentos para desprender-se da vida.
Os desgosto das realidades sempre acompanha o amor dos sonhos: Quam sordet tellus dum coelun aspiciol, diz um célebre místico; literalmente:
Quão suja se torna a terra, quando olho para o céu Pois então, teu olhar ao perder-se no espaço acha suja a terra, tua nutriz? Que é. pois. a terra senão um astro do céu? Será que ela é suja. porque te car rega? Porém, que te levem para o sol e teus desgostos logo sujarão o sol! Seria, o céu mais limpo se fosse vazio?
E não é ele admirável de contemplar porque durante a noite brilha com urna multidão inumerável de terras e de sóis? Porventura, a terra esplêndida, a terra de imensos oceanos, a terra cheia de. Lavores e de flores torna-se uma imundice para ti, por que quererias lançar-te no vácuo? Acredita-me, não procures mudar-te por isso: o vácuo está no teu espírito e no teu coração!
É o amor dos sonhos que mistura tantas dores aos sonhos do amor. O amor tal como no-lo dá a natureza é uma deliciosa realidade; porém, o nosso orgulho doentio quereria alguma coisa melhor que a natureza. O pensamento de Carlota, na cabeça de Werther, se transforma fatalmente como devia suceder, e toma a forma brutal de unia bala de revólver. O amor absurdo tem como desfecho o suicídio.
O amor verdadeiro, o amor natural, é o milagre do magnetismo. É o entrelaçamento das duas ser pentes do caduceu; parece produzir-se fatalmente, porém é produzido pela razão suprema que lhe f az seguir as leis da natureza. A fábula refere que Tiresias, tendo separado duas serpentes que se uniam, incorreu na cólera de Vênus e tornou-se andrógino, o que anulou nele o poder sexual; depois, a deusa irritada o feriu ainda, tornando-o cego porque atribuía à mulher o que convém principalmente ao homem. Tiresias era um indivíduo que profetizava pela luz moita. Por isso, suas predições anunciavam e pareciam sempre determinar doenças. Esta alegoria contém e resume toda a filosofia do magnetismo que acabamos de revelar.