O Amphitheatrum
Sapientiae Aeternae de Khunrath

Stanislas de Guaita


As duas pranchas cabalísticas reproduzidas no rosto desta brochura foram extraídas de um pequeno in-fólio raro e singular, muito conhecido pelos colecionadores de alfarrábios com ilustrações e muito procurado por todos aqueles que se preocupam, pelas mais diversas razões, com o esoterismo das religiões, com a tradição de uma doutrina secreta sob os véus simbólicos do cristianismo - enfim, com a transmissão do sacerdócio mágico no Ocidente.
"AMPHITHEATRUM SAPIENTIAE AETERNAE, SOLIUS VERAE, christiano-Kabbalisticum, divino-magicum, necnon physicochemicum, tertriunum, katholikon: instructore ENRICO KHUNRATH, etc., HANOVIAE, 1609, in-folio".
Único em seu gênero, inestimável sobretudo para os pesquisadores curiosos por aprofundar estas questões perturbadoras, este livro acha-se, infelizmente, incompleto em grande número de exemplares. Talvez sejamos alvo da gratidão do comprador se fornecermos, aqui, algumas rápidas informações que lhe possibilitarão prever e prevenir uma decepção.
As gravuras a buril, em número de doze, aparecem geralmente no frontispício da obra, agrupadas de modo arbitrário, já que o autor - talvez propositadamente - deixou de indicar a seqüência. O essencial é possuir a série completa, pois sua classificação varia de exemplar para exemplar.
Três dessas gravuras são em formato simples - 1? . o frontispício alegórico enquadrando o título gravado; 2? . o retrato do autor, cercado de atributos igualmente alegóricos; 3? . uma coruja de óculos, magistralmente empoleirada entre dois archotes iluminados, com duas tochas ardentes formando uma cruz de Santo André em sua frente. Abaixo, figura uma legenda rimada em alemão duvidoso e cuja tradução pode ser:
"De que servem archotes, tochas e óculos
a quem cerra os olhos para não ver?"
Em seguida, aparecem nove majestosas figuras mágicas, cuidadosamente gravadas, em formato duplo e sobre ongletes. São: 1) (*) o grande andrógino hermético; 2) (*) o Laboratório de Khunrath. 3) (*) Adão e Eva no triângulo verbal; 4) (*) Rosa-Cruz(91) pentagramática; 5) os sete degraus do santuário e os sete raios; 6) (*) a Cidadela alquímica com vinte portas sem saída; 7) o Gymnasium naturae, figura sintética e muito sábia, sob a aparência de uma paisagem bastante ingênua; 8) a Tábua de Esmeralda gravada sobre a pedra ígnea e mercurial; 9) (*) o Pantáculo de Khunrath, ornamentado com uma caricatura satírica ao gosto de Callot; é, de certa forma, um Callot por antecipação(92).
Esta última prancha, de incisiva ironia e de uma arte selvagem verdadeiramente saborosa, falta em quase todos os exemplares. Os numerosos inimigos do teósofo, que aqui se vêem caricaturados por um gênio acerbo e que sem esforço percebemos triunfante preocupado com as semelhanças, empenharam-se em fazer desaparecer uma gravura de tão escandaloso interesse.
Quanto aos outros pantáculos, aqueles a que acrescentamos um asterisco (*) faltam, igualmente, em inúmeros exemplares.
Examinemos agora o texto, que é dividido em duas seções. As sessenta primeiras páginas, numeradas à parte, compreendem um privilégio imperial (com data de 1598) e, então, diversas partes: discurso, dedicatória, poesias, prólogo, argumentos. Enfim, o texto dos Provérbios de Salomão, do qual o restante do Amphitheatrum é o comentário esotérico.
Vem, em seguida, o comentário, constituindo a obra propriamente dita, em sete capítulos, seguidos por sua vez de esclarecimentos muito curiosos sob o título: lnterpretationes et annotationes Henrici Khunrath. Esta segunda parte totaliza 222 páginas. Uma última folha traz o nome do impressor: G. Antonius, o lugar de impressão e a data: Hanoviae, MDCIX.
Encerremos esta descrição com uma observação importante do erudito bibliófilo G.F. de Bure, que diz, no tomo 11 de sua Bibliografia: "É de se observar que, na primeira parte desta obra, de 60 páginas, deve-se encontrar, entre as páginas 18 e 19, uma espécie de sumário particular, impresso numa folha inteira com ongletes, sumário esse intitulado Summa Amphitheatri sapientiae, etc... e na segunda parte, de 222 páginas, um outro sumário, similarmente impresso numa folha inteira com ongletes, e que deve localizar-se à página 151, à qual remetem dois asteriscos colocados no texto. Já observamos que estes dois sumários faltam nos exemplares que vimos, razão pela qual será conveniente ter cuidado..." (p. 248)
Passemos ao estudo detalhado das pranchas cabalísticas cuja reprodução esta edição de nossa obra oferece ao público.