O
Divino Bem e o Divino Vero
Emanuel Swedenborg
32. Há
dois universais que procedem do Senhor: o Divino bem e o Divino Vero; o
Divino bem pertence ao Seu Divino Amor, e o Divino Vero pertence à
Sua Divina Sabedoria; esses dois são um no Senhor, e por conseqüência
procedem d'Ele como um; mas não são recebidos como um pelos
anjos nos céus, nem pelos homens nas terras; há anjos e homens
que recebem mais do Divino vero que do Divino bem, e há os que recebem
mais do Divino bem que do Divino vero. Daí vem que os céus
são distinguidos em dois reinos, dos quais um é chamado reino
celeste e o outro reino espiritual. Os céus que recebem mais do Divino
bem constituem o reino celeste, mas os que recebem mais do Divino vero,
constituem o reino espiritual. Sobre esses dois reinos nos quais os céus
foram distinguidos, veja-se o tratado d'O Céu e o Inferno (ns. 20-
28). Mas os anjos de todos os céus estão na sabedoria e na
inteligência, tanto quanto o bem neles faz um com o vero. O bem que
não faz um com o vero não é para eles o bem, e, reciprocamente,
o vero que não faz um com o bem não é para eles o vero.
Daí se torna evidente que o bem conjunto ao vero faz o amor e a sabedoria
no anjo e no homem; e, como o anjo é anjo segundo o amor e a sabedoria
nele, e o mesmo sucede com o homem, é evidente que o bem conjunto
ao vero faz que o anjo seja anjo do céu, e que o homem seja homem
da Igreja.
33. Visto que o bem e o vero são um no Senhor, e d'Ele procedem como
um, segue-se que o bem ama o vero, o vero ama o bem e querem ser um. É
semelhante com seus opostos, porque o mal ama o falso, o falso o mal e querem
ser um. Na seqüência, a conjunção do bem e do vero
será chamada casamento celeste, e a conjunção do mal
e do falso, casamento infernal.
34. A conseqüência do que precede é que, quanto mais se
foge dos males como pecados, mais se ama os veros, porque mais se está
nos bens, como foi mostrado no artigo que há pouco precedeu. E, vice-versa,
quanto mais não se foge dos males como pecados, mais se deixa de
amar os veros, porque menos se está no bem.
35. O homem que não foge dos males como pecados pode até amar
os veros, mas ama-os não porque são veros, mas porque servem
à sua reputação, da qual tira honra ou proveito; por
isso, se para isso não servem, ele não os ama.
36. O bem pertence á vontade, o vero pertence ao entendimento. Do
amor do bem na vontade procede o amor do vero no entendimento; do amor do
vero procede à percepção do vero; da percepção
do vero, o pensamento do vero; e de tudo isso resulta o reconhecimento do
vero, que é a fé em seu sentido genuíno. Que haja essa
progressão do amor do bem para a fé, será demonstrado
no tratado Do Divino Amor e da Divina Sabedoria [Sabedoria Angélica].
37. Pois que o bem não é realmente o bem, a menos que seja
conjunto ao vero, como foi dito, conseqüentemente o bem não
existe antes, e todavia quer continuamente existir; por isso, a fim de existir,
deseja os veros, adquire-os e deles tira sua nutrição e sua
formação. É por essa razão que, quanto mais
alguém está no bem, mais ama os veros; por conseqüência,
quanto mais alguém foge dos males como pecados, mais ama os veros,
porque mais está no bem.
38. Quanto mais alguém está no bens, e pelo bem ama os veros,
mais ama o Senhor, pois que o Senhor é o Bem mesmo e o Vero mesmo.
O Senhor está, pois, no bem e no vero no homem. Se o vero é
amado segundo o bem, então o Senhor é amado, e não
de outra maneira. É o que o Senhor ensina em João:
"Quem tem os Meus preceitos e os cumpre, esse é o que Me ama;
... mas aquele que não Me ama não guarda as Minhas palavras."
(14:21, 24).
E em outra passagem:
"Se guardardes os Meus mandamentos, permanecereis no Meu amor."
(João, 15:10). Os "preceitos", as "palavras"
e os "mandamentos" do Senhor são os veros.
39. Que o bem ame o vero, pode ser ilustrado por comparações
com o sacerdote, o militar, o negociante e o artífice. Com o sacerdote:
se ele está no bem do sacerdócio, que consiste em prover à
salvação das almas, em ensinar o caminho do céu e em
dirigir aqueles que instrui, na medida que está nesse bem, assim,
pelo amor e o desejo deste amor, adquire os veros que ensina e pelos quais
dirige. Se, porém, um sacerdote não está no bem do
sacerdócio, mas no prazer de sua função pelo amor de
si e do mundo, prazer que para ele é o único bem, ele também,
segundo o amor e o desejo deste amor, adquire para si veros em abundância,
segundo a inspiração do seu prazer, que é seu bem.
Com o militar: se está no amor da milícia, e sente o bem na
ação de proteger, ou na fama, então por esse bem e
segundo esse bem adquire a ciência da sua posição e,
se é chefe, da inteligência daí; essas coisas são
como veros de que se nutre e se forma o prazer do seu amor, que é
seu bem. Com o negociante: se aplica aos negócios pelo amor dos negócios,
absorve com satisfação todas as coisas que, como meios, entram
nesse amor e o compõem; essas coisas também são como
veros, pois negociar é seu bem. Com o artífice: se aplica
com zelo à sua obra, e a ama como o bem de sua vida, compra instrumentos,
e por meio de coisas que pertencem à sua ciência se aperfeiçoa;
por essas coisas faz sua obra, pois que é o seu bem. Por estas comparações
é evidente que os veros são meios pelos quais o bem do amor
existe e se torna alguma coisa; por conseqüência, o bem ama os
veros a fim de existir. Daí, na Palavra, por "praticar a verdade"
entende-se fazer com que o bem exista. É o que se entende por "praticar
a verdade." (João 3:21); "fazer o que diz o Senhor."
(Luc. 6:47); "cumprir os Seus preceitos." (João 14:24);
"praticar as Suas palavras." (Mateus 7:24); "ouvir a palavra
de Deus." (Luc. 8:21); e "cumprir os estatutos e juízos."
(Levít. 18:5). Isso também é "fazer o bem"
e "dar fruto", porque o bem e o fruto é o que existe.
40. Que o bem ame o vero, e queira com ele ser conjungido, também
pode ser ilustrado por uma comparação com a comida e a água,
ou com o pão e o vinho. É preciso que haja um e outro; a comida
ou o pão, só, nada faz no corpo para a nutrição,
mas, sim, com a água ou o vinho, porque um apetece e deseja o outro.
Pela "comida" e pelo "pão", na Palavra, entende-se
também, em seu sentido espiritual, o bem, e pela "água"
e o "vinho" entende-se o vero.
41. Pelo que foi dito, pode-se agora ver que aquele que foge dos males como
pecados ama os veros e os deseja. E quanto mais foge dos males, mais ama
e deseja os veros, porque mais está no bem. Daí vem ao casamento
celeste, que é o casamento do bem e do vero, no qual está
o céu e estará a igreja.