OS
ELEMENTOS METAFíSICOS DA KABALA
Introdução ao estudo da Kabala mística e prática,
e a operatividade de suas Tradições
e seus Símbolos, visando a Teurgia
Robert Ambelain
Robert Ambelain nasceu no dia 2 de setembro de 1907, na cidade
de Paris. No mundo profano, foi historiador, membro da Academia Nacional de
História e da Associação dos Escritores de Língua
Francesa.´ Foi iniciado nos Augustos Mistérios da Maçonaria
em 26 de março (o Dictionnaire des Franc-Maçons Français,
de Michel Gaudart de Soulages e de Hubert Lamant, não diz o ano da
iniciação, apenas o dia e o mês), na Loja La Jérusalem
des Vallés Égyptiennes, do Rito de Memphis-Misraïm. Em
24 de junho de 1941, Robert Ambelain foi elevado ao Grau de Companheiro e,
em seguida, exaltado ao de Mestre. Logo depois, com outros maçons pertencentes
à Resistência, funda a Loja Alexandria do Egito e o Capítulo
respectivo. Para que pudesse manter a Maçonaria trabalhando durante
a Ocupação, Robert Ambelain recebeu todos os graus do Rito Escocês
Antigo e Aceito, até o 33º, todos os graus do Rito Escocês
Retificado, incluindo o de Cavaleiro Benfeitor da Cidade Santa e o de Professo,
todos os graus do Rito de Memphis-Misraïm e todos os graus do Rito Sueco,
incluindo o de Cavaleiro do Templo. Robert Ambelain foi, também, Grão-Mestre
ad vitam para a França e Grão-Mestre substituto mundial do Rito
de Memphis-Misraïm, entre os anos de 1942 e 1944. Em 1962, foi alçado
ao Grão-Mestrado mundial do Rito de Memphis-Misraïm. Em 1985,
foi promovido a Grão-Mestre Mundial de Honra do Rito de Memphis-Misraïm.
Foi agraciado, ainda, com os títulos de Grão-Mestre de Honra
do Grande Oriente Misto do Brasil, Grão-Mestre de Honra do antigo Grande
Oriente do Chile, Presidente do Supremo Conselho dos Ritos Confederados para
a França, Grão-Mestre da França - do Rito Escocês
Primitivo e Companheiro ymagier do Tour de France - da Union Compagnonnique
dês Devoirs Unis, onde recebeu o nome de Parisien-la-Liberté.
C. - Os Cineroth ou "Caminhos"
O Kabalista
chegando a Kether, a suprema Sephirah, verá então Deus face
a face, sob os aspecto do Filho, seu divino modelo. Ele deverá então
se deter aí. Se ele procurar perceber, definir, a segunda pessoa,
a Mãe, ele entrará então em Ain soph, o Ilimitado.
Aí ele se perderá como em um deserto tenebroso. E o terceiro
aspecto do Deus Tríplice, Ain, a Negação, o rejeitará
novamente as antípodes metafísicas do divino.
Uma segunda queda se consumará então, justificando as palavras
da Escritura: "Tu não podes ver minha face sem morrer".
Talvez essa ascenção e essa descida sejam eternas. Talvez
ao Aspirar e o Expirar, essa espécie de "respiração"
do Divino, sejam simplesmente as próprias condições
da Eternidade da Criação, e, consequêntemente da Imortalidade
do Homem Arquétipo.
Em cada um dos Sephiroth, se reproduz o processo gerador reencontrado até o presente no estudo do Deus "Tri-Uno". Assim, uma Sephirah propriamente dita é constituída de seu princípio, simbolizado pelo Nome Divino que aí corresponde. Esse princípio se subdivide em dois outros, eles próprios geradores de um terceiro. Cada um desse três termos emana por sua vez dois fatores secundários, e um outro pelo primeiro elemento primitivo. Isto nos dá desde já a unidade, o ternário, o setenário. A década se reconstitui, nascida dos dois últimos esquemas, como no Divino. Isto nos conduz a vinte e um elementos secundários. O vigésimo segundo não é outra coisa que o resultado de sua ação no Mundo fenomenal.
Em efeito:
1 [Deus Um].
3 [Deus Triplo].
7 [os Sete Espíritos].
10 [Dez Sephiroth ou Demiurgii].
1 [o Homem Arquétipo ou o Mundo].
22 [Número da Criação conforme a Kabala]
Número de letras do alfabeto e dos Caminhos da Árvore simbólica.
Isto explica
que as letras sejam a imagem da própria Criação, ou
sejam antes os fatores.
Como tem lugar essa Criação, no seio da Natureza Naturante,
eis o que diz o Sepher-há-Zohar.
Lembremos para melhor estabelecer o problema que o Filho emana a Substância
dessa Natureza Naturante, reflexo exterior a Trindade, da Mãe Eterna,
a Segunda pessoa. É na ação do Verbo sobre a Natureza
Naturante que se concretiza a Criação.
Eis o texto do Zohar.
"Não
se deve concluir que a Matéria foi criada pelo Verbo ou Logos Criador,
que esta já estava manifesta antes da Criação. Certamente
ele existe desde toda a eternidade, mas ele se manifestou pela primeira
vez quando a matéria foi criada".
"Antes, o misterioso Infinito Divino manifestou sua Onipotência
e sua bondade com o auxílio do misterioso pensamento, de essência
igual que o Verbo, mas silencioso e interior. O Verbo, manifestado na época
da criação da Matéria, existia antes, sob forma de
pensamento. Pois, se a palavra é capaz de exprimir tudo o que é
material, ela é impotente para manifestar o imaterial. É por
isso que a escritura diz: "E Elohim disse". Quer dizer que Deus
se manifestou sob a forma do verbo. Essa semente divina, pela qual a Criação
foi operada, acabava de germinar, e se transformando em Verbo, ela fez do
pensamento uma Realidade".
"Assim, por um mistério dos mais impenetráveis, o Infinito
golpe ou, com o som do Verbo, o Vazio, ainda que as ondas sonoras aí
não sejam transmissíveis. O som do Verbo foi pois a materialização
do Vazio".
"Mas essa materialização teria sempre permanecido no
estado de imponderabilidade, se, no momento de golpear o Vazio, o som do
Verbo, não tivesse feito jorrar o ponto faiscante, origem da Luz,
que é o Mistério Supremo, e cuja existência é
inconcebível. É por isso que o Verbo é chamado princípio,
sendo a origem de toda a Criação" [Ver São João,
I] "O Verbo tomou a forma de Letras do Alfabeto, que emanam todas do
Ponto Supremo [Kether]".
"As Vinte e Duas Letras da escritura são incluídas nos
Dez Sephiroth e inversamente [as Letras sendo a manifestação
do verbo Criador, e os Sephiroth sendo situados no domínio da Criação]
eles são compreendidos nas letras...".
Alfabeto Hebraico
As 22 Letras são pois os Sinais representativos de Sons, esses Sons
sendo a manifestação do Verbo Criador. Mas antes de tudo,
a Kabala quer subentender sob as Letras, os Hayoth Hakodesh, ou seres sagrados.
"Os Hayoth, coroados de Letras, descem da região ininteligível
do Alto na região inferior".
"No momento da Criação, os elementos constitutivos não
estavam purificados. É se combinando simultâneamente, se superpondo,
formando desse modo certas materializações da Idéias
Divinas, que as Letras deram nascimento a todas as formas e a todas as Imagens
que existem no mundo da Criação, no seio da Natureza Naturante".
O Zohar as concretiza então sob a forma de seres, animados e inteligentes.
Assim, cada palavra, composta de letras, é um ser vivo, em seguida
uma coisa, uma forma ou uma imagem. Há pois tantos seres e coisas
quantas forem as possibilidades de expressão pelo Verbo criador.
E cada coisa tem um criador particular, que a anima e a conduz para seu
fim, esse demiurgo em miniatura é um "Hayoth coroado de letras",
para empregar o imagem do Zohar.
Os Hayoth são pois idéias divinas, trabalhando no seio de
cada Sephirah. Mais uma vez dizemos, são os Eons da Gnose.
Eis os nomes:
Eis os XXII Nomes Divinos que são unidos aos vinte e dois Caminhos
unindo os Sephiroth, e que são ligados a toda ação
prática sob esses Caminhos. Damos a ortografia hebraica para a facilidade
das transcrições.
Mas antes de tudo, há vinte e dois principais, que correspondem cada
um a uma das vinte e duas Letras. A razão disso é que cada
uma das Letras é a inicial, a cabeça, a condutor, de uma palavra
idéia do Logos Criador.
O que explica que a Kabala considere nos vinte e dois Hayoth primordiais
vinte e dois atributos do Divino, que ela define por outro lado por Vinte
e Dois Nome Divinos, dos quais cada Letra é a inicial.
Vimos além disso porque essas idéias forças eram em
número de vinte e duas [somas dos elementos criadores, exprimidos
na Natureza Naturante].
OS VINTE E DOIS CAMINHOS
Agora se concebe
que a técnica kabalística tradicional, do qual um dos ramos
[a Themourah], consiste em transpassar as letras de uma palavra para compor
uma outra [o que vulgarmente chamamos anagrama] se aparenta com a alquimia
do verbo, pois que ela efetua uma transmutação real dos Hayoth.
Igualmente, como tudo se reduz em aritmética, a reconduzir um número
qualquer a um dos dez primeiros, inelutavelmente, se vê que todas
as palavras, quer dizer todos os Hayoth Hakodesh, podem ser reconduzidos
pela adição dos valores numerais das Letras que a compõe,
a um dos dez números primordiais, e assim se ligar a um dos Sephiroth.
Isso é o que justifica o segundo ramo da Kabala, a Guematria, que
quer que os nomes que tenham uma soma numeral semelhante sejam da mesma
família, é o caso das palavras yain [vinho] e sod [mistério]
cuja soma em hebreu é 70. Elas pertencem efetivamente a mesma Sephirah.
Enfim, tomando a inicial de várias palavras formando uma frase, inteligível
e completa, se forma uma nova palavra, isto é um novo Hayoth. É
o caso da frase "Ata Gibor Leolam Adonai" ["Tu és
o Deus Forte durante a Eternidade"], cujas iniciais dão a famosa
palavra AGLA. Por esse meio, denominado Notarikon, a Kabala dessela um novo
Hayoth. Sendo habitualmente inexprimido e nas formas comuns, está
mais perto de Divino [ou seja, do Verbo Criador], e de uma maior potência
oculta [1].
É evidente que as palavras que servem para exprimir coisas puras,
nobres, elevadas, divinas [tais como os atributos de Deus] são animadas
e conduzidas por Hayoth mais elevados e mais puros que aqueles de palavras
vulgares.
Concluímos, com essa teoria das palavras vivas, na tradição
dos encantamentos, mantrans, essas "palavras de poder" de todas
as magias antigas. Acrescemos aí o poder oculto do Som, concretizado
graficamente pela Letra, orientado por intermédio da palavra, dinamizado
por sua colocação no seio de uma figura geométrica,
constituindo todo esse conjunto um pantáculo, um yantra...
Da mesma maneira que esquema dos Sephiroth reveste sua forma total e primitiva
no seio da Natureza Naturante, em tanto que Criação Total,
da mesma maneira esse esquema é repetido em cada um dos Sephiroth
afim de lhe permitir criar em si mesmo, pois na realidade essas forças
divinas são inseparáveis.
Se tomamos pois qualquer Sephirah, aí reencontramos no topo um reflexo
de Kether, e no final, um reflexo de Malchuth. Paralelamente, haverá
aí sempre, derivando do esquema decadário sefirótico,
em não importa qual Sephirah, vinte e dois Hayoth, repetição
das vinte e dois primitivos [2].
Com os Hayoth
Hakodesh, reunimos que chamamos Entidades, em nosso modo ocidental de expressão.
Agora vamos estudá-los, como seres individualizados.
[1]- De onde
os Nomes Divinos de "n" Letras, verdadeiras Egrégoras dos
Nomes secundários que eles concretizam em um só.
[2]- Notemos que os 32 "Caminhos da Sabedoria" dos Kabalistas
[compreendendo os 10 Números (Sephiroth - Numeração)
e as 22 letras] são equivalentes aos 32 Eons primordiais, da escola
gnóstica valentiniana, o 33° Eon não sendo mais que o
resultado da ação comum dos 32 primeiros, e emanado após
eles.
Mas antes, concluamos então.
A Cifra não é o Número. Ela não é mais
que a expressão gráfica convencional. Ela evoca uma "sucessão
aditiva" da Unidade, enquanto que o Número exprime esta, de
modo ativo, no domínio superior. O Número é, em resumo,
uma potência metafísica dinâmica, uma verdadeira entidade.
A cifra é para o Número o que o corpo de carne de um cidadão
é para a Alma Coletiva de sua raça, a Egrégora nacional,
uma representação situada no tempo, fugitiva e imperfeita.
O Número quase não se aplica a uma sucessão de objetos
contingentes disparatados. Enquanto que a Cifra pode exprimir a pluralidade
na diferença [exemplo: "todos os três", se tratar-se
de um homem, de seu cavalo e de seu cão], o Número quase que
não pode exprimir mais que a pluralidade no gênero [exemplo:
"todos os três", se tratar-se de três homens].
Pois bem, o hebreu Sephiroth significa numeração. O Sephiroth
são pois Números Puros, o que nos mostra já o fato
de serem eles em número de dez, escala de números inteiros.
Consequência disso, os Cineroth, ou canais, ainda chamados "Caminhos"
termos designando o que religa os Sephiroth entre si e que permite ir a
eles e voltar, se iluminando assim com uma luz inesperada e nova. Em efeito,
nossos Cineroth são:
1°) Os
elementos metafísicos permitindo chegar a compreensão dos
Números-Puros, de ir para eles. Como tais, são "caminhos".
2°) O elementos metafísicos religam os Números-Puros entre
eles, e como tais, são "canais" nos quais [vendo apenas
esse sentido] deve circular alguma coisa.
Assim pois, os Cineroth são ao mesmo tempo as chaves do conhecimento
numeral, e os suportes mútuos desses elementos.
É pois o estudo e o emprego desses Cineroth que constituem por eles
mesmos uma boa parte da Kabala.
Pois bem, os Cineroth são idênticos as Letras com as quais
eles são uma coisa só. A Letra é o Cineroth como o
Número é a Sephirah. A relação que se estabelece
entre a Letra e o Número equivale a relação entre o
Verbo e o pensamento.
"Não se deve concluir disso que a Matéria foi criada
pelo Verbo, que este foi já manifesto antes da Criação.
Certamente, ele existe de toda a Eternidade, mas ele se manifestou pela
primeira vez quando a Matéria foi criada. Antes, o misterioso infinito
manifestou sua onipotência e sua infinita Bondade com o auxílio
de seu próprio pensamento da mesma essência que o Verbo, mas
silencioso [1]. Então o Verbo golpeou o vazio, e brotou a Luz, origem
de toda a criação [I, 16]. Para tal, o Verbo tomou a forma
de Letras do alfabeto. Todas emanaram do ponto supremo e primitivo".
De fato pois, o Número equivale a um dos dez pensamentos essenciais
do absoluto, a Letra, equivale a uma das vinte e duas "Manifestações
essenciais" desse Absoluto, combinações das precedentes,
em resumo.
[1] - Não objetivo, mas subjetivo.