Seja feita a tua vontade
Louis Claude de Saint Martin



O Homem clama, desde a queda, pelo cumprimento da vontade divina, esta súplica tem um significado muito profundo e natural, pois rogamos para que o acordo divino possa recuperar seu valor; que toda vontade e desejo procedente de Deus possa ser cumprido, e, desta forma, que a alma do homem possa florescer novamente em seu verdadeiro desejo e vontade original, o que a faria tomar parte no desenvolvimento do desejo e vontade de Deus; portanto não podemos pedir ao Regente Supremo para que seja feita a tua (Dele) vontade, sem, através desta oração, rogar para que as almas de todos os homens possam ser restauradas na possibilidade de desfrutar do elemento primitivo, e para que sejam colocadas em condições de serem restabelecidas no Ministério Espiritual do Homem.


Observe aqui, que, nas orações recomendadas por Deus, não é dito aos homens que peçam aquilo que não possa ser concedido a todos; Ele promete somente o que é compatível com sua generosidade universal, que se refere, por sua vez, as necessidades universais dos homens e à sua glória universal. Quando pedimos a Deus algo particular que não pode ser dado, igualmente, a todos os nossos semelhantes, tal como coisas materiais, empregos ou distinções, nos afastamos essencialmente de nossa lei.


Pelo que se deve orar.
Nunca devemos pedir a Deus algo que pertença a este mundo, pois tudo aqui é contável e limitado, sendo impossível que todas tenham lucro; e se um é beneficiado com uma grande parte, outro deve, necessariamente, sofrer privações. Isto mostra o quão alheia eram as posses para o código primitivo, e que o preceito Evangélico, assim como a renúncia aos bens materiais, está intimamente ligada as próprias e fundamentais bases da verdadeira justiça.


Ao contrário, devemos clamar incessantemente por coisas do mundo real e infinito no qual nascemos, porque nada daquele mundo pode chegar ao homem sem abrir caminho para que desça sobre todos.
Nas orações recomendadas por Deus ao homem, a primeira coisa a que se deve rogar a Ele e a seu Reino, é que ele venha até nós; só após isto é que o Homem será lembrado.


O que se pede ao Homem é que de modo algum peça por coisas terrestres; o pão de cada dia de que se fala, não é nosso alimento elementar, pois o Homem tem mãos para trabalhar e a terra para cultivar, somos proibidos de cuidar das necessidades de nossos corpos, como fazem os pagãos. Este pão de cada dia, que deve ser adquirido através da doçura do semblante, é o pão da Vida, que Deus distribui às suas crianças diariamente, e o único que pode ajudar a desenvolver a nossa obra. Finalmente, pedimos o perdão de nossos pecados e para que nos afaste da tentação.


Tudo nesta oração é Espírito, tudo é caridade divina, pois seu objetivo é, de modo geral, fazer com que o pacto divino mantenha a condição em que todas têm que contribuir.
Quando é dito no Evangelho, "Busque primeiro o reino de Deus e a sua retidão, e tudo o mais lhe será dado", podemos crer que o auxílio temporal de que precisamos, de fato, não nos falta, se fixarmos nossa morada nas riquezas espirituais; mas o Evangelho vai mais longe e afirma que deveríamos primeiro buscar o reino divino, e que o reino divino, e que o reino espiritual também nos será dado; ou seja, se estabelecermos nossa morada em Deus, não haverá nada na luz e nos poderosos presentes do Espírito que nos será recusado.
Esta é a razão pela qual aqueles que buscam somente as ciências espirituais, e não vão diretamente a Deus, tomam o caminho mais longo e freqüentemente se perdem. Portanto é dito que só uma coisa é necessária, pois ela abrange todas as outras. É, de fato, uma lei indispensável que qualquer região deve abranger, administrar, possuir e dispor de tudo o que vem depois de si, ou num grau inferior a si própria. Assim, não é de se surpreender que ao alcançarmos a região divina, que esta acima de todas as outras, estaremos alcançando a supremacia sobre todas as coisas. Vamos buscar a Deus, e nada mais, se quisermos ter todas as coisas; pois nascemos da fonte do Desejo Eterno e do ESPÍRITO Universal.


Os animais e as outras coisas da Natureza também têm um desejo, mas a vontade que coroa este desejo é um tanto estranha e separada deles: por esta razão eles não precisam orar, como precisa o homem; eles só precisam agir.


A Luz é parte do Convênio Divino com o Homem.
Mas o Homem teve sua origem não só nas Fontes da admiração, do desejo e da vontade, mas também na Fonte da Luz, e esta Luz, conseqüentemente também formou uma das bases do pacto divino com o Homem.
Por esta razão, o Homem é o primeiro componente da relação entre ele próprio e todos os objetos naturais e espirituais à sua volta. Por esta razão, se o Homem não esclarecer a si mesmo a respeito de sua própria existência, nunca esclarecerá nada a respeito da existência de qualquer outra criação ou ser emanado.


O Homem é a escala de medida para todas as criaturas.
De fato, se o Homem teve sua origem na real fonte da admiração, do desejo, da vontade e da luz - em uma palavra, na fonte da realidade - ele se torna, na sua qualidade de ser real, a escala de todo objeto e criatura que assemelhe-se a ele, podendo medir sua existência, leis e ação, apenas através daquilo em que eles diferem de si mesmo: uma profunda e importante verdade, que muitos parecem desprezar, mas que só afastam da indolência somente quando crêem afastá-la da modéstia.


Esta verdade é, além do mais, provada pelas experiências diárias daquilo que se passa entre os homens. Pois, como os homens se tornam juizes e arbitrários nas ciências, leis, artes e instituições, em resumo, em tudo aquilo que preenche sua vida transitória? Não é por começar a dominar, tanto quanto possível, os princípios relacionados a cada assunto? E assim que tenham penetrado completamente estes princípios e os tornado seus próprios princípios, então eles os tomam como grau de comparação para tudo aquilo que lhe é dado a examinar: quanto mais os homens estão preenchidos com o conhecimento destes princípios fundamentais, mais se espera que sejam capazes de julgar corretamente, e determinar o valor e a natureza dos assuntos submetidos ao seu tribunal.


A santa raça do Homem, engendrada na Fonte da admiração, do desejo e da inteligência, foi, então, estabelecida na região do tempo ilimitado, como um orbe luminoso de onde ele deveria irradiar amplamente uma luz celeste: em poucas palavras, o Homem era um ser, situado entre a Divindade e o traidor, que na região espiritual podia produzir, à vontade, explosões de relâmpagos e trovões, ou a serenidade do silêncio; carregar as correntes da culpa, e lançar-se nas trevas, ou imprimir os sinais de consolo e amor nas regiões da paz.